Coluna no Correio: Prepare o coração

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A primeira semana de Michel Temer como presidente efetivo foi um resumo importante do que será o governo até seu encerramento em 2018. Quem estava esperando por um período mais tranquilo, depois do tsunami que resultou no impeachment de Dilma Rousseff, terá que preparar o coração. Nos últimos sete dias, o peemedebista enfrentou protestos, teve que recuar em projetos importantes, como nas reformas da Previdência e trabalhista, e foi obrigado a demitir um ministro para reforçar o poder de outro.

Em meio a esse turbilhão, Temer ainda obrigou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, a soltar um comunicado público negando que o governo esteja analisando mudanças no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). O chefe da equipe econômica jogou no colo do Tesouro Nacional a culpa pelo ruído, alegando que a decisão de contratar um estudo que visa restringir os saques do FGTS foi tomada sem que o comando do ministério fosse informado. Meirelles, por sinal, partiu para cima dos técnicos envolvidos com o tema para cobrar explicações. Sentiu-se traído.

Para um governo que não desfruta de popularidade, é complicado mexer em tantos vespeiros ao mesmo tempo. Essa visão é compartilhada por raposas políticas e por gente graúda do mercado financeiro. O entendimento é de que o Planalto deveria ir devagar e concentrar esforços para aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento de gastos à inflação do ano anterior. Apesar de sua amplitude, a medida não provoca tanta comoção como as reformas. A partir da aprovação da PEC, as mudanças no sistema previdenciário entrariam na pauta com um governo mais coeso para defendê-las.

Risco de repetir FHC

Em entrevista ao site do Correio, o cientista político Antonio Augusto Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), afirma que Temer está cometendo os mesmos erros de Fernando Henrique Cardoso, que enviou ao Congresso, de uma única vez, medidas muito polêmicas. Acabou enfrentando um tiroteio que lhe custou quase toda a popularidade no segundo mandato.

Para Queiroz, por mais que o Planalto insista em encaminhar a proposta de reforma da Previdência ao Congresso até o fim deste mês, antes, portanto, das eleições municipais, como pleiteia o PSDB, o tema tende a ser, efetivamente, discutido pelos parlamentares a partir de fevereiro de 2017, quando voltarão do recesso. Durante esse período, contudo, o governo apanhará, pois as corporações já estão se preparando para barrar tudo o que podem.

A gritaria, ressalte-se, está sendo alimentada pelo governo, que nomeou para áreas estratégicas ministros mais preocupados em aparecer do que em fazer um movimento estratégico para convencer a sociedade da importância das reformas. Um exemplo é o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. Primeiro, ele informou que a reforma trabalhista aumentará a carga horária diária para até 12 horas. Depois, recuou, dizendo que foi mal interpretado. Acabou, posteriormente, admitindo que o tema está, sim, sendo estudado. Enfim, um vaivém que só atrapalha Temer.

De arrepiar

Entre os principais banqueiros do país, que, constantemente, têm se reunido para fazer avaliações do governo, a torcida é para que Temer encontre rapidamente o tom do discurso. Eles admitem que não será fácil, uma vez que o ministério político montado pelo peemedebista está muito preocupado em jogar para a plateia a fim de pavimentar o caminho para as eleições de 2018. Alguns tentarão a reeleição ao Congresso. Outros pretendem se candidatar ao governo dos respectivos estados.

Administrar esses anseios que não combinam com um governo técnico, vital para fazer o ajuste fiscal, demandará muita energia de Temer. Energia que poderia ser dispensada para resolver os problemas gravíssimos do país, que sequer consegue educar suas crianças e jovens. É inadmissível que, em vez de avançarmos, estejamos regredindo na educação daqueles que vão garantir o futuro da nação.

Na capital do país, onde a qualidade do ensino sempre foi referência, 15% dos estudantes do ensino médio e fundamental tiraram nota zero nas provas de português e de matemática, segundo o mais recente Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Esse é o pior sinal de que estamos mergulhados nas trevas.

Brasília, 05h10min

Vicente Nunes