Haja paciência

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A equipe econômica já se convenceu de que a retomada da economia não virá na velocidade esperada e que os cofres públicos continuarão castigados pela escassez de recursos. Até um mês atrás, a aposta entre integrantes do time comandado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, era que, em 2017, o Produto Interno Bruto (PIB) poderia avançar além do 1,6% previsto na proposta de Orçamento encaminhada ao Congresso. Agora, a visão é que, na melhor das hipóteses, a atividade se expandirá entre 1% e 1,5%. Esse é o quadro mais realista com o qual o governo trabalha hoje.

Técnicos da Fazenda e do Banco Central reconhecem que houve um excesso de euforia em relação à perspectiva de crescimento da economia no ano que vem. Com base em relatórios preparados por bancos e consultorias, chegaram a dizer que, ao estimar um salto de 1,6% para o PIB em 2017, o governo estava sendo conservador, pois, certamente, um incremento de 2% ou mais não estava descartado. A realidade, contudo, se impôs. A atividade ainda continua em retração e há o risco — considerável — de também o quarto trimestre deste ano ser negativo.

Os mais pessimistas dentro do governo falam em avanço de apenas 0,5% em 2017, o que, para o Palácio do Planalto, é inaceitável. Na perspectiva do presidente Michel Temer, o próximo ano começaria com a economia em ritmo mais acelerado. Com isso, ele acreditava que teria um pouco mais de tranquilidade para tocar projetos extremamente impopulares, como a reforma da Previdência Social. Na visão de Temer, a atividade mais aquecida ajudaria a frear as críticas contra os limites que precisam ser impostos ao avanço do rombo no sistema de aposentadoria.

Agora, a consciência é que tanto a reforma da Previdência, cuja proposta sequer foi enviada ao Congresso, quanto o teto para o aumento dos gastos, que ainda depende de aprovação do Senado, serão tocados num ambiente hostil, de fraca atividade econômica. A boa notícia, ressalta um dos técnicos da equipe econômica, é que a inflação está em queda, o que, mais cedo, mais tarde, permitirá ao Banco Central acelerar o processo de queda da taxa básica de juros (Selic), hoje de 14% ao ano.

O mesmo técnico ressalta que os resultados das eleições municipais, com derrota acachapante do PT e dos demais partidos de esquerda, reforçam a base aliada do governo no Legislativo. “Isso ajuda muito o andamento do ajuste fiscal”, frisa. Para ele, há uma convicção se formando na sociedade de que é preciso ampliar a cota de sacrifício agora para que, mais à frente, a economia engrene sem a ameaça de ruir novamente vítima de escolhas erradas, baseadas no populismo.

Medo do fracasso

Na avaliação de Carlos Thadeu Filho, sócio da consultoria MacroAgro, governo e especialistas da iniciativa privada subestimaram, em suas projeções, o estrago da crise econômica no consumo das famílias e nas empresas. Por isso, a euforia inicial quanto à possibilidade de um salto maior do PIB em 2017. Ele ressalta que a situação no caixa das companhias, independentemente do porte, é dramática. Muitas estão à beira da falência, restringindo os investimentos necessários para tirar a atividade do atoleiro.

Do lado das famílias, acrescenta Thadeu, o endividamento é pesadíssimo. Com muito custo, as pessoas estão conseguindo amortizar os débitos, mas pouco sobra para o consumo que não seja o estritamente necessário. Além disso, os trabalhadores estão receosos quanto ao desemprego e não têm noção se as demissões em massa vão diminuir nos próximos meses e se as incertezas políticas se dissiparam por completo.

Para piorar, os bancos continuam cortando a oferta de crédito e estados e municípios estão quebrados, restringindo um impulso fiscal que aliviaria parte da contração do setor privado. “Pelos meus cálculos, o PIB do terceiro trimestre de 2016 teve queda de 0,8%, o quarto trimestre começou muito fraco e 2017 não será tão bom como muitos imaginavam (na pesquisa semanal realizada pelo BC, a previsão de crescimento caiu pela segunda vez consecutiva, para 1,21%)”, afirma. “A arrancada da economia não aconteceu ainda”, emenda.

Diante desse quadro, assinala o economista da MacroAgro, o BC está sendo extremamente conservador na condução da taxa básica de juros (Selic). “É o medo do fracasso”, diz. Ou seja, no entender dele, a autoridade monetária poderia ter cortado os juros, no mês passado, em 0,5 ponto percentual em vez de 0,25 ponto. Não o fez, porque teme repetir os erros da gestão anterior, comandada por Alexandre Tombini”, frisa.

Ele prevê que a inflação do próximo ano será de 4,6%. Para 2018, as projeções apontam para 3,8%, isto é, abaixo dos 4,5% fixados como meta pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). “O BC está com medo de ousar. Isso confirma que, entre ter um PIB maior ou uma inflação mais baixa, ficará com a segunda hipótese”, destaca Thadeu. O Banco Central sabe o quanto as estripulias cometidas nos últimos anos estão custando caro ao país.

Brasília, 06h50min

Vicente Nunes