Bolsonaro ressuscita fase de “parlamentarismo branco” de Dilma

Publicado em Economia

RODOLFO COSTA

Em menos de cinco meses de mandato, o presidente Jair Bolsonaro vive uma fase de “parlamentarismo branco”. O governo perdeu força na comparação do Congresso em um nível que não se observava desde o segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. É a leitura que parlamentares vinham fazendo no Congresso e começou a ganhar força depois das últimas polêmicas e bate cabeça do próprio governo, envolvendo o contingenciamento de recursos da educação e a resistência em mudar a articulação política. 

 

Diferentemente da petista, o clima não é de propor o impeachment de Bolsonaro. Mas o Congresso planeja impulsionar agendas próprias como forma de assumir um amplo protagonismo na comparação ao Executivo. Os congressistas vão reforçar a Bolsonaro a ideia de que ele é mais dependente do Legislativo do que o Parlamento dele. Embora tenha a caneta da Presidência em mãos, ou seja, o poder de tocar políticas públicas, deputados e senadores advertem que a tinta está mais fraca do que quando começou o mandato.

 

A reforma tributária que a Câmara vai discutir, sem a participação da simplificação defendida pela equipe econômica, será a primeira grande modernização que o Legislativo vai propor. Depois, virão esforços concentrados na reforma política. Simultaneamente, será discutida a reforma da Previdência de Bolsonaro. No entanto, sem articulação, o governo não conseguirá aprovar a proposta enviada. No atual momento, será aprovada a matéria que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com apoio do Centrão, quiser.

 

Três “pontes” unem o Palácio do Planalto ao Congresso. Uma delas é trafegada — com divisão — pelo PSL, partido de Bolsonaro. Outra está em meio ao fogo cruzado e em chamas envolvendo o governo e o Centrão, com PP, PRB e PR, além de MDB, DEM e PSD na retaguarda estratégica do conflito. A terceira, uma via marginal que conectava à ponte do PSL, foi implodida na terça-feira pelo próprio presidente da República depois de ele ter prometido suspender o contingenciamento das verbas da educação e voltado atrás.

 

A terceira ponte vinha sendo trafegada por Podemos, PSC, Cidadania, Pros, PV, Novo e Patriