Apesar do clima nada amistoso na base aliada do governo, o que pode atrasar a votação de projetos importantíssimos para o ajuste fiscal, os investidores, sobretudo os estrangeiros, estão pagando para ver. Desde a definição do impeachment definitivo de Dilma Rousseff, os donos do dinheiro intensificaram as apostas de que o presidente Michel Temer conseguirá aprovar pelo menos a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita ao aumento de gastos à inflação do ano anterior. Se ele tiver sucesso apenas nesse ponto, avaliam os investidores, será possível esperar crescimento maior da economia em 2017.
Boa parte desse otimismo está sustentado pelos ventos que vêm do exterior, acredita o economista Carlos Thadeu Filho, sócio da consultoria MacroAgro. Na avaliação dele, está cada vez mais claro que o Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos Estados Unidos, não aumentará as taxas de juros neste ano. Com isso, os países emergentes tendem a atrair um volume maior de capitais, especialmente aqueles que conseguirem levar adiante projetos de reformas. O Brasil, ainda que com anos de atraso, é um dos poucos que, atualmente, está prevendo mudanças estruturais, como a da Previdência Social.
Thadeu ressalta que, num quadro de alta dos juros nos EUA, certamente o Brasil sentiria o impacto, uma vez que os investidores sempre preferem aplicar o dinheiro na maior economia no planeta, mesmo que a taxas menores que as pagas por nações emergentes. “Como esse movimento será adiado, podemos tirar proveito. Basta que o governo avance um pouco no ajuste, com a aprovação da PEC ainda neste ano. A reforma de Previdência, a despeito de ser muito importante, pode ficar para um pouco mais adiante, para 2017. Todos vão entender”, frisa.
Na opinião de Thadeu, independentemente das recentes ameaças do Fed de alta nos juros, a instituição terá que se render à queda dos lucros das empresas nos EUA, ao menor volume de empregos criados e ao enfraquecimento da atividade, demonstrado, principalmente, pelo setor de serviços. “O Fed não conseguirá encontrar justificativa para um aperto monetário neste momento, nem mesmo diante da ligeira alta da inflação, que é temporária”, reforça.
Otimismo no BC
Se confirmado esse ambiente mais favorável, com andamento do ajuste fiscal, o sócio da MacroAgro crê que o Banco Central fará o que tanto deseja: reduzir a taxa básica de juros (Selic), de 14,25% ao ano. O corte no custo do dinheiro pode ocorrer, inclusive, em outubro. Há diretores do BC defendendo que a instituição deve se antecipar ao movimento consistente de baixa da inflação, que caminha para o centro da meta em 2017 e para abaixo de 4,5% em 2018. A aposta de queda da Selic no mês que vem é bancada, especialmente, pelos dois maiores bancos privados do Brasil, o Itaú Unibanco e o Bradesco.
O clima no BC, por sinal, é bastante positivo. Os diretores acreditam que o discurso adotado após a posse de Ilan Goldfajn na presidência da instituição convenceu a grande maioria do mercado de que não há mais complacência com a inflação. Isso que dizer que, mesmo com todas as portas abertas para a redução da Selic, a tesoura só vai funcionar quando todas as garantias estiverem às mãos.
“O BC não quer começar a cortar juros e, no meio do caminho, ser obrigado a suspender o movimento porque algo deu errado. Quer um processo consistente, até que se tenha uma Selic que, ao mesmo tempo, mantenha a inflação sob controle e estimule o crescimento”, diz um integrante da equipe econômica. “Mas isso exige inflação na meta e ajuste fiscal consistente”, acrescenta. Para esse técnico, o importante é que as condições estão dadas.
Missão difícil
Tanto o técnico do governo quanto Thadeu Filho não descartam a possibilidade de o Produto Interno Bruto (PIB) encerrar 2017 com avanço entre 2% e 3%. Eles ressaltam que essa perspectiva está contemplada pelos atuais indicadores do mercado: dólar na casa dos R$ 3,20 e bolsa de valores acima dos 60 mil pontos. “Os investidores estão se antecipando a uma retomada mais forte da atividade”, reforça o sócio da MacroAgro. Não se pode esquecer, segundo ele, que a base de comparação ajudará estatisticamente a se ter um saldo melhor da economia.
Mas que fique claro: tudo está nas mãos do governo. Se realmente houver empenho de Temer para fazer o ajuste fiscal andar, os resultados a serem colhidos podem surpreender para melhor. É esse discurso que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, vem usando nas conversas com o presidente para convencê-lo a não recorrer a saídas fáceis como, muitas vezes, defende a ala política do Planalto. “A missão de Meirelles é dar a real, despolitizar toda a discussão sobre a arrumação das contas públicas”, afirma um defensor do ministro.
As próximas duas semanas serão decisivas para saber se o que diz Temer está mais no campo das promessas ou do desejo efetivo de tirar o país do atoleiro. Nesse período, já como presidente efetivo, ele terá que destravar a pauta do Congresso, aprovar o projeto de renegociação das dívidas dos estados na Câmara, segurar o aumento dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) no Senado e se desvincular do processo de cassação do deputado Eduardo Cunha. Não é pouco para uma pessoa que, a todo momento, precisa ressaltar sua liderança.
Brasília, 07h10min