O governo reforçou o discurso junto aos investidores de que o tsunami provocado pelos pedidos de abertura de inquérito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF), tendo como base as delações da Odebrecht, não vai atrapalhar o andamento das reformas trabalhista e da Previdência Social. O presidente Michel Temer reconhece que as denúncias envolvendo ao menos seis de seus ministros e uma penca de parlamentares da base aliada dão munição aos que saíram às ruas ontem para gritar contra as reformas. Garante, porém, que o compromisso com as mudanças está sólido e o que o Palácio do Planalto tem argumentos consistentes para superar as resistências que imperam dentro dos partidos que dão sustentação ao governo.
Esse discurso de Temer não foi difundido por acaso. Desde que a Procuradoria-Geral da República anunciou que a lista de Janot seria encaminhada ao STF, criou-se uma comoção entre os agentes econômicos. Boa parte deles passou a questionar a capacidade do governo de levar adiante as reformas, estando o núcleo principal do entorno do presidente correndo sério risco de se tornar réu no âmbito da Operação Lava-Jato. Na visão do mercado, se as reformas não forem aprovadas até julho, dificilmente sairão do papel. A demora permitirá que as vozes contrárias se fortaleçam e, temendo a perda de apoio popular nas eleições de 2018, deputados e senadores podem dizer não às mudanças propostas por Temer.
Por mais que os investidores não queiram provocar marola, temendo que o presidente se enfraqueça demais e acabe perdendo as condições de terminar o mandato, a desconfiança entre eles é grande. Tanto que bancos e corretoras reforçaram o número de lobistas que atuam no Congresso para acompanhar o andamento das discussões. Esses profissionais estão passando informações, quase em tempo real, às mesas de operações das instituições financeiras, de forma que ninguém seja surpreendido se uma derrota do Planalto se desenhar no horizonte.
“Apostamos todas as fichas no governo Temer. Não há espaço para um fracasso. Sabemos que a Lava-Jato tem poder para implodir o governo. Mas, antes que isso ocorra, as reformas precisam ser aprovadas. Sem elas, o país voltará para a beira do abismo que se viu na administração de Dilma Rousseff”, destaca um banqueiro. Para ele, o Brasil precisa fazer uma travessia tranquila até o fim de 2018, quando os eleitores escolherão, legitimamente, o próximo governante. “Temer tem que estar preparado para abrir mão de parte de seus ministros no caso de eles virarem réus no Supremo e, sobretudo, fazer as reformas andarem. O país não aguentará um novo período de retrocesso”, acrescenta.
Excitação
A ansiedade dos investidores não se restringe à lista de Janot. Há uma enorme excitação em torno da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em relação ao processo que investiga abuso de poder econômico da chapa Dilma-Temer nas eleições de 2014. Quem acompanha o assunto de perto garante que o ministro Herman Benjamin, relator do caso, está perto de levar seu parecer para votação em plenário. Por mais que haja um movimento dentro do tribunal para garantir a permanência de Temer no poder, separando, por exemplo, as contas de campanha, um resultado desfavorável ao governo está no radar do mercado. “Não podemos descartar uma derrota de Temer”, ressalta um executivo de um banco estrangeiro.
Na equipe econômica, o sinal de alerta também foi ligado. Para os técnicos, se o governo enfraquecer o discurso agora, em meio à turbulência provocada pela lista de Janot e pelas delações da Odebrecht, perderá o rumo das reformas. “Não podemos recuar um milímetro sequer no nosso discurso. Se o governo abrir brechas para que se mexa nos projetos de reforma que estão no Congresso, todos os ganhos que estão projetados serão reduzidos ou mesmo zerados”, ressalta um dos técnicos. “Infelizmente, as denúncias da PGR ao Supremo aumentaram os obstáculos para as reformas. Não que a lista de Janot seja ruim. O problema é ter tanta gente do governo entre os denunciados”, ressalta.
O governo reconhece que as próximas semanas serão de muita tensão. A torcida, a fim de tentar amenizar o horizonte, é para que a economia contribua com boas notícias. O Planalto estima que a inflação de março fique próxima de 0,2%. Com isso, independentemente da crise política, o Banco Central se sentirá mais confortável para acelerar o corte da taxa básica de juros (Selic). A aposta é de que a redução seja de pelo menos um ponto percentual, para 11,25% ao ano. “Estamos contando, também, que os indicadores de atividade mostrem que a economia saiu da recessão. Precisamos engrossar o discurso de que estamos conseguindo colocar o país nos eixos e que, com as reformas, o crescimento estará garantido”, assinala um dos auxiliares mais próximos de Temer.
Na ânsia de tentar sobreviver à Lava-Jato, o governo não pode, no entanto, embarcar em manobras que estão sendo articuladas no Congresso para tentar enfraquecer a Lava-Jato e dar anistia aos políticos que se empanturraram com a corrupção. Será difícil para a sociedade engolir que deputados e senadores tão encrencados com a Justiça e tão desgastados assumam projetos como o que, por exemplo, anistia o caixa dois. O momento requer muito juízo.
Brasília, 06h30min