Coluna no Correio: A casa caiu

Publicado em Economia

A possível prisão do ex-presidente Lula entrou com tudo no radar dos investidores. Até a denúncia feita ontem à Justiça pelo Ministério Público, na qual o petista é apontado como “o comandante máximo do esquema de corrupção na Petrobras”, um número muito pequeno de integrantes do mercado acreditava na possibilidade de ele ir para trás das grades. A partir, porém, do que apresentou a força-tarefa da Operação Lava-Jato, essa percepção mudou por completo. Nas contas de operadores, já são de mais de 50% as chances de Lula ser preso.

 

O grande temor dos investidores é sobre o que pode acarretar a prisão de um dos maiores líderes políticos num país conflagrado. Na visão dos donos do dinheiro, se já há uma radicalização preocupante por causa do impeachment de Dilma Rousseff, tirar Lula do circuito pode incendiar de vez o Brasil. Uma coisa é o afastamento de Dilma. Outra, é prender Lula. A pergunta que todos se fazem é se a Justiça comprará essa briga. Como já ressaltou a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, o momento é de pacificação, o que não combina com o petista na prisão.

 

Os investidores estão em polvorosa, tentado mapear todos os impactos da possível detenção de Lula, a começar pelas eleições municipais de outubro próximo. Está claro que o PT sairá muito menor nas urnas do que quatro anos atrás. Contudo, com Lula na linha de tiro da Justiça, diminui a força de um grande alavancador de votos. A situação do partido pode, portanto, ser ainda pior do que o mostrado até agora pelas pesquisas eleitorais.

 

A grande dúvida é se, no caso de não ser preso, o líder petista continuará competitivo nas eleições de 2018. Hoje, todas as projeções mostram Lula no segundo turno, vencendo quase todos os adversários. Ninguém descarta que, em vez de enfraquecerem o ex-presidente, as denúncias do MP e o risco de prisão o fortaleçam ainda mais, a ponto de ele retornar ao comando do Palácio do Planalto daqui a pouco mais de dois anos.

 

De arrepiar

 

Na opinião de um grande banqueiro, olhando apenas o que foi apresentado pela Lava-Jato, Lula pode ser preso num prazo curto de tempo. Mas ele não acredita que haja vontade política, aí incluindo a Justiça, de levar o ex-presidente para trás das grades. Será preciso a apresentação de provas muito contundentes para que a prisão ocorra. “Os argumentos para a denúncia do petista e da mulher dele, Marisa Letícia, apresentados pelo procurador da República Deltan Dallagnol são robustos e assustadores. Contudo, para aceitar a denúncia, o juiz Sérgio Moro exigirá mais”, afirma.

 

O mesmo banqueiro chama a atenção para o fato de o Ministério Público ter identificado um esquema muito maior do que o da Petrobras. Segundo Dallagnol, foi identificada a República da “propinocracia”, que pega, entre outros, a Eletrobras, a Caixa Econômica Federal e os ministérios da Saúde e do Planejamento. “Ou seja, muita coisa ainda está por vir. Inclusive para o PMDB, o partido do presidente Michel Temer”, ressalta.

 

Não à toa, o Palácio do Planalto orientou todos os ministros a não se manifestarem oficialmente sobre as denúncias contra Lula, chamado pelo MP de o grande general. A cúpula do entorno de Temer tem a exata noção de que as investigações da Lava-Jato pegarão caciques importantes do partido. Será apenas questão de tempo. Sendo assim, não há porque chamar a crise para a legenda. O melhor é assistir ao PT e seu líder máximo queimando em praça pública.

 

“Cada um com seus problemas. Os nossos estão contratados. O que temos que fazer é nos prepararmos para quando o tiroteio chegar. Será pesado”, diz, resignado, um integrante do Planalto. Na avaliação dele, neste momento, com Lula concentrando todas as atenções do lado político, o governo tem que avançar na economia, se possível, aprovando na Câmara dos Deputados, logo depois das eleições municipais, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento de gastos à inflação do ano anterior.

 

Conflitos nas ruas

 

Os investidores querem saber até onde vai essa tentativa de distanciamento do governo. O que não falta, no entorno de Temer, são auxiliares criando problemas ao darem informações fora de hora. Muito das resistências a projetos importantes, como a PEC do teto dos gastos e as reformas da Previdência Social e trabalhista, decorre dos ruídos criados por gente do alto escalão do governo. “Não precisará muito para o Planalto se envolver na crise provocada pelas denúncias contra Lula. Bastará um passo em falso para que o governo se enrole todo”, diz um executivo de um banco estrangeiro.

 

Para ele, hoje, o quadro é favorável a Temer, pois reduzirá a pressão de Lula contra o governo, já que o petista terá que dedicar todo o seu tempo para se defender. “Lula tem sido o artífice das pressões que as centrais sindicais e os movimentos sociais vêm fazendo para tentar impedir o andamento da PEC dos gastos e das reformas. Com o petista enrolado, pode ser que isso esfrie um pouco”, acrescenta o executivo. Outro operador de mercado, porém, discorda. Acredita que, agora, com o líder petista engolfado pela Lava-Jato, o PT e seus aliados vão amplificar o barulho.

 

Os próximos dias prometem. Quem esperava uma certa trégua depois do impeachment de Dilma Rousseff e da cassação do mandato de Eduardo Cunha, deve se preparar para o recrudescimento da crise política. As ruas mostrarão que a pacificação pregada pela presidente do Supremo está muito distante da realidade.

 

Brasília, 05h33min