Juros baixos por mais tempo se não houver riscos

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» ANTONIO TEMÓTEO

A escolha do próximo presidente da República determinará o patamar que a taxa básica de juros (Selic) alcançará ao longo de 2019. As perspectivas de inflação controlada no próximo ano, diante de uma safra agrícola pujante e da inércia que levará a tímidos reajustes nos preços de produtos, serviços e contratos, favorecem a manutenção da taxa no piso histórico de 7% ao ano em ou um nível ainda menor ao longo dos próximos dois anos. No mercado, o otimismo impera entre os analistas que estimam que a Selic chegará a 6,75% ou até 6,5% e permanecerá nesse nível nos primeiros meses do próximo governo.

Entretanto, a possibilidade de que o próximo ocupante do Palácio do Planalto não se comprometa com a continuidade das reformas e dos ajustes para tornar a economia brasileira mais eficiente e atrativa pode afugentar investidores e elevar os prêmios de risco. Com isso, o preço do dólar tenderia a disparar e o Banco Central (BC) seria obrigado a subir os juros para tentar acalmar os investidores, que exigirão uma remuneração maior para se manter no país.

Outros riscos domésticos e externos também estão no radar do mercado. O cenário base do estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno, prevê que a Selic chegará a 6,75% ao ano na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) marcada para 6 e 7 de fevereiro de 2018 e permanecerá nesse patamar até 2019. Conforme ele, a recuperação da economia caminhará a passos lentos ao longo do próximo ano e a ociosidade não pressionaria o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Além disso, o analista ressalta que os preços de alimentos tendem a permanecer comportados e a inflação deve terminar abaixo da meta, de 4,5%.

“Qualquer candidato que vença (as eleições de 2018) não deve conseguir se desviar das reformas, principalmente
a da Previdência”

Luciano Rostagno,
Estrategista-chefe do Banco Mizuho

A partir de 2019, explica Rostagno, com a aprovação da reforma da Previdência, a tendência é de que a economia volte a crescer em um patamar próximo de 3% com a retomada dos investimentos, o que levaria o BC a elevar a taxa, de maneira gradual, de 6,75% para 8% ou 8,5% ao longo do ano. “Os juros voltariam a um nível próximo do neutro, sem afetar o consumo e evitando um superaquecimento da atividade, que poderia trazer inflação”, projeta.

O estrategista-chefe do Banco Mizuho admite que uma série de riscos pode, contudo, obrigar o BC a elevar os juros. Além das questões eleitorais, ele alerta que o preço da energia elétrica tende a pressionar a inflação do próximo ano. Dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) mostram que os dois principais subsistemas do país estão com os reservatórios em níveis baixos. Até 21 de dezembro, o grupo Sudeste/Centro-Oeste, responsável por 70,04% da geração de energia hidrelétrica do país, tinha 20,67% da capacidade.

O subsistema Nordeste, gerador de 17,84% da eletricidade do país, tinha apenas 9,98% de água em relação volume total dos reservatórios. “Se o regime de chuvas for aquém do esperado podemos ter pressões sobre as tarifas de energia, que trariam riscos para a manutenção de juros baixos”, destaca. Além disso, uma eventual alta do dólar durante o processo eleitoral pode pressionar os preços.

Conforme Rostagno, os escândalos de corrupção no país abrem espaço para que pessoas de fora do meio político participem do processo eleitoral. E incertezas quanto à política econômica que executarão e do papel do Estado na economia podem causar volatilidade. “Qualquer candidato que vença não deve conseguir se desviar das reformas, principalmente a da Previdência. Sem ela, não será possível governar, e caso negue essa realidade, o dólar pode ir acima de R$ 5”, adverte.

Perspectivas

Nas contas do economista Rafael Cardoso, da Daycoval Investimentos, os juros chegarão em 6,5%, após dois cortes de 0,25 ponto percentual da Selic nas reuniões do Copom marcadas para fevereiro e março de 2018. Ela ressalta que a taxa permanecerá nesse patamar no primeiro semestre de 2019 até que a autoridade monetária inicie um novo ciclo de aperto na política monetária, mas em menor intensidade do que o observado nos últimos anos.

“Se um candidato reformista for eleito, não teremos volatilidade no mercado e os juros ficarão nesse patamar por mais tempo”

Rafael Cardoso,
Economista da Daycoval Investimentos

A principal dúvida de Cardoso está relacionada ao tamanho do ciclo de aumento dos juros. Para ele, o último Relatório Trimestral de Inflação do BC aponta que a Selic, em 2019, chegará a 8%, com inflação em queda, o que indica uma política monetária contracionista. “Essa alta de juros tem que ser gradual, com o teto de 8% ao ano. O cenário mostra alta do dólar, o que deveria levar à volta da inflação. Mas isso não ocorrerá. Logo será necessário uma modelagem para evitar problemas”, diz.

Mesmo com a chegada de um populista ao Palácio do Planalto, explica Cardoso, a tendência é de que os juros permaneçam em 6,5% nos primeiros meses de 2019. Ele detalha que esse presidente tenderia a escolher um comandante para o BC mais leniente com a inflação, o que traria problemas para o país ao longo do ano.

Impactos

O economista da Daycoval comenta que, mesmo com o encarecimento do dólar durante a corrida eleitoral, os impactos na política monetária devem ser mínimos diante da ociosidade da economia e da situação confortável do balanço de pagamentos. “Não há espaço para repasse cambial aos preços com a economia em recuperação gradual. Se um candidato reformista for eleito, não teremos volatilidade no mercado e os juros ficarão nesse patamar por mais tempo”, comenta.

Apesar disso, Cardoso assinala que o cenário será diferente ao longo de 2019 com um populista no governo. No entender dele, a reforma da Previdência é fundamental para equilibrar as contas públicas e para que os juros reais permaneçam em um patamar baixo no país. “Sem reformas, o dólar pode disparar, e isso exigiria uma resposta da autoridade monetária”, diz.

Brasília, 13h02min

Vicente Nunes