Coluna no Correio: O que quer o BC

Publicado em Economia

O Banco Central deixou claro ontem que não permitirá marolas no mercado de câmbio, sobretudo às vésperas de o Senado aprovar o impeachment definitivo de Dilma Rousseff. A forte arrancada da moeda norte-americana, que encostou nos R$ 3,25 depois de flertar com os R$ 3,10 uma semana atrás, foi uma mostra de como o mercado pode sair de um quadro de excesso de euforia para o de estresse total. Esses movimentos bruscos costumam levar muita gente a nocaute, deixando um rastro de prejuízo que mina a confiança e prejudica o andamento da economia.

 

Há pelo menos duas semanas, em conversas com analistas, dirigentes do BC vêm alertando sobre os perigos do otimismo exagerado do mercado. As apostas na queda da moeda norte-americana chegaram a ultrapassar os US$ 30 bilhões. A avaliação predominante era de que, com Michel Temer efetivado na Presidência da República, uma enxurrada de recursos estrangeiros entraria no país, levando o dólar a romper o piso de R$ 3.

 

Esse movimento estava tão forte que a autoridade monetária foi obrigada a ampliar a intervenção no câmbio, elevando as compras diárias de US$ 500 milhões para US$ 750 milhões no mercado futuro, por meio dos swaps reversos. O problema é que a presença maior do BC nas negociações coincidiu com os sinais de dificuldade do governo para levar adiante o ajuste fiscal. O humor dos investidores mudou e o sinal de alerta acendeu.

 

Tabelamento

 

Técnicos do BC explicam que o papel da instituição é reduzir a volatilidade do mercado. E isso vale tanto nos momentos em que o dólar está em baixa quanto naquele em que a moeda está subindo. Não se trata, segundo eles, de fixar um piso ou um teto para a moeda norte-americana, pois o câmbio é flutuante. A meta do BC é “limpar” o mercado de movimentos atípicos, que acabam contaminando os juros e a bolsa de valores.

 

Vários analistas, porém, acreditam que o BC está tentando manter o dólar flutuando dentro de uma “banda suja”. Dessa forma, atenderia dois objetivos: não pressionar a inflação e manter a competitividade das exportações. Os mais radicais acreditam que a instituição tabelou a moeda norte-americana entre R$ 3,10 e R$ 3,30. Justificam isso com o argumento de que, quando a divisa dos Estados Unidos se movimentou em direção aos R$ 3,30, o banco reduziu as intervenções com swaps reversos. Quando o preço apontou para R$ 3,10, as intervenções aumentaram.

 

“Não há tabelamento”, reforça um graduado funcionário do BC. “Isso não existe”, emenda. O papel da autoridade monetária, garante ele, é dar transparência às negociações e reforçar que o sistema de taxas flutuantes, que foi deturpado nos últimos anos, está vigorando. “Tudo o que não se quer agora é repetir os erros do passado. O BC perdeu muita credibilidade. O nosso papel neste momento é construir reputação. E isso não combina com banda suja de flutuação nem com tabelamento”, afirma.

 

Ponto de equilíbrio

 

Um experiente operador de câmbio, muito alinhado com o BC, diz que a instituição está agindo corretamente. Ele assinala que, além das incertezas em relação ao ajuste fiscal, houve uma diminuição no fluxo de recursos para o Brasil nos últimos dias. Na avaliação dele, é loucura a autoridade monetária querer fixar piso e teto para o dólar, pois o risco de perda é muito elevado. “Não tenho dúvidas de que a grande preocupação do BC neste momento é com a saúde do sistema financeiro”, frisa. “Ninguém quer ver a repetição de quebradeiras como as de 2008, quando gigantes como a Sadia e a Aracruz Celulose, que apostavam numa forte queda do dólar, se viram numa enrascado com a disparada dos preços da moeda.”

 

Há outra ressalva importante, na opinião do operador: o BC precisa manter a sensação de bem-estar, que é vital para o sucesso do governo Temer. O dólar nos preços atuais animam a classe média a viajar novamente para o exterior, permite a importação de máquinas e equipamentos para a retomada dos investimentos e a criação de empregos e minimiza a gritaria dos exportadores. “O BC não deixará o dólar sair do que considera um ponto de equilíbrio. E esse é o papel de uma autoridade monetária séria e consciente”, conclui.

 

Brasília, 05h12min