Com a indústria mergulhada na recessão, o governo deve se preparar para conviver com números bem negativos do comércio. Dados do setor mostram que o elevado nível de endividamento das famílias, a inflação rodando acima de 8% e o desemprego próximo de 7% estão derrubando as vendas para níveis considerados assustadores. A perspectiva para o varejo daqui por diante é de demissões e fechamento de lojas, reflexo do ano sombrio no qual 2015 se transformou.
Diante desse quadro desanimador, o Índice de Confiança do Empresário do Comércio (Icec) atingiu, em abril, o nível mais baixo da série histórica: 87,2 pontos. Em relação ao mesmo mês de 2014, o indicador que mede a percepção sobre o momento atual da economia desabou 25,1%, conforme será revelado hoje pela Confederação Nacional do Comércio (CNC). Foi o oitavo recuo consecutivo. Também as perspectivas futuras se deterioraram e, pela primeira vez, entraram no terreno pessimista, abaixo dos 100 pontos. Nesse caso, o Icec cravou 98,2 pontos, tombando 30,1% ante abril do ano passado.
Na avaliação dos empresários, não há nada que os motive a vislumbrar um quadro positivo mais à frente, nem mesmo o ajuste fiscal prometido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Por isso, os investimentos do comércio continuarão contidos. Antes de qualquer desembolso para a ampliação dos negócios, os varejistas querem se desfazer dos elevados níveis de estoques, sobretudo os que atuam nos ramos de automóveis e de material de construção.
Para o presidente do Conselho Federal de Economia, Paulo Dantas da Costa, não é surpresa que o comércio esteja sentindo o baque da forte retração da atividade. Nos primeiros quatro anos de mandato da presidente Dilma Rousseff, o Ministério da Fazenda insistiu no consumo como forma de estimular o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), apesar de todos os sinais de que esse modelo estava esgotado. “Foi uma opção errada. O certo seria o governo ter apoiado os investimentos produtivos. Se tivesse feito isso, certamente, o resultado da economia seria outro hoje”, diz.
A certeza de que a salvação do país estava no incremento do consumo aparece, por sinal, na base no processo de destruição das contas públicas promovido por Dilma. Ao reduzir impostos sobre automóveis, o governo abriu mão de receitas importantes para o ajuste fiscal. Não foi só. Dos quase R$ 500 bilhões que o Tesouro Nacional repassou ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), R$ 200 bilhões foram destinados ao financiamento do setor automotivo, política sustentada na visão equivocada de que as montadoras puxariam os demais ramos da indústria.
Tanto não puxou que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a indústria como um todo está há sete trimestres consecutivos em queda e fechará o segundo ano seguido com retração. “Trata-se de um processo perigoso”, afirma Costa. O pior, acrescenta ele, é que não se sabe se a indústria chegou ao fundo do poço. “É difícil prever quando começará a recuperação”, frisa.
Não é surpresa, portanto, que nove em cada 10 empresários do comércio (90,4%) dizem ter visto piora das condições correntes da economia. Para 61,3% deles, a deterioração se acentuou nos últimos 12 meses. A estimativa da CNC é de que, pela primeira vez em nove anos, o número de empregados do varejo apresente retração. As vendas devem ter o menor resultado em 12 anos.
Selic pode ir a 14%
Marcelo Carvalho, economista-chefe do Banco BNP Paribas, acredita que a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que será divulgada hoje, deixará claro que a projeção de inflação para 2016 continua bem acima do centro da meta, de 4,5%, a despeito do fraco desempenho da economia e do aumento do desemprego. “A tendência é de o BC reiterar que os progressos na guerra contra a inflação ainda são insuficientes”, diz. Por isso, ele não descarta a possibilidade de haver mais uma alta de 0,50 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic) em junho, para 13,75%, e outra de 0,25 ponto em julho, para 14% ao ano.
Leitos fechados
» Dados do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde do Brasil (CNES) apontam redução de 3,7% no número de leitos obstétricos no país entre 2011 e 2014, de 58.554 para 56.402 leitos — menos 2.152 unidades. A redução ocorreu, principalmente, no serviço público de saúde: 5,4%. Com 41,7% do total de leitos, o setor privado atende 25,1% da população coberta por planos de saúde e pacientes que optam pelo sistema particular.
Em mãos privadas
» O Governo do Distrito Federal está convencido de que precisa transferir à iniciativa privada a administração do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, hoje dominado por eventos da igreja evangélica. Não se sabe, porém, se haverá privatização total do espaço ou terceirização da administração ao setor privado.
Hotéis na fila
» Com o mercado hoteleiro sentindo os efeitos da crise econômica, o setor está de olho no centro de convenções. Os empresários acreditam que podem usá-lo para eventos que atraiam um público de negócios que hoje está distante de Brasília, mesmo a capital tendo o aeroporto com o segundo movimento de passageiros do país.
Brasília, 00h01min