Correio Econômico: Dólar, inflação e juros

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O dólar encerrou a semana em R$ 3,41 para venda, mas poderia estar cotado hoje entre R$ 3,10 e R$ 3,15 não fossem as incertezas políticas. Nas últimas duas semanas, a moeda norte-americana só registrou alta tão expressiva na Turquia e na Rússia, países em que a economia está capengando e os governos flertam com o autoritarismo. Do piso do dólar neste ano, em 25 de janeiro, quando foi negociado a R$ 3,13, ao pico de R$ 3,42, em 16 de abril, houve valorização de quase 10%. Muitos especialistas se perguntam qual será o impacto desse movimento do câmbio na inflação e nos juros.

Economista sênior do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), Carlos Thadeu Filho diz que, ante o ritmo fraco da produção e do consumo, não há espaço para repasse da alta do dólar para os preços. Para que isso ocorresse, a moeda norte-americana teria que ultrapassar os R$ 3,70, o que não está no radar do mercado. Não neste momento. É possível, sim, que o dólar dê novos saltos se as incertezas políticas aumentarem no país e se os juros nos Estados Unidos subirem mais do que o projetado pela maior parte dos investidores. Mas nada de exageros.

Thadeu ressalta que, historicamente, as cotações do dólar estão atreladas aos preços das commodities, mercadorias com cotação internacional, e ao risco-país medido pelo credit defaul swap (CDS), seguro usado pelos investidores para se protegerem de oscilações bruscas do mercado. “Se prevalecesse esse histórico, certamente o dólar estaria mais próximo de R$ 3,10 ou de R$ 3,15”, frisa. Mas há três fatores prevalecendo e ditando o comportamento da moeda norte-americana. O primeiro deles, as incertezas políticas.

“Não se sabe se o eleito em outubro próximo será um candidato de centro e se terá base política para aprovar projetos de interesse do país no Congresso”, afirma Thadeu. As pesquisas eleitorais mostram uma pulverização grande de votos, sobretudo depois da prisão de Lula, que não poderá concorrer ao Palácio do Planalto. Os candidatos que agradam aos investidores não conseguem decolar. Os que estão na ponta das preferências dos eleitores não demonstram apoio a reformas estruturais importantes como a da Previdência Social. Isso deixa os donos do dinheiro mais avessos ao risco.

Consumo fraco

Outro fator que empurra o dólar para cima é a taxa básica de juros (Selic), que está em 6,50% ao ano, o nível mais baixo da história. O prêmio de risco embutido nela está muito próximo do observado nos títulos de 10 anos do Tesouro dos Estados Unidos. Ou seja, a Selic atual, que deverá cair para 6,25% em maio, praticamente zerou os movimentos de carry trade, nos quais os investidores pegam dinheiro em países onde os juros estão muito baixos e aplicam em mercados que pagam taxas bem maiores. Sem essas operações, o fluxo de recursos para o Brasil diminui.

E mais: o Banco Central pode estar estimulando a alta do dólar para evitar que a inflação fique abaixo do piso da meta, de 3%, e para estimular as exportações, uma forma de impulsionar a produção e, por tabela, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Thadeu diz que, há até bem pouco tempo, o consenso era de que o PIB cresceria 1% no primeiro trimestre. Agora, fala-se em, no máximo, 0,5%. Para o ano, as projeções de crescimento, que giravam em torno de 3%, caminham para algo entre 2% e 2,5%. “Nem os juros mais baixos estão movendo a atividade”, diz.

Na avaliação do economista, o ritmo de expansão do PIB, por sinal, ditará a disposição do BC de cortar a Selic. Com os dados que dispõem hoje, ele acredita que a instituição promoverá mais uma queda de 0,25 ponto percentual. Contudo, deixará as portas abertas para mais redução caso perceba que o crescimento perdeu ainda mais força. A inflação, acredita ele, não será problema. Ele estima que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrará 2018 em 3,2%, com alta probabilidade de ficar abaixo de 3% pelo segundo ano consecutivo.

“O consumo das famílias perdeu o ímpeto”, ressalta. Diante da demanda fraca, não há remarcação de preços, o que mantém a inflação em nível bem baixo — a prévia do IPCA em abril foi de apenas 0,21%, a menor para o mês desde 2006. Os consumidores estão se ressentido da falta de estímulos como os observados no ano passado, a começar pela liberação das contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A sensação de aperto no orçamento é tão forte, que ninguém quer se endividar. “Há mais oferta de crédito do que interesse em empréstimos”, reforça Thadeu. O Brasil vive uma crise de confiança.

Brasília,

Vicente Nunes