Correio Econômico: De novo, inflação abaixo de meta

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A inflação de 2018 deverá fechar abaixo do centro da meta, de 4,5%, pelo segundo ano consecutivo. As projeções variam entre 3,7% e 3,9%, indicando que há, sim, espaço para o Banco Central promover mais um corte na taxa básica de juros (Selic), fixada em 6,75%, a menor em 60 anos. A percepção de que a instituição poderá utilizar a janela de oportunidade que se mantém aberta ganhou força depois da divulgação, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de janeiro, de apenas 0,29%. O consenso do mercado era de inflação de 0,42%.

Mas, por maior que seja a torcida para mais ousadia na condução da política monetária, é certo que o BC só dará um passo adiante se algo de muito bom acontecer. Será preciso, por exemplo, que o IPCA de fevereiro fique bem próximo do resultado de janeiro — as estimativas variam entre 0,35% e 0,40% — e que a Câmara dos Deputados aprove a reforma da Previdência, o que ninguém no mercado acredita. O aval às mudanças no sistema de aposentadoria seria suficiente para segurar as cotações do dólar mesmo num quadro de maior tensão no cenário internacional, hoje, a principal preocupação do BC.

Dentro do governo, todos se dão por satisfeitos com o que já foi feito pelo BC. “É claro que, se uma nova queda dos juros vier, ficaremos felizes. Mas temos de reconhecer o sucesso da política monetária. Os juros caíram para níveis históricos com a inflação em baixa. Isso é inédito nas últimas décadas”, diz um dos principais assessores do presidente Michel Temer. “Veja o que ocorreu em 2012. Forçaram um recuo da Selic, mas, seis meses depois, tiveram que mudar a rota dos juros, pois a inflação disparou. Não havia credibilidade. Agora, as expectativas de inflação estão ancoradas abaixo da meta”, acrescenta.

Lição aprendida

Na avaliação da economista-chefe da Rosenberg Associados, Thaís Zara, há muito o que comemorar em relação à inflação. “Houve boas surpresas positivas em janeiro. Os preços dos alimentos subiram menos do que projetávamos. Os custos dos serviços também ficaram aquém do previsto, assim como os núcleos do IPCA (que descontam as maiores altas e as maiores baixas)”, frisa. Ela reconhece que ainda há espaço para o BC cortar mais os juros, porém, não acredita que isso ocorra. “Mantemos a estimativa de Selic estável em 6,75% até o fim do ano. O BC não usará a janela que deixou aberta para cortar mais a taxa. Para que isso ocorra, são necessárias muitas notícias positivas, como a reforma da Previdência, que não vemos.”

Pelos cálculos de Thaís, a inflação deste ano fechará em 3,8%. Caso, no entanto, se confirmem as estimativas de uma nova supersafra agrícola sem estresse no câmbio, não se deve descartar a possibilidade de o IPCA encerrar 2018 abaixo do piso da meta, de 3%. “Ainda há um longo caminho a ser percorrido para se poder dizer isso. O importante a ser dito é que a inflação deste ano será bastante tranquila. Estamos contando com um saldo do bom resultado de 2017 (a chamada inércia) e com o fato de a economia estar crescendo abaixo do seu potencial”, assinala. “Em fevereiro, por exemplo, veremos pressões pontuais na inflação por causa do grupo educação. Contudo, não será nada demais”, emenda.

A inflação baixa favorece, sobretudo, os mais pobres, que não têm como se defender dos reajustes. No governo Dilma Rousseff, acreditou-se que um pouco mais de inflação impulsionaria o crescimento econômico. Tal leniência fez os índices de preços dispararem, o poder de compra das famílias ruir e o desemprego explodir. O resultado foi uma das piores recessões da história. O estrago foi tamanho que, mesmo com a inflação em 12 meses rodando abaixo de 3%, a economia reage lentamente e o país ostenta um exército de mais de 12 milhões de desempregados. A lição, portanto, é clara: com inflação não se brinca. Por mais que o momento seja favorável, o BC jamais deve se descuidar do combate à carestia.

Brasília, 06h52min

Vicente Nunes