Coluna no Correio: É muito cedo para comemorar

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A confusão no governo em torno da reforma da Previdência é tão grande que o maior ganho do país, a queda da inflação, já começou a entrar nos cenários de risco para 2018. Especialistas dizem que, num quadro de normalidade, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechará o próximo ano abaixo do centro da meta, de 4,5%. O problema é que a turbulência política poderá provocar fortes oscilações no dólar, contaminando os índices de preços. Por enquanto, é uma hipótese de baixa probabilidade, mas que pode se transformar em alerta amarelo se, além da derrota da reforma da Previdência, o governo não conseguir aprovar as medidas do ajuste fiscal, como o adiamento dos reajustes de servidores de 2018 para 2019.

Sem os mais de R$ 12 bilhões que o Tesouro pretende arrecadar com tais medidas, o governo, muito provavelmente, será obrigado a rever, mais uma vez, a meta de deficit prevista para 2018. Inicialmente, o rombo poderia ser de, no máximo, R$ 139 bilhões. O Ministério do Planejamento, inclusive, chegou a enviar ao Congresso uma proposta de Orçamento com esse número. Mas, depois, acabou ajustando o dado e passou a trabalhar com deficit de R$ 159 bilhões. Sem as restrições impostas aos servidores — além do adiamento dos reajustes, o funcionalismo terá que pagar 14% de contribuição previdenciária, e não 11% —, ou o governo ampliará a previsão de buraco nas contas ou terá de cortar pelo menos R$ 50 bilhões em gastos.

Os alertas em relação à grave situação fiscal são cada vez maiores. Não por acaso, a equipe econômica está desesperada para que o Palácio do Planalto mantenha o máximo possível das propostas da reforma da Previdência. Um projeto que resulte em economia inferior a 50% da economia prevista pelo Ministério da Fazenda de nada adiantará. Pior, poderá levar o governo a descumprir o que os especialistas definem como regra de ouro, ou seja, o pagamento de despesas correntes, como salários, com a emissão de dívida. Seria um crime fiscal pior do que as pedaladas que derrubaram Dilma Rousseff.

Abaixo da meta

Na opinião de Rafael Leão, economista-chefe da consultoria Parallaxis, mesmo com a gravidade da situação fiscal, não há por que se preocupar com a inflação. Ele ressalta que os dados divulgados na sexta-feira, 10, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que o custo de vida está sob total controle. A previsão dele é de que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que subiu 0,42% em outubro, encerre o ano em 3,2%, praticamente no piso da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Para 2018, prevê taxa de 4,1%.

“O nível de atividade está muito fraco. A recuperação da economia será bastante lenta. Tanto que, somente em meados de 2019, voltaremos a atingir o nível do Produto Interno Bruto (PIB) de antes da crise que levou à recessão”, explica Leão. “O mercado de trabalho também está fraco, longe de provocar pressão de demanda. A destruição da renda das famílias foi intensa”, acrescenta. Por isso, ele acredita que o Banco Central levará a taxa básica de juros (Selic), hoje em 7,50% ao ano, para abaixo de 7% até janeiro próximo. “Minha projeção é de que a Selic chegue a 6,75%.”

Dentro do governo, a torcida também é para que o BC corte os juros o máximo possível. Por diversas vezes, o presidente Michel Temer afirmou que os juros podem cair abaixo de 7%. Contudo, entre o discurso presidencial e a realidade, há uma enorme distância. O BC não quer pôr em risco todas as conquistas obtidas até agora. Os juros vêm cedendo desde outubro de 2016, quando estavam em 14,25%. Foi a reconstrução da credibilidade da política monetária que permitiu que a Selic baixasse tanto. Como diz o presidente do BC, Ilan Goldfajn, é preciso ter liberdade para as decisões sobre juros. Mas sempre com muita cautela. Ainda há muito a fazer na área fiscal, sendo a mais urgente das tarefas a reforma da Previdência.

Brasília, 06h08min

Vicente Nunes