Uma coisa ninguém pode negar: a chegada de Ilan Goldfajn à presidência do Banco Central fez a instituição subir de patamar. O duro discurso usado pelo economista para ressaltar a preocupação com a inflação não só mudou a direção das taxas de juros nos mercados futuros, como enterrou as dúvidas quanto ao compromisso da autoridade monetária em levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, até o fim de 2017. A definição de Ivo Chermont, economista-chefe da Quantitas Asset Management, é perfeita: “Habemus BC”.
Mas, como no mercado financeiro as coisas são fugazes, os analistas já trataram de levantar dúvidas sobre o que o BC fará se os preços do dólar continuarem desabando. A moeda norte-americana, que acumula baixa de quase 20% no ano, tem forte peso na inflação. Caso as cotações caiam para R$ 3,10 ou mesmo R$ 3 nas próximas três semanas, período que antecede a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), certamente a pressão por cortes na taxa básica de juros (Selic), de 14,25% ao ano, aumentará.
Ilan procurou fazer da sua primeira entrevista, justamente na divulgação do relatório de inflação, um marco, a fim de diferenciá-lo de seu antecessor, Alexandre Tombini. Mas, apesar das palavras fortes, deixou todas a portas abertas para a redução da Selic ainda neste ano. O BC acredita que, ao longo dos próximos meses, os especialistas vão começar a limpar de suas projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) o dólar mais alto e o risco Tombini. Com isso, as expectativas tenderão a migrar para níveis mais próximos ao centro da meta.
Será, porém, um processo lento. Por isso, a aposta, agora, segundo o economista João Pedro Ribeiro, da Nomura Securities, é de que os juros só comecem a cair a partir de outubro. Mas o corte será forte: começará com 0,5 ponto percentual, para 13,75%. O difícil será segurar até lá a tensão dos agentes econômicos, que pleiteiam notícias boas, sobretudo depois de o Senado confirmar, em agosto, o afastamento definitivo de Dilma Rousseff. O horizonte político ficará bem menos pesado.
Dominância fiscal
Na análise que fez a um pequeno grupo, Ilan destacou que os primeiros recados emitidos por ele atingiram o objetivo, principalmente por enterrar as especulações de que o BC poderia estender para 2018 a convergência da inflação para o centro da meta. Para ele, a autoridade monetária precisa ter domínio das expectativas do mercado, mas isso só será possível se não houver ruídos na comunicação. Isso vale, inclusive, para o dólar. O banco terá que ser muito transparente ao atuar no câmbio para evitar volatilidade. Não será uma tarefa fácil para uma instituição que precisa desmontar mais de US$ 60 bilhões em contratos de swap, espécie de venda futura da moeda norte-americana.
O presidente do BC também terá de calibrar o discurso com dois dos futuros diretores da instituição, Carlos Viana de Carvalho e Tiago Berriel. Eles ocuparão cadeiras importantes, a de Política Econômica e a de Política Monetária, respectivamente. Os investidores estão debruçados sobre tudo o que os dois já disseram e escreveram. Um tema predomina no discurso de ambos: a dominância fiscal, quando a política monetária perde a eficácia no combate à inflação, já que a carestia decorre da desestruturação das contas públicas.
Para assessores de Ilan, a discussão sobre dominância fiscal está superada. Na cabeça dos investidores, não. E isso motiva muitos deles a entenderem que Viana e Berriel podem ser favoráveis a uma queda mais rápida dos juros, uma vez que o controle da inflação depende muito mais do Ministério da Fazenda, a quem cabe tocar o ajuste fiscal, do que do BC. O mercado não economiza quando quer encontrar pelo em ovo. Portanto, todo cuidado é pouco. Cada passo de Ilan e de seus subordinados será monitorado com lupa. Uma vírgula fora do lugar já será motivo de estresse.
Brasília, 00h01min