FMI melhora previsão da dívida do Brasil, mas taxa continua elevada

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ROSANA HESSEL

O Fundo Monetário Internacional (FMI) fez uma revisão das projeções fiscais dos países membros, reduzindo as estimativas de endividamento global. Conforme o relatório Monitor Fiscal divulgado nesta quarta-feira (13/10), a dívida pública bruta do Brasil ficará abaixo de 100% do Produto Interno Bruto (PIB) a partir de 2023, mas ainda continua em patamares acima de 90% do PIB e da média dos países emergentes em, torno de 65% do PIB.

O FMI utiliza uma metodologia diferente da divulgada pelo Banco Central, incluindo os títulos em carteira da autoridade monetária, para ser comparável com outros países. No novo relatório, a dívida pública bruta do país passará de 98,9% do PIB, em 2020 — pelos cálculos do BC essa taxa foi 88,8% do PIB —  para 90,6%, neste ano. Segundo o Fundo, um dos motivos dessa melhora é a redução do rombo fiscal entre exportadores de petróleo em função de “melhorias significativas na receita, já que o petróleo os preços aumentam”, algo que beneficiou Brasil e Rússia entre os países emergentes.

De acordo com especialistas em contas públicas, a inflação mais elevada neste ano — que já roda na casa de dois dígitos —  também tem ajudado na redução da dívida em relação ao PIB, porque o deflator que corrige do PIB nominal acaba aumentando o denominador, e reduzindo, consequentemente, a taxa de endividamento do país.

Conforme dados do novo relatório do FMI, haverá uma redução da dívida pública bruta do Brasil em 2022, para 90,2% do PIB. E, a partir de 2023, essa deverá voltar a subir em relação ao PIB, passando para 91,7% do PIB e, depois para 92,4%, em 2024, para 92,6%, em 2025. E, somente em 2026, haverá um leve recuo para 92,4%.  No relatório de abril, as projeções para a dívida pública bruta brasileira eram de 98,4% do PIB, neste ano e de 98,8%, em 2022, passando para 100% e 101% do PIB nos anos seguintes.

As estimativas do FMI para a média da dívida pública bruta global, passaram de 98,9%, neste ano, e de 99%, em 2022, para 97,8%. Nos anos seguintes, voltaram a ficar abaixo de 99% do PIB anteriormente previsto, passando para 97%, em 2023, para 96,9%, em 2024, para 96,5% em 2025, e para 97,8%, em 2026.

“O aumento na dívida pública em 2020 foi inteiramente justificado pela necessidade de responder à covid-19 e suas consequências econômicas, sociais e financeiras”, disse o diretor do Departamento de Assuntos Fiscais, Vitor Gaspar, ao apresentar o relatório onde também reconheceu que houve aumento da pobreza global devido à pandemia. O número de pessoas na pobreza ainda é projetado para ser entre 65 milhões e 75 milhões mais elevado do que o projetado antes da pandemia, segundo o Fundo.

Endividamento “sem precedentes”

No relatório divulgado hoje, o Fundo destacou que a pandemia da covid-19 já dura há mais de 20 meses e o mundo é confrontado com três problemas globais que exigem ação global: a grande divisão vacinal, a mudança climática e a grande divisão de financiamento. Pelas estimativas preliminares do organismo multilateral, a dívida emitida por governos, empresas não financeiras e famílias no ano passado com medidas no combate à pandemia “atingiu US$ 226 trilhões e aumentou em US$ 27 trilhões”.

‘Tanto o nível (do estoque) quanto o aumento da dívida não têm precedentes. Níveis altos e crescentes de público e privado dívidas estão associados a riscos para a estabilidade financeira e finanças públicas. Este aumento da dívida pública foi totalmente justificado por a necessidade de responder à covid-19 e à economia, consequências sociais e financeiras. Mas o aumento é espera-se que seja pontual”, destacou o Fundo, alertando para a necessidade de medidas de austeridade fiscal para evitar uma explosão dessa dívida. Segundo o órgão, 90% desse aumento da dívida no ano passado foram de economias desenvolvidas e da China. Os mercados emergentes e países em desenvolvimento de baixa renda contribuíram “com apenas cerca de 7%” do montante.

