Coluna no Correio: Bem longe de Barbosa e Levy

Publicado em Economia

Nada incomoda mais a equipe econômica do que comparar o atual ajuste fiscal com o que estava em vigor até Dilma Rousseff ser afastada do poder. Auxiliares do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, garantem que, a partir da posse de Michel Temer, houve uma ruptura na condução do processo de arrumação das contas públicas. Não há, no entender deles, a menor possibilidade de se repetir os erros do passado. Asseguram que o que foi prometido será entregue, a começar pelo cumprimento de um deficit de até R$ 170,5 bilhões neste ano.

 

O tom usado pelos técnicos da Fazenda para rebater as comparações de que Meirelles está seguindo na mesma linha das propostas apresentadas por Nelson Barbosa, que comandava a pasta até Dilma ser apeada do cargo, é forte. Eles garantem que, agora, está se falando de mudanças estruturais, que têm como base a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limitará o aumento de gastos à inflação do ano anterior. Isso, acrescentam, não é paliativo com duração de curto prazo.

 

“Tudo o que estamos dizendo e fazendo tem grande significado macroeconômico. Trata-se da mudança do regime fiscal”, diz um dos técnicos. Para ele, assim como é um despropósito tentar igualar Meirelles a Barbosa, é inaceitável dizer que o ministro pode ter o mesmo destino de Joaquim Levy, que chegou à Fazenda no início do segundo mandato de Dilma propondo uma rápida e profunda arrumação das finanças do país, mas só entregou frustração e acabou sendo demitido com a pecha de incompetente.

 

Na avaliação de integrantes da equipe econômica, é natural que haja ansiedade e dúvidas entre os agentes econômicos quanto ao que está por vir. Mas, segundo eles, é preciso saber diferenciar as políticas. “Aqui não tem principiante. Todo mundo sabe o que precisa ser feito. Se o Congresso aprovar a PEC dos gastos e Michel Temer for mantido no governo até o fim de 2018, veremos, pela primeira vez em muito tempo, queda nas despesas durante a troca de mandato”, ressalta outro auxiliar de Meirelles. “Mas é preciso que o Legislativo faça a sua parte e aprove o que está sendo proposto”, acrescenta.

 

Fundo do poço

 

Para os técnicos, o mais importante é que, independentemente das dúvidas quanto ao ajuste fiscal, a atividade começa a dar sinais de que está saindo do fundo do poço. Números preliminares que circulam pelas mesas da Fazenda mostram que a indústria parou de cair e que o setor de bens de capital, atrelado aos investimentos produtivos, indica que o pior ficou para trás. Estima-se que, desde a chegada de Temer ao Planalto, no meio de maio, as empresas brasileiras já captaram quase US$ 20 bilhões no exterior. Esse mercado de crédito estava praticamente fechado até o fim do governo Dilma.

 

Nesse quadro positivo que começa a se desenhar, a equipe da Fazenda está tão ou mais otimista que o Banco Central em relação à inflação. O entendimento é de que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) vai convergir para o centro da meta, de 4,5%, até o fim de 2017, abrindo as portas para a possível queda da taxa básica de juros (Selic). Os técnicos garantem que, no que depender deles, o BC de Ilan Goldfajn não terá que se preocupar com a questão fiscal, pois não se verá mais as despesas crescendo 6% ao ano em termos reais, o que era extremamente inflacionário.

 

A equipe econômica reconhece, porém, que, mesmo com a reação da atividade, as famílias ainda vão sofrer bastante, pois o consumo continuará restrito. Além do pesado endividamento que carregam, vão se deparar com um forte desemprego. Somente em junho, mais de 91 mil pessoas com carteira assinada perderam seus postos. Nos primeiros seis meses do ano, foram 531,7 mil. Levando-se em consideração que cada casa tem, em média, quatro habitantes e que cada um dos demitidos é o arrimo da família, 2,1 milhões de brasileiros estão sendo afetados pelo fechamento de vagas.

 

“Com certeza, teremos um segundo semestre melhor que o primeiro. Ainda não dá para dizer quanto. Mas uma coisa é certa: se errarmos todas as nossas projeções — de crescimento de 1,2% em 2017 e de 2,5% em 2018 —, será para melhor”, diz um dos auxiliares mais próximos de Meirelles. Todo esse otimismo, contudo, está condicionado, primeiro, à aprovação do impeachment definitivo de Dilma e, depois, à aprovação da PEC dos gastos. Quer dizer: a política ainda continuará dando as cartas.

 

Brasília, 05h30min