Não se trata de motivo para alarde, mas o Banco Central acendeu o sinal de alerta diante da instabilidade que se instalou nos mercados internacionais e que transformaram a bolsa de valores e o dólar em verdadeiras gangorras. Se, há quatro meses, havia a confiança de que as taxas de juros nos Estados Unidos não subiriam mais neste ano, que os bancos centrais da Europa e do Japão estavam dispostos a injetar a quantidade necessária de dinheiro na economia para estimular a atividade e que a China havia conseguido equilibrar o ritmo de sua desaceleração, hoje, a incerteza é grande.
O terreno se tornou tão pantanoso, que o presidente do BC, Ilan Goldfjan, tem dedicado um bom par de horas de sua concorrida agenda para mapear até onde pode ir o nervosismo que tomou conta de parte significativa dos investidores. Ilan não quer ser surpreendido por um evento extraordinário, que possa dificultar o trabalho que vem fazendo para levar a inflação de 2017 ao centro da meta, de 4,5%. Até R$ 3,30, a moeda norte-americana não é um problema para o controle do custo de vida. A partir daí, porém, a convergência do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para a meta se torna um problema.
As contas são do BC: a cada 10% de alta do dólar, a inflação aumenta 0,5 ponto percentual. É muito, sobretudo quando se está buscando, desesperadamente, conter a carestia e controlar as expectativas dos agentes econômicos. Apesar de todo o esforço que já foi feito pela autoridade monetária, os analistas resistem em acreditar que o IPCA cederá até os 4,5% no ano que vem. Os especialistas mantêm firme a projeção média de 5,1%. Isso, mesmo com o dólar tendo chegado a quase R$ 3,10 recentemente. Ou seja, o câmbio se tornou uma variável importantíssima neste momento para a inflação, mais até que o ajuste fiscal, que só terá efeito a mais longo prazo, se aprovado pelo Congresso.
Bolha imobiliária
Ninguém no BC acredita — não neste momento — em uma arrancada brusca do dólar a curto prazo. Primeiro, porque é mínima a chance de o Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos Estados Unidos, aumentar os juros na reunião da próxima semana. Em dezembro, porém, tudo pode acontecer. Os alertas que alguns dirigentes da instituição têm dado em direção à alta da taxa básica vêm se tornando mais frequentes, o que elevou o nível de estresse dos mercados.
Para um técnico da equipe econômica, como o aumento dos juros nos EUA será mínimo e feito gradualmente, os efeitos no Brasil serão sentidos na margem. Mas é preciso cuidado, pois outras ameaças estão no horizonte, como um possível estouro da bolha imobiliária da China. Os preços dos imóveis subiram tanto em Pequim e em Shangai, que apartamentos já estão sendo vendidos por valores muito próximos aos de Manhattan, em Nova York. É impossível isso se manter de pé.
Mas não é só. O governo do país asiático ainda não conseguiu encontrar um ponto de equilíbrio para a transição do modelo de crescimento baseado no investimento e na exportação para aquele sustentado pelo consumo interno. Famílias e empresas estão sendo incentivadas ao endividamento, como fez o Brasil em 2008 e 2009. Para se ter uma ideia disso, somando todas as dívidas, inclusive as concedidas no mercado paralelo, o tal do shadow bank, chega-se a quase 300% do Produto Interno Bruto (PIB). É verdade que a China tem poupança para um eventual colapso do crédito, mas o estrago será grande.
Calma com os juros
Nesse quadro de incerteza externa, com os bancos centrais da Europa e do Japão menos dispostos a ampliar o volume de dinheiro despejado na economia, não dá para ser tão firme nas apostas de que o BC começará a cortar a taxa básica de juros (Selic) em outubro. Para que isso ocorra, será preciso que o mercado externo dê uma acalmada e que o Câmara dos Deputados aprove, em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento de gastos à inflação do ano anterior. Poucos acreditam nisso.
Sendo assim, é melhor esperar novembro chegar. Que o BC de Ilan quer cortar juros, ninguém tem dúvidas. Mas ele sabe que não pode se precipitar, pois qualquer derrapada custará a destruição de toda reputação do banco construída desde que a atual diretoria tomou posse. Para técnicos da instituição, Ilan prefere sacrificar um pouco mais a economia com juros mais altos, do que ser comparado a seu antecessor, Alexandre Tombini, que minou a credibilidade da política monetária.
“O desejo de reduzir os juros é visível entre os diretores do BC”, diz um técnico. “Mas ainda há alguns senões importantes no meio do caminho, um deles, o dólar”, acrescenta. O momento, portanto, exige paciência e sabedoria. Pelo menos, até agora, a diretoria de Ilan não tem decepcionado. Resta saber se o restante do governo terá o mesmo tipo de comportamento.
Brasília, 05h32min