Na avaliação do Fundo, as economias avançadas recuperem a trajetória de crescimento anterior à covid-19. “O apoio fiscal vai persistir, mas gastos e receitas vão aproxime-se gradualmente do caminho pré-covid. É importante ressaltar que China e Estados Unidos se posicionam com recuperações precoces e fortes”, acrescentou. O documento destacou que os países com maior credibilidade também experimentam taxas de juros mais baixas sobre o governo títulos. “Conclusão: a responsabilidade fiscal compensa”, frisou.

Vale lembrar que, de acordo com o FMI, mais dos US$ 16,9 trilhões de medidas fiscais anunciadas pelos governos no combate à pandemia devem expirar neste ano. Não à toa, diante do avanço desigual da vacinação no planeta, o Fundo destacou que a agenda prioritária global deverá ser o controle da covid-19.

Crítica aos subsídios

Tanto no relatório de 114 páginas do Monitor Fiscal quanto em outros documentos que estão sendo divulgados evento anual do FMI que está ocorrendo nesta semana em Washington, na sede da entidade, com encontros com os ministros da Economia e presidentes dos bancos centrais dos 189 países membros há uma grande preocupação com as mudanças climáticas. Nesse sentido, o Fundo não tem poupado críticas às políticas de subsídios, principalmente, às relacionadas aos combustíveis fósseis e defende mais incentivos para investimentos em energia renovável.

Nesse sentido, o Fundo recomendou que os governos devem se abster de recorrer a subsídios generalizados no setor energético, apesar do aumento dos preços. “Os subsídios de amplo espectro são custosos, motivo pelo qual os formuladores de políticas deveriam usar recurso específico para ajudar as famílias de baixa renda mais afetadas pelo recente aumento dos preços da energia, disse Paulo Medas, do Departamento de Finanças Públicas do FMI, de acordo com a agência France Presse.

Os subsídios generalizados “beneficiam famílias ricas que não precisam de apoio”, o que os torna “muito custosos”, disse Medas, em entrevista coletiva. Ele disse que o aumento dos preços da energia era esperado, até certo ponto, enquanto a demanda global vai-se recuperando da pandemia da covid-19 e insistiu, contudo, que o FMI estimula os países a avançarem mais rumo à energia verde.

“A realidade é que enfrentamos estas grandes volatilidades nos preços do petróleo e do gás há muito tempo. E a única forma de lidar com isso, de maneira permanente”, é investir mais em energia renovável”, disse.

De acordo com o documento do FMI, muitos países se encontram em uma situação em que o apoio fiscal ainda é inestimável para proteger vidas e meios de subsistência e, ao mesmo tempo, os governos também enfrentam questões sobre seu endividamento elevado e necessidades brutas de financiamento, e, para atingir níveis de dívida são sustentáveis ​​no longo prazo será preciso que os governos se comprometam com a redução do deficit no futuro.  “Os governos dispõem de vários instrumentos, incluindo a realização de reformas fiscais estruturais (como reforma previdenciária ou reforma de subsídios), pré-legislar mudanças nos impostos ou nos gastos e se comprometer com regras fiscais que levem à redução do deficit no futuro”, informou.

“Os países que seguem as regras da dívida, por exemplo, conseguem reduzir a dívida mais rapidamente do que outros países, embora as regras fiscais também devam fornecer flexibilidade suficiente para gastar em momentos de necessidade. De modo geral, os governos que se comprometem com finanças públicas sólidas e que alcançam altos níveis de transparência fiscal colhem benefícios significativos: seus orçamentos são mais confiáveis, seus anúncios são melhor percebidos pela mídia e eles pagam taxas de juros mais baixas sobre suas dívidas”, acrescentou.

Vicente Nunes