Coluna no Correio: Os juros de Temer

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Em meio ao vaivém de decisões, o que causa péssima impressão do governo, o presidente Michel Temer poderá receber uma ótima notícia bem antes do esperado. Se nada mudar no meio do caminho, na segunda quinzena de outubro, o Banco Central dará início ao corte da taxa básica de juros (Selic), que está em 14,25% ao ano desde julho de 2015. A inflação, que se mantinha resistente, cedeu com força, puxada pelos alimentos. O dólar está comportado, abaixo dos R$ 3,30 que o BC considera como teto para não pressionar o custo de vida. Só falta, agora, o Palácio do Planalto fazer andar, no Congresso, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento de gastos à carestia do ano anterior. É a senha que o banco deseja.

Dentro do BC, a ordem é tratar do tema com cautela, ainda que a maioria dos diretores da instituição se mostre favorável ao alívio monetário o mais rapidamente possível. Ao mesmo tempo que indica que as portas estão abertas para a queda da Selic, o banco reforça que há riscos no meio do caminho, e que é preciso minimizá-los. O presidente do BC, Ilan Goldfjan, tratou de preparar os agentes econômicos para o que está por vir. Ele é o principal defensor da queda dos juros, mas insiste que não há espaço para aventuras. Na visão de Ilan, o governo precisa dar demonstrações mais fortes de compromisso com o ajuste fiscal. A maior preocupação da autoridade monetária é não passar uma imagem de leniência em relação à inflação.

Para Maurício Molan, economista-chefe do Banco Santander, o BC deverá dar um importante sinal no sentido de que os juros podem cair a partir de outubro no Relatório Trimestral de Inflação, que será divulgado na próxima terça-feira. A expectativa é de que as projeções de mercado já mostrem o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) perto do centro da meta, de 4,5%, em 2017. Nas contas de Molan, replicando o modelo usado pela autoridade monetária, as estimativas dos analistas privados tendem a ficar em 4,8% no ano que vem. No último relatório, de junho, a previsão era de 5,5%. Confirmada, tal estimativa será uma vitória e tanto para a autoridade monetária.

Dólar de equilíbrio

Na opinião do presidente da Ordem dos Economistas do Brasil, Manuel Enriquez García, a maior parte do mercado já reviu as projeções de inflação para ano que vem. E o consenso caminha para uma taxa inferior a 5%. Isso foi possível graças ao resultado do IPCA-15, prévia do índice oficial, que ficou em 0,23% em setembro. “Os números da pesquisa Focus realizada semanalmente pelo BC serão muito positivos daqui por diante”, afirma. As previsões para o IPCA fechado do mês estão entre 0,2% e 0,3%. “Tudo está conspirando para a queda dos juros a partir de outubro”, afirma. A grande dúvida é se o Comitê de Política Monetária (Copom) começará o corte da Selic com 0,25 ou 0,5 ponto percentual.

Do ponto de vista da atividade, que ainda se debate para sair da recessão, García diz que a redução da Selic agora não fará diferença. A queda, contudo, será fundamental para dar ânimo novo aos agentes econômicos, que, nos últimos anos, lidaram com um contexto muito desfavorável. Com Dilma Rousseff na Presidência da República, a inflação passou de 10%, o Produto Interno Bruto (PIB) desabou, o desemprego quase triplicou, e as contas públicas foram devastadas. “O país está precisando de boas notícias. É preciso, porém, que o governo também dê sua contribuição, fazendo o ajuste fiscal andar”, ressalta.

O economista lembra que, ao reduzir a intervenção no mercado de câmbio, o BC tirou importante pressão sobre o dólar e a inflação. A instituição vinha comprando, por meio de contratos de swap reverso, cerca de US$ 500 milhões por dia. Como a moeda norte-americana andou estressada diante do temor dos investidores de alta dos juros nos Estados Unidos, as operações no mercado futuro cederam para US$ 250 milhões. O próprio presidente do BC indicou que o espaço para essas transações com swap havia diminuído. Para o banco, um dólar oscilando entre R$ 3,10 e R$ 3,30 não gera nenhuma perturbação no quadro inflacionário.

Incertezas

Resta saber se o governo não adicionará nenhum ingrediente de tensão nesse cenário de calmaria. É muito provável que os investidores reajam negativamente, num primeiro momento, à decisão do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), de autorizar uma investigação preliminar sobre uma citação da delação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, que envolve Michel Temer. Segundo Machado, Temer teria pedido a ele uma doação de R$ 1,5 milhão para a campanha de Gabriel Chalita à prefeitura de São Paulo em 2012.

Estrategicamente, Zavascki fez o pedido de investigação sobre Temer em uma petição em separado dos demais políticos citados por Machado como beneficiários do esquema de corrupção que destruiu o caixa da Petrobras. Isso indica que o ministro sabe que, dificilmente, o procurador-geral da República levará o caso do presidente à frente, uma vez que o chefe do Executivo não pode responder por atos anteriores a seu mandato. De qualquer forma, o tema gera preocupação, pois tudo o que Temer precisa neste momento é de tranquilidade para unir sua base política e aprovar o ajuste fiscal no Congresso.

No Palácio do Planalto, a decisão de Zavascki foi vista com cautela. Um dos mais próximos assessores de Temer diz que o presidente está tranquilo e que acredita que as investigações não vão prosperar, porque não houve nenhuma irregularidade na destinação do R$ 1,5 milhão a Chalita. Esse auxiliar reconhece, no entanto, que toda citação contra Temer atrapalha, já que cria ruídos desnecessários e dá munição à oposição.

“Tomara que os investidores tenham uma visão clara de que não há nada que possa constranger o presidente. O que ele mais quer é tornar o ajuste fiscal realidade, para que o país possa voltar a crescer e a criar empregos”, frisa o assessor presidencial. Independentemente da tranquilidade com que Temer trata o assunto, sempre é importante tomar muito cuidado com os donos do dinheiro. Eles não toleram incertezas.

Brasília, 06h30min

Vicente Nunes