Correio Econômico: Erros e acertos do Banco Central

Publicado em Economia

Ao anunciar que cortará os juros bem além do esperado, o Banco Central está apenas corrigindo seus erros nas projeções de inflação. Como vinha estimando um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) muito acima do que vem se confirmando, o BC precisa ajustar a taxa básica (Selic) de forma a manter os estímulos à economia, que, infelizmente, se recupera mais lentamente do que o desejado. Se a inflação fica abaixo do que a autoridade monetária prevê em seus modelos, sem cortes nos juros, a taxa real — a que realmente importa para o consumo e a produção — acaba subindo em vez de cair. Os juros reais estão girando em torno de 2,8%.

 

Em dezembro do ano passado, quando divulgou o Relatório Trimestral de Inflação com as expectativas para 2018, o Banco Central previa IPCA de 1,4% no primeiro trimestre do ano. O custo de vida, porém, ficará próximo de 0,75% no período, quase a metade do estimado. Como tudo indica que, nos próximos meses, a inflação continuará abaixo do projetado pelo BC, a Selic não só deverá cair dos atuais 6,50% para 6,25% ao ano em maio, como poderá chegar a 6% na reunião seguinte do Comitê de Política Monetária (Copom).

 

Apesar dos erros nas projeções de inflação, é louvável a postura do BC de assumir que superestimou os números. Se prevalecesse a arrogância no time comandado por Ilan Goldfajn, certamente os juros ficariam muito acima do necessário, tornando-se um obstáculo para a retomada da economia, que continua fraca, sofrendo com desemprego elevadíssimo e empresas operando com enorme capacidade ociosa. Essa flexibilidade ficou muito clara no comunicado pós-reunião do Copom, que surpreendeu a grande maioria dos analistas ao afirmar que pode dar pelo menos mais um corte na Selic.

 

Diante das surpresas positivas na inflação, talvez seja importante que o BC faça ajustes nos seus modelos, para torná-los mais refinados. Isso é importante, inclusive, para que a instituição possa ver qual o real tamanho dos juros de equilíbrio da economia, ou seja, a taxa que permite o crescimento da atividade sem pressões inflacionárias. Até bem pouco tempo, falava-se que esses juros de equilíbrio estavam entre 8% e 8,5%. Agora, com as mudanças estruturais que estão ocorrendo na economia, é bem possível que estejam mais próximos de 7%.

 

Apoio do Congresso

 

Na avaliação do economista Carlos Thadeu Filho, pesquisador de macroeconomia da Fundação Getulio Vargas (FGV), o BC faz muito bem em deixar as portas escancaradas para novas reduções na Selic. Ele acredita que o período mais pesado para a inflação será entre janeiro e abril, por causa de aumentos tradicionais de preços nessa época, como os do grupo educação. Mas, mesmo assim, o IPCA ficará aquém do previsto. “A partir de maio, veremos índices bem menores, talvez com deflação em junho e em julho. Isso justificará o BC levar a Selic para 6% ao ano”, afirma. Ele estima inflação de 3,20% para todo o ano, mas não descarta que o índice oficial de preços fique abaixo do piso da meta perseguida pelo BC, de 3%.

 

Thadeu Filho ressalta que a atividade ainda não sentiu todo o impacto da intensa queda da taxa básica. Por uma razão simples: o crédito continua caro e escasso. O consumo e a produção não estão sentindo o efeito da política estimulativa do BC. “Existe uma trava impedindo que a economia sinta todo o potencial da queda da Selic”, ressalta. Os bancos não reduziram os spreads, diferença entre o que pagam aos investidores e o que cobram dos devedores. “Por isso, não podemos dizer se a retomada da economia será para valer e se perdurará ao longo de 2019”, acrescenta.

 

Há outro ponto importante segurando a economia: o governo não tem conseguido gastar. Por conta dos persistentes deficits nas contas públicas, não está havendo impulso fiscal. Isso é ótimo, porque mostra aos investidores compromisso firme com o equilíbrio financeiro da União, mas explicita a penúria do Estado para investir em áreas prioritárias, como a de infraestrutura. “Nesse ritmo, veremos o desemprego persistente. A retomada que estamos observando não é suficiente para abrir as vagas necessárias. Não será surpresa se o índice de desocupação subir”, destaca o economista.

 

Dentro do governo, além da comemoração com o fato de o BC ter levado a Selic para o menor nível da história, ao baixá-la de 6,75% para 6,50% ao ano, a aposta é de que o Congresso ficará mais flexível para aprovar o projeto que dá autonomia à autoridade monetária. A percepção é de que o BC está fazendo de tudo para reanimar a economia e estimular o emprego. E não levando a política monetária a ferro e fogo somente para cumprir a meta de inflação.

 

Brasília, 06h18min