IFI: Atraso no Orçamento e piora na pandemia tornam cenário fiscal mais desafiador

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ROSANA HESSEL

Apesar do dado positivo do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), conhecido com “prévia do PIB (Produto Interno Bruto), que registrou alta de 1,7% em fevereiro, a Instituição Fiscal Independente (IFI) mostra um cenário nada animador do ponto de vista fiscal para o país, com desafios neste ano e no próximo. O atraso do Orçamento é um dos fatores de piora dessa conjuntura, segundo a entidade.

O governo ainda não tem um Orçamento aprovado e possui, atualmente, uma dívida pública bruta de 90% do PIB, patamar elevado se comparado com a média das economias emergentes e que pode piorar com o recrudescimento da pandemia no país.No Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF), a entidade ligada ao Senado Federal, aponta para os riscos e adianta que deverá reduzir a projeção de crescimento do PIB deste ano no próximo relatório, em maio. Atualmente, a estimativa IFI é de 2,99%.

O documento deste mês da IFI destaca a lentidão da vacinação, cujo ritmo de vacinação está estagnado “em torno de 780 mil doses diárias” e que há riscos para o teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas pela inflação do ano anterior — em 2021. Pelas contas da instituição, o teto seria rompido em R$ 31,9 bilhões, “ratificando as apreensões apontadas no RAF de novembro de 2020”. Contudo, em 2022, o teto terá uma folga devido às pressões inflacionárias que devem corrigir o limite do teto de gastos em 7,14% pelos cálculos do governo no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do ano que vem, apresentado pela equipe econômica.

“Ajustes precisarão ser feitos, na LOA (Lei Orçamentária Anual), provavelmente, por meio de veto parcial. O prazo para essa decisão do Executivo é 22 de abril. Analisam-se, ainda, os números do PLDO para 2022, apresentado no último dia 15. O PLDO traz despesas sujeitas ao teto exatamente iguais ao teto indicando inexistência de folga. Já a IFI, conforme cenário apresentado em fevereiro, calcula folga de R$ 38,9 bilhões”, informou o documento.

De acordo com o RAF, o aumento de 17,5% no superavit primário verificado no primeiro bimestre de 2021 não é motivo para comemoração devido à queda nas despesas para o combate à covid-19, que no ano de 2020 alcançaram mais de R$ 524 bilhões. O órgão destacou que há riscos de que novas despesas sejam necessárias além do planejado para 2021, “a exemplo de novas rodadas do Auxílio Emergencial e de outros tipos de despesas relacionadas à manutenção de empregos e suporte a empresas”. “Os créditos extraordinários para a saúde, vale dizer, continuam a ser editados, respondendo às demandas do SUS (Sistema Único de Saúde) em meio ao recrudescimento da pandemia”,  acrescentou.

Contexto desafiador

O estudo da IFI destaca que o contexto fiscal é “complexo” requer que se evite o uso da folga do teto em 2022. ” Em 2022, o cenário fiscal será ainda bastante desafiador, com dívida/PIB crescente e déficit primário elevado. O fenômeno contábil e fiscal derivado da provável folga no teto, apontada pela IFI no RAF de fevereiro, não deveria ser encarado, necessariamente, como espaço fiscal efetivo para promover aumento de despesas. Se houver necessidade de gastos no âmbito das respostas à covid-19,
por outro lado, isso precisará ser feito de maneira planejada e transparente. O risco é a pulverização desse espaço fiscal
em despesas pouco relacionadas à recuperação da economia”, informou o documento.

O diretor-executivo da IFI, Felipe Salto, demonstrou preocupação com a demora para a aprovação do Orçamento deste ano e chamou a atenção para a piora do perfil dos títulos do Tesouro Nacional, que estão pagando prêmios de risco cada vez mais elevados devido às incertezas em relação às contas públicas e à economia brasileira. Preocupa a forma como o rito orçamentário e fiscal vem sendo tratado, e não é de hoje (ainda que tenhamos atingido o ápice com a LOA 2021)”, escreveu o especialista em contas públicas em seu perfil nas redes sociais. Segundo ele, a falta de planejamento e norte para a política econômica reflete nessa confusão orçamentária. “Em meio a crise, isso se exacerbou, de certo modo”, adicionou.

Conforme os dados do RAF, a curva de juros medida pela estrutura a termo da calculada pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), com base nas negociações secundárias de títulos públicos, passou de 3,5% ao ano, em janeiro, para 4,2%, em fevereiro, e para 5,4%, em meados de abril. A entidade destacou que a alta de 0,75 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic) em março e a sinalização do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, de que haverá um novo ajuste da mesma magnitude em maio, contribuiu para esse cenário.  “A presença de um quadro de incertezas no cenário doméstico, notadamente quanto à fragilidade das contas públicas, mantém elevado o prêmio de risco no horizonte mais longo da curva. Entre janeiro e meados de abril a curva de juros deslocou-se para cima em cerca de 2,0 pontos percentuais”,  destacou o estudo da IFI.

Na avaliação de Salto, “os sinais para os meses seguintes são bastante negativos”, apesar do IBC-Br acima das expectativas. “Eles refletem a lentidão da vacinação, que implica necessidade de manutenção e ampliação de medidas restritivas. Economia e saúde andam juntas”, alertou.

Vicente Nunes