Correio Econômico: Com combustíveis, inflação de junho vai a 0,7%

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A inflação de junho será a maior do ano. Deve atingir 0,7%, refletindo a alta do que os economistas chamam de preços administrados pelo governo. O choque no bolso virá da gasolina, do etanol e da energia elétrica, que voltará a ter bandeira vermelha. Para desespero dos consumidores, está havendo uma conjunção negativa de fatores que tornam esses produtos e serviços mais caros. O aperto deverá se prologar para julho, avisa Carlos Thadeu Filho, economista sênior do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Ele explica que, em maio, mesmo com a gasolina já tendo ficado 15% mais cara e o diesel subido quase 10%, as taxas de inflação se manterão comportadas por causa da queda dos preços do etanol e da energia elétrica. No próximo mês, porém, o quadro será bem diferente. Tanto os combustíveis quanto a conta de luz terão reajustes e isso empurrará o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para cima. Em junho do ano passado, o país havia registrado deflação de 0,23%. “Refiz as minhas projeções. Em vez de 3,2%, espero, agora, inflação de 3,8% para este ano”, afirma Thadeu Filho.

Dados do mercado indicam que somente a gasolina respondeu por cerca de 10% da inflação acumulada neste ano. Nem por isso, diz o economista do Ibre, o governo deve mudar à força a política de preços da Petrobras. Desde julho de 2017, a estatal vem mexendo, quase que diariamente, nos valores da gasolina e o diesel. A empresa tem repassado para os consumidores as variações, para cima e para baixo, das cotações do petróleo no mercado internacional e do dólar. O problema é que, nas últimas semanas, o barril do óleo e a moeda norte-americana dispararam.

Intervencionismo

Combustíveis em alta não combinam com eleições. Por isso, o presidente Michel Temer convocou ontem uma reunião extraordinária para tentar conter a disparada dos valores nas bombas dos postos. O encarecimento da gasolina e do diesel tem potencial para zerar a minguada popularidade do governo. A ala política do Palácio do Planalto cobra uma ação rápida, antes que a candidatura do escolhido pelo MDB esteja nas ruas. Mas há resistências por parte da equipe econômica e do comando da Petrobras, que, por sinal, estará com Temer nesta terça-feira. O presidente da companhia, Pedro Parente, fez chegar ao chefe que não aceitará interferências políticas em sua gestão.

Temer se gaba de ter conseguido reverter a situação dramática da Petrobras, que foi saqueada nos governos petistas. Diz que, com a profissionalização da gestão e a liberdade para a política de preços dos combustíveis, a estatal saiu de seguidos prejuízos para um lucro de R$ 7 bilhões no primeiro trimestre deste ano. Esse discurso, contudo, não combina com políticas intervencionistas. Se o governo obrigar a petroleira a segurar os repasses da alta do petróleo e do dólar para os consumidores, repetirá a política desastrosa que prevaleceu na administração de Dilma Rousseff.

Para Thadeu Filho, até a redução de impostos sobre combustíveis proposta pela ala política do Planalto será mal recebida pelos investidores, que estão pagando caro pelas ações da Petrobras. Com as contas públicas em frangalhos, o governo não está em condição de abrir mão de qualquer real. A previsão para este ano é de deficit de até R$ 159 bilhões. Em 2019, o buraco previsto é de R$ 139 bilhões. “Não se pode esquecer que o intervencionismo nas estatais está custando caro até hoje”, ressalta o economista. Medidas como essa empurraram o Brasil para uma das mais severas recessões da história.

Complacência

Em vez de partir para o populismo, o governo deve ter sangue-frio. Como a economia está muito fraca, os repasses de aumentos de custos pela indústria e pelo comércio estão contidos. Os preços livres, que sofrem interferência da política de juros comandada pelo Banco Central, continuam muito bem comportados, compensando o choque dos administrados, que respondem, em média, por um quarto da inflação. “Veremos dois meses mais complicados para a inflação, mas, depois, haverá acomodação”, diz Thadeu Filho. Isso, é claro, se o Planalto não fizer nenhuma loucura na economia. “Não há mais espaços para pedaladas nos preços da gasolina e da energia elétrica”, emenda.

Quem acompanhou a reunião de ontem no Planalto garante que Temer está com os pés no chão. Ele sabe que qualquer passo em falso pode lhe custar uma briga com o mercado financeiro, que, até agora, lhe deu todo apoio, fechando, inclusive, os olhos para as derrapadas na área fiscal. Essa complacência, porém, está por um fio. Tanto que bancos e corretoras decidiram partir para cima do Banco Central, que, acuado, teve que ampliar a intervenção no câmbio para conter a alta do dólar. O presidente não tem o apoio da população. Se o mercado lhe abandonar, poderá decretar o fim antecipado de seu governo.

Brasília, 09h10min

Vicente Nunes