Coluna no Correio: Ao governo resta sentar e esperar

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Enquanto os investimentos produtivos não vêm, o governo tentará manter o fôlego da economia por meio do consumo das famílias. Não foi por acaso, portanto, que, ontem, o Palácio do Planalto anunciou, ao mesmo tempo, a liberação do PIS e do Pasep para idosos e a redução das taxas de juros do crédito consignado para servidores e aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Passado o impacto dos saques de contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) — as vendas do comércio começaram a ratear —, era preciso manter algum estímulo à demanda, mesmo que num grau bem menor. O PIS e o Pasep devem injetar R$ 15,9 bilhões no mercado; e a queda dos juros, permitir uma economia de pelo menos R$ 5 bilhões com as parcelas dos empréstimos, recursos que tendem a migrar para o consumo.

O governo acredita que, com a demanda das famílias crescendo, em algum momento, o empresariado destravará os investimentos. O problema tem sido a crise política, que não dá trégua. Os donos de empresas admitem que o potencial de crescimento do consumo é significativo, que os trabalhadores conseguiram reduzir o nível de endividamento, porém, quando olham para a frente, veem incertezas vindo de Brasília. O risco de haver retrocessos no país é real ante o quadro totalmente indefinido para as eleições presidenciais. O medo de perder dinheiro inibe investimentos.

Apesar de todo o temor do empresariado, o governo acredita que as resistências estão começando a cair e, já no fim do ano, os investimentos começarão a puxar o Produto Interno Bruto (PIB). Essa visão é defendida, principalmente, pelo Banco Central, que vê a forte queda da inflação e o tombo dos juros como instrumento importante para incrementar a renda disponível das famílias.

O Planalto reconhece, contudo, que essa percepção de melhora do poder de compra precisa chegar à população. Por ironia, é na economia que está a maior desaprovação do presidente Michel Temer. Pela pesquisa realizada pelo Ibope a pedido da Confederação Nacional da Indústria (CNI), 90% das pessoas consultadas desaprovam o nível de impostos do país, 87% condenam os juros altos e 85% consideram ineficazes as medidas de combate ao desemprego.

Longe do populismo

Economista-chefe da consultoria Parallaxis, Rafael Leão ressalta que, sem as medidas de incentivo dadas ao consumo pelo governo, certamente o resultado da economia neste ano e no próximo seria muito ruim. Até a divulgação do PIB do segundo trimestre, quando se observou o efeito positivo da liberação do FGTS, ele estimava avanço de 0,5% da atividade, com viés negativo. Ou seja, o número final poderia ser pior. Agora, acredita que, se houver mudanças nas projeções, será para melhor, certamente para um resultado mais próximo de 1%.

“O governo vem seguindo o que dizem os livros de economia. Está criando a expectativa de consumo para estimular os empresários a retomarem os investimentos. O impacto da liberação das contas inativas do FGTS na atividade foi de 0,6 ponto percentual. O do PIS/ Pasep deve ficar em 0,2 ponto”, afirma Leão. Para ele, o importante é que, desta vez, os incentivos estão sendo dados de forma moderada, sem populismo. “As condições são mais favoráveis. Juros e inflação caíram muito, permitindo a melhora da renda”, explica. Não é só. As famílias conseguiram reduzir bastante o nível de endividamento, processo que ainda está em andamento entre as empresas, o que também segura a ampliação dos negócios.

Leão prevê que, como a economia ainda crescerá abaixo de seu potencial, devido ao estrago provocado pela recessão que durou dois anos e tirou quase 8% das riquezas produzidas pelo país, a inflação permanecerá abaixo do centro da meta, de 4,5%, por um bom período e a taxa básica (Selic) será mantida em níveis nunca antes vistos no Brasil. “Caminhamos, estruturalmente, para juros mais baixos. Vamos assistir a uma revolução monetária”, acrescenta. Nesse contexto, o economista crê que o incremento do PIB em 2018 poderá ser superior aos 2,2% que ele estima atualmente.

Mesmo com os bons resultados da economia ainda não aparecendo na avaliação de Temer, o governo acredita que os indicadores positivos têm sido fundamentais para manter a população longe das ruas. Num quadro de inflação descontrolada, juros nas alturas e desemprego em alta (a taxa vem baixando gradualmente), certamente o clima seria outro. Dilma Rousseff pagou caro justamente porque atingiu a parte mais sensível do ser humano, o bolso.

Brasília, 06h20min

Vicente Nunes