Coluna no Correio: Salvação dos juros

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A quebra da operadora de telefonia Oi reascendeu um forte debate dentro do governo: os rumos da taxa básica de juros (Selic), que está em 14,25% há quase um ano. Uma ala de ministros muito próximos do presidente interino, Michel Temer, acredita que chegou o momento de o Banco Central dar a sua contribuição para amenizar o grave quadro econômico, que ainda deve levar outras grandes empresas para o mesmo caminho da Oi, a recuperação judicial.

 

A determinação de Temer é de que não se criem constrangimentos para o presidente do BC, Ilan Goldfajn, mas o próprio peemedebista deixou escapar, nos últimos dias, para alguns auxiliares, a importância de a autoridade monetária responder, com a queda de juros, à política fiscal que vem sendo conduzida pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. O presidente acredita que, em um ambiente com custo menor do dinheiro, as empresas que hoje enfrentam dificuldades de caixa e sofrem com elevado nível de endividamento poderão encontrar condições melhores de financiamento.

 

Nenhum dos auxiliares de Temer crê, porém, que a taxa Selic cairá na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de julho. O consenso no entorno do presidente interino é de que o movimento de baixa dos juros deve começar no fim de agosto, quando Ilan e equipe terão um quadro mais claro da inflação. Dados preliminares deste mês mostram importante desaceleração no custo de vida, apesar de a alta do feijão atormentar as donas de casa. O Planalto reconhece que a carestia merece atenção especial, até para melhorar os índices de confiança das famílias. Eleitores sempre votam pensando no bolso.

 

Promessas vazias

 

Dentro do governo, há a convicção de que é preciso dar ânimo novo ao empresariado, que ainda não comprou por completo as promessas de Temer de recolocar o país nos trilhos. Nas conversas que auxiliares mais próximos do presidente interino e integrantes da equipe econômica vêm tendo com representantes do setor produtivo, muitos reforçam o voto de confiança na atual administração, mas cobram ações efetivas para reverter a recessão. Empresários e investidores dizem que o Brasil precisa fazer o dever de casa rapidamente, pois o mundo dificilmente dará alguma contribuição nos próximos meses.

 

A economia dos Estados Unidos, como se sabe, perdeu força e as eleições presidenciais deste ano devem criar instabilidade. Boa parte do mundo foi sacudida pelo plebiscito que será realizado hoje para decidir se o Reino Unido se mantém ou não na União Europeia — o Brexit. Caso haja uma ruptura, as consequências serão dramáticas para a economia europeia e para os ingleses, além de escancarar todas as portas para o fim do euro. A China, principal parceira comercial do Brasil, dá sinais de fragilidade, com taxa de crescimento mais próxima de 6% ao ano.

 

Portanto, dizem empresários que estiveram com Temer e com importantes integrantes do governo, não há espaço para promessas vazias. Para eles, o ajuste fiscal precisa se tornar efetivo para que o BC possa pavimentar o caminho para uma possível queda dos juros. O setor produtivo está sufocado, o número de falências e de recuperação judicial é recorde e muitas companhias ainda serão obrigadas a reduzir o quadro de pessoal para se ajustar a um nível de atividade frágil. Com isso, o desemprego pode chegar a 14% até meados de 2017. Hoje, a taxa está em 11,2%. Cada ponto percentual de alta no índice significa mais de 1 milhão de desocupados.

 

Desejo e realidade

 

Os investidores, assim como técnicos do governo, acreditam que o BC de Ilan deverá mostrar um quadro melhor para Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no fim deste mês, quando será divulgado o Relatório Trimestral de Inflação. No documento anterior, liberado em março, a projeção era de custo de vida de 4,9% em 2017, índice que incorporava um dólar de R$ 3,70. Agora, com a forte queda da moeda norte-americana, é possível que a estimativa se aproxime mais de 4,5%, o centro da meta que o Brasil não vê desde 2009.

 

Isso não quer dizer que os juros cairão na mesma proporção que aumenta o interesse do Planalto sobre o assunto. A taxa Selic será cortada muito lentamente. Na verdade, as reduções terão mais efeitos psicológicos do que práticos — o Brasil continuará tendo os maiores juros do mundo por um longo período. A perspectiva do governo é de que os empresários acreditem que, em algum momento, o país terá um nível mais civilizado para o custo do dinheiro, e voltem a produzir e a contratar. Entre desejo e realidade, porém, a distância é grande.

 

Apesar do direito legítimo de torcer pela queda dos juros, Temer não pode repetir os erros da presidente afastada, Dilma Rousseff. Ela quebrou todas as regras e simplesmente obrigou o BC a cortar a Selic apesar da inflação alta. O resultado todo mundo sabe: inflação média anual de 7,1% nos quase cinco anos e meio em que ela comandou o país. Ninguém, nem mesmo os empresários que cobram juros menores, quer ver esse filme de novo.

 

Brasília, 05h17min