Coluna no Correio: A dependência de Temer

Publicado em Economia

Um diálogo entre dois técnicos do Ministério da Fazenda resume hoje, claramente, o papel de Henrique Meirelles no governo. “Muitos têm me perguntado sobre a força do ministro e se realmente ele é respeitado pelo presidente interino, Michel Temer. A minha resposta é sempre a mesma. Ainda que Temer pensasse em não dar tanto poder a Meirelles, não correria esse risco. Ele precisa que a economia dê certo. Dilma Rousseff não caiu por causa das pedaladas fiscais nem da Lava-Jato. O que a derrubou foi a gravíssima recessão. Ela mexeu com a parte mais sensível do cidadão, o bolso”, diz um dos técnicos. “Isso significa que, mesmo com toda a pressão contrária da ala política do Planalto, Temer manterá Meirelles forte depois do impeachment?”, questiona o outro. “Não tenho dúvidas disso”, responde o interlocutor.

 

Não há nenhum exagero na visão desses técnicos. Por mais que o governo insista em difundir o discurso de que a economia está começando a melhorar, muita coisa ruim ainda está por vir, o que dará a sensação de que Temer não está fazendo nada ou está fazendo muito pouco para tirar o país do buraco. Na cabeça dos brasileiros, pelo menos da maioria, Dilma já é passado. Agora, o Brasil está sob a responsabilidade do peemedebista. E se a vida está ruim, a culpa é dele. Portanto, não é o caso de brincar com fogo agora. Queira ou não queira o interino, Meirelles se tornou o fiador de que tempos melhores estão por vir. Entregar o ministro ao fogo amigo neste momento seria sentenciar o fracasso antecipado do governo.

 

Um sinal eloquente de que o descontentamento da população está longe do fim foi a taxa de desemprego divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 11,3% — um recorde. A destruição do mercado de trabalho continua a todo vapor, apesar dos sinais de retomada da confiança que o governo tanta alardeia. São 11,6 milhões de desocupados, contingente que continuará crescendo enquanto a página da recessão não for, definitivamente, virada. A renda média, de R$ 1.972, é a menor desde 2012. Das poucas vagas que o país ainda está criando, a maioria está na informalidade. A precarização do emprego é visível. Não há a desejada rede de proteção social.

 

Pior dos mundos

 

Nas conversas diárias que tem com Temer, o ministro da Fazenda apresenta números de que o quadro econômico está melhor do que há três meses, quando Dilma agonizava. Mas tudo é muito mais discurso do que realidade. A economia está estraçalhada. Reconstruí-la levará muito tempo. O próprio Meirelles ainda não conseguiu dar um jeito nas contas públicas. O governo central (Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência) registrou, nos primeiros seis meses do ano, rombo de R$ 32,5 bilhões. Sabe-se que o segundo semestre será muito, mas muito, pior. O deficit entre julho e dezembro pode chegar a R$ 138 bilhões. Esse número precisa ser confirmado para que o governo não estoure a projeção de um buraco de R$ 170,5 bilhões.

 

Apesar de monstruoso, o rombo pode ser maior. Tudo dependerá de como se encaminharão as receitas. Todas as fontes de arrecadação estão em queda, sem perspectiva de recuperação. A confiança dos agentes econômicos, que Meirelles diz estar voltando, não se traduziu, até agora, em alívio para a Receita Federal. Mesmo as empresas que têm caixa estão segurando o pagamento de tributos, temendo ficar descapitalizadas. Será preciso uma virada mais forte na economia para que esse tipo de ação preventiva seja abandonada. O governo acredita que o grande marco para um cenário mais benigno será a aprovação definitiva do impeachment de Dilma Rousseff.

 

Quando pede que o processo de afastamento da petista ocorra dentro do prazo, ou seja, até o fim de agosto, Temer reforça o temor de que o protelamento da votação no Senado acabe provocando mais instabilidade. Os agentes econômicos não querem nem ouvir falar na possibilidade de a votação do impeachment se arrastar para além de setembro. A razão é simples. Todo o cronograma traçado pelo governo para a aprovação do projetos que garantirão o ajuste fiscal — sendo o mais importante deles, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento dos gastos à inflação do ano anterior — tem que ser cumprido até o fim deste ano. Se não for, o presidente interino terá que prestar contas com os mercados, que deram um importante voto de confiança a ele. Certamente, será o pior dos mundos.

 

Brasília, 07h01min