Coluna no Correio: Vamos aos fatos sobre o PIB

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Sim, o Brasil voltou a crescer depois de dois longos anos de recessão, mas não há motivo para euforia. Ainda há um longo caminho a ser perseguido e a trajetória passa, sobretudo, pela política. Não há como se falar em crescimento sustentado do Produto Interno Bruto (PIB) num quadro de tamanha incerteza. Independentemente de quem estiver governando o país nos próximos meses, o Congresso precisa exercer plenamente o seu papel e aprovar as reformas trabalhista e da Previdência Social. Se não fizer isso, sentenciará a economia ao terceiro ano seguido de recessão, com queda de até 2% do PIB. Um desastre.

O primeiro resultado positivo do PIB — alta de 1% entre janeiro e março ante os últimos três meses de 2016 — veio em boa hora. Confirma que uma política econômica responsável é fundamental para o bom funcionamento do país. Desde o início do ano, pode-se observar uma maior confiança de empresários e consumidores. Não sem razão. A inflação cedeu com força e, hoje, está girando entre 3% e 4%, um feito se levarmos em conta que, em 2015, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encostou nos 11%, com fortes sinais de descontrole.

Esse alívio no custo de vida permitiu que o Banco Central pudesse acelerar o corte na taxa básica de juros (Selic), que está em 10,25% ao ano. Como consequência, houve uma ligeira melhora no mercado de trabalho e um pequeno aumento da renda. O crédito às pessoas físicas começou a destravar, com um índice de inadimplência totalmente sob controle. No caso das empresas, a situação continua grave, devido ao elevado nível de endividamento. Mesmo assim, algumas companhias explicitam a intenção de retirarem das gavetas planos de investimentos.

Tudo isso, porém, está longe de indicar que o Brasil saiu, definitivamente, da maior recessão da história. O dado mais relevante disso é o exército de 14 milhões de desempregados. Tecnicamente, é preciso que o PIB registre pelo menos mais um trimestre de crescimento. E não se pode garantir que o período compreendido entre abril e junho será positivo. Há o temor de que a crise política detonada pelas delações dos irmãos Joesley e Wesley Batista acabe inviabilizando a aprovação das reformas e, por tabela, aborte a retomada do crescimento.

Filme de terror

Economistas que monitoram o dia a dia da atividade acreditam que o impacto mais pesado da crise política só será sentido no terceiro trimestre. No entender deles, o baque das delações do grupo JBS parou parte dos negócios, mas será o prolongamento das incertezas o fator determinante para definir em que direção o país seguirá. “Há bons indicadores espalhados pela economia, mas é preciso ver o desenrolar da crise política”, diz o economista-chefe da Votorantim Corretora, Roberto Padovani.

Há outra variável importante: a taxa de juros. Se, mesmo cauteloso, o Banco Central continuar cortando a Selic, não haverá grande estresse entre os empresários. Contudo, uma interrupção do movimento iniciado em outubro do ano passado gerará pânico entre os agentes econômicos. No governo, ninguém trabalha com a possibilidade de o BC partir para uma medida tão extrema, porque a inflação está totalmente sob controle.

“A diretoria do Banco Central tem sido muito sensata, a despeito de, em alguns momentos, agir com excesso de conservadorismo. Mas, se a instituição decidir seguir por um caminho menos favorável à retomada da economia, com certeza, algo mudará no comando dela”, adverte um dos ministros mais importantes do governo, que ainda não engoliu o comunicado pós-reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), informando que, daqui por diante, os juros cairão mais devagar. “Foi excessivo”, complementa.

Para o ministro, o mais importante, agora, é que o governo consiga usar os números positivos da economia a seu favor a fim de fazer andarem as reformas. O discurso, segundo ele, tem de ser contundente: se o Congresso não der os votos necessários às reformas trabalhista e da Previdência, será responsável por empurrar o Brasil novamente para a recessão. “Há projeções indicando que, com uma nova queda do PIB, pelo menos mais 2 milhões de trabalhadores vão para a fila do desemprego. Creio que ninguém quer ver esse filme de terror”, assinala.

Bem-estar

A ordem de Temer é para que a equipe econômica use todos os números positivos de que dispõe para martelar entre os formadores de opinião que o país está no rumo certo e que a crise política não pode atrapalhar o crescimento. Um dos técnicos mais conceituados da Esplanada ressalta que, com a sensação de bem-estar voltando, por conta da queda da inflação e do aumento da renda, as pressões nas ruas vão diminuir. E isso será determinante para que o governo recupere votos a favor da reforma da Previdência.

“A crise política é grave, é difícil prever o que vai acontecer, mas não estamos vendo as ruas clamando pela mudança de governo, como se viu com Dilma Rousseff”, afirma o técnico da equipe econômica. Ele diz que, no governo da petista, a situação econômica estava se deteriorando numa velocidade muito rápida. Agora, os indicadores estão na direção oposta, mostrando que o país começa a sair do atoleiro. “Com a economia em melhores condições, é difícil ver mobilização popular para derrubar governos. Não estou dizendo que não pode acontecer, mas sempre é mais difícil”, assinala.

O que todos estão torcendo no governo é para que, depois do resultado do PIB do primeiro trimestre, os ventos comecem a soprar mais favoravelmente em direção ao Palácio do Planalto. Esse desejo é mais do que legítimo. Mas é preciso manter os pés bem cravados no chão. O risco de uma bomba estourar em Brasília é enorme, sobretudo se o pedido de prisão de Rodrigo Rocha Loures, feito pela Procuradoria-Geral da República, for acatado.

Brasília, 06h03min

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Vicente Nunes