Coluna no Correio: O BC colocou água no chope do Planalto

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O Palácio do Planalto levou um susto com o comunicado liberado pelo Banco Central logo após a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de reduzir a taxa básica de juros (Selic) em um ponto percentual, para 10,25% ao ano. Na avaliação de auxiliares diretos do presidente Michel Temer, o BC “amarelou” ao sinalizar que, a partir de agora, os juros vão cair mais devagar.

A equipe mais próxima de Temer esperava um sinal de apoio do banco à retomada da economia e não um alerta contundente sobre incertezas. No comunicado pós-Copom, o BC citou cinco vezes a palavra incerteza, jogando para o governo e o Congresso a responsabilidade por uma política monetária menos flexível. “Sinceramente, não entendemos o porquê de o Banco Central fechar as portas para cortes mais profundos na Selic”, diz um dos assessores presidenciais.

Para o Planalto, mesmo com toda a turbulência política provocada pelas delações dos irmãos Joesley e Wesley Batista, do grupo JBS, os indicadores de inflação estão comportados. Em junho, por sinal, a perspectiva dos analistas é de que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) seja negativo, puxado pela deflação dos alimentos e das tarifas de energia elétrica. É possível que, em 12 meses, a taxa acumulada fique muito próxima de 3%.

Assessores de Temer reconhecem que o comportamento técnico da diretoria do BC é vital para manter a credibilidade da política de juros e, sobretudo, manter ancoradas as projeções de inflação dos próximos anos abaixo do centro da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de 4,5% ao ano. Mas destacam que, dada a fragilidade da atividade, que está em processo lento de recuperação, juros de 10,25% são elevados demais. A taxa real, que desconta as projeções para o IPCA, aumentou, inibindo ainda mais o apetite do empresariado por investimentos no aumento da produção.

Questão de sobrevivência

Mesmo dentro da equipe econômica, houve uma certa decepção com o BC. “Estamos fazendo um esforço enorme para difundir um discurso positivo, de que o país está se recuperando, e vem o Banco Central dizer que não é bem assim”, destaca um técnico. Para ele, o BC poderia ter sido mais sutil no comunicado pós-Copom. “Que o clima está pesado todo mundo sabe. Mas precisamos pregar confiança. Temos que convencer os agentes econômicos de que a crise política não está parando o país”, complementa. “Demos um passo atrás com a decisão do BC.”

A perspectiva do governo é de que, com o Banco Central pisando no freio dos juros, a estabilização do desemprego e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre — o dado oficial será divulgado hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística — ajudem a manter a percepção de que nem tudo está perdido. “Para o discurso ao grande público, o que importará, quando falarmos do BC, é que os juros estão em queda, no menor nível desde outubro de 2013”, destaca um ministro com trânsito no Planalto. “É isso que vamos botar na mesa em todas as conversas, seja com investidores, seja com parlamentares, com vistas a aprovar as reformas trabalhista e da Previdência Social”, emenda.

O governo, ressalta o mesmo ministro, acredita que ainda tem força para aprovar a reforma trabalhista no Senado. Quanto à Previdência, está longe de dizer o mesmo. “Desde 17 de maio, quando estourou a bomba dos irmãos Batista, cada dia é um dia para o governo. Já foi pior, mas estamos longe de dizer que a crise melhorou”, assinala. A meta é aproveitar todas as janelas de oportunidades para criar fatos positivos. “É questão de sobrevivência”.

Aposta em 8,25%

Nas previsões do Planalto, ainda é possível a Selic encerrar o ano com os juros em 8,25%. Para que isso ocorra, a taxa básica terá que cair mais dois pontos percentuais nas próximas quatro reuniões do Copom. Do ponto de vista da inflação, acreditam assessores de Temer e integrantes da equipe econômica, não haverá problema, pois não há pressão nos preços, nem mesmo do dólar, que se assanhou bastante depois das delações dos Batista, mas já está se acomodando.

Para os analistas, um BC sem ufanismos é bom. Mas também não pode ser um BC conservador demais. A economia está precisando de gás. O Brasil não aguenta um terceiro ano de recessão. Portanto, um pouquinho mais de ousadia do time comandado por Ilan Goldfajn poderia fazer uma diferença e tanto neste momento tão conturbado, no qual a desesperança tomou conta e se recusa a sair de cena.

Brasília, 06h16min

Vicente Nunes