A temperatura no Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) subiu depois que Gustavo Soares, que foi demitido por justa causa, acusado de vazar informações sigilosas da instituição, divulgou uma carta aberta se defendendo do que chama de arbitrariedade. Funcionários da instituição dizem que o clima dentro do banco é de caça às bruxas.
Chama a atenção o fato de o BNDES não ter se manifestado até agora sobre o caso. Para os empregados do banco, a gestão do atual presidente, Gustavo Montezano, é de truculência. Ele não suporta ser contrariado e tem mania de perseguição.
Leia, na íntegra, a carta do funcionário demitido do BNDES:
“Prezados colegas benedenses,
Estou revoltado! Fui injustamente demitido de forma arbitrária e tendo negado o meu direito de defesa. Além disso, tenho recebido relatos sobre calúnias ao meu respeito, criadas por pessoas indignas. Esclareço de imediato que não possuía qualquer programa (“robô”, ou coisa que o valha, como vem sendo veiculado) para copiar arquivos do Banco como alega por três vezes o parecer jurídico do BNDES, ignorando o que diz o próprio relatório da comissão de sindicância!
Nunca acessei diretório ou arquivo que estivesse bloqueado para mim, ou seja, não quebrei senhas ou fiz qualquer esforço nesse sentido. Nunca vazei qualquer informação para fora do Banco. Não tive qualquer atitude com intenção de prejudicar o BNDES ou qualquer pessoa.
Estou me sentindo completamente injustiçado e abandono minha privacidade para me expor e me defender neste momento.
Só me manifesto agora, pois só tive acesso à justificativa da minha demissão por via judicial e depois de mais de 20 dias do ocorrido. E o que é mais grave: a decisão foi contrária à recomendação da sindicância, não tive a possibilidade de argumentar em minha defesa e nem de contar com um advogado para isso.
É lamentável saber que no BNDES alguns funcionários, por medo ou por embriaguez do poder, apoiaram esta medida e defendam que a demissão pode ocorrer sem a devida defesa do funcionário. Nosso Acordo Coletivo garante ampla defesa e o contraditório, que me foram negados. Este é um precedente muito perigoso.
Ressalto que após a demissão, a AFBNDES está prestando toda a assessoria jurídica para que eu reverta esse absurdo na Justiça. Sinto que fui utilizado como instrumento para aterrorizar os funcionários. Já ocorreram casos muito mais graves que o meu e que nunca foram tratados dessa forma. Nunca fui advertido em razão de qualquer atitude no Banco e recebi a pena máxima baseado em normas que a maioria na Casa desconhece.
Infelizmente, sou apenas um funcionário contra uma administração composta por pessoas influentes com conexões políticas. Acho que vocês podem imaginar minha angústia durante todo esse tempo. Cabe lembrar que do dia para a noite, eu, minha esposa e meus dois filhos ficamos sem plano de saúde e recursos financeiros.
Ainda acredito que tudo pode ser esclarecido e que a justiça pode ser feita. É pelo que estou lutando. Desculpem pelo longo texto, mas prezo pela transparência e pela verdade dos fatos.
Resumidamente, fui acusado pela sindicância de vazar informação sigilosa, armazenar arquivo sigiloso em local inapropriado, usar documentos não relacionados ao meu trabalho e de possuir um trecho de código que olhava a pasta pública. O parecer do Banco assume adicionalmente inverdades sequer relacionadas na sindicância, ou mesmo em contradição com o que é afirmado na mesma.
1. Sobre vazar informação sigilosa:
– O documento não foi vazado, foi repassado somente para poucos funcionários do Banco e não há qualquer evidência de que o documento tenha “saído” da empresa.
– O documento estava em uma pasta pública que, pela norma, não deveria conter arquivos sigilosos.
– Vários funcionários foram ouvidos na sindicância e afirmaram não reconhecer o documento como sigiloso.
– O documento não continha classificação da informação, restrição de acesso ou identificação do gestor da informação.
– O artigo oitavo da OS-2015 é claro em informar que arquivos não classificados devem ser considerados como ostensivos.
– Muitos arquivos já circularam pelo WhatsApp, inclusive com classificação de informação ou restrição de acesso e a ATI nunca se posicionou ou deu qualquer orientação sobre isso.
– A página da segurança da informação lista as informações consideradas sensíveis e nenhuma se faz presente no documento. E ainda informa que em regra as informações do Banco são ostensivas.
– O tema de segurança da informação é pouco difundido no Banco e a ATI em seu planejamento estratégico reconhece isso como uma fraqueza.
– Uma grande evidência de desconhecimento da classificação de documentos no Banco é a ausência desta informação nos depoimentos colhidos na sindicância. Apesar de serem sigilosos, não possuem a classificação da informação, nem a restrição de acesso.
2. Sobre armazenar arquivo sigiloso em local inapropriado
– Foram encontrados, no computador que eu utilizava, vários arquivos que copiei manualmente do X que despertaram minha atenção e que eu analisaria futuramente.
– Desde meu ingresso no BNDES, acessava o X como fonte de informação. Vários arquivos foram úteis para o meu trabalho como apresentações, materiais de curso etc.
– Acontece que dentre os vários arquivos copiados uma ínfima parte foi considerada como sigilosa, digo considerada porque sequer tive acesso para verificar os arquivos.
– Eu copiava os arquivos e pastas do X e não analisei todos eles. Afinal, não tirei os arquivos do ambiente tecnológico do Banco.
– A própria cópia de arquivos considerados sigilosos para o X configura a falta de conhecimento do corpo funcional.
3. Sobre usar documentos não relacionados ao meu trabalho
– Nunca deixei de cumprir com meus a fazeres e prazos no Banco. Em quase 9 anos alcancei o oitavo nível, tendo recebido promoção especial. Logo, meus acessos à pasta pública não eram um passatempo e sequer eram indevidos.
– Como sempre trabalhei no AGIR e na ATI, áreas distantes até fisicamente no Banco, recorri durante todo o tempo, principalmente no início da carreira, para me informar sobre a empresa através da pasta pública da rede.
– A pasta em que eu concentrava os arquivos copiados do X no meu computador era um repositório de documentos não utilizados por mim. Simplesmente copiados e/ou conferidos de forma rápida.
– Sempre acessei o X em busca de apresentações (sempre fui responsável por fazê-las em minha gerência ou departamento), informações sobre o Banco, materiais de cursos etc.
– Vários executivos da ATI, gerentes e pelo menos três chefes de departamento tinham conhecimento do meu acesso corriqueiro à pasta pública.
4. Sobre possuir um trecho de código que olhava a pasta pública
– Não sei precisar, mas suponho que há menos de 2 anos iniciei um embrião de programa que consultava a pasta X.
– Este arquivo não foi finalizado e nunca foi executado. Não existe qualquer instrução para realizar cópia neste programa. E somente consulta à pasta X.
– Nada no programa remete à busca de arquivos sigilosos, confidenciais, ou outro termo que faça alusão a sigilo.
Reconheço que fui ingênuo e que desconhecia certas normas do Banco, mas jamais fui desleixado, desleal ou desonesto! Contribuí com as investigações me apresentando espontaneamente e não posso conceber a aplicação da pena máxima às minhas atitudes.
Finalizo com um agradecimento a todos que se solidarizam com a minha situação e que me deram algum apoio durante este tempo.
Gustavo M Soares”
Brasília, 10h55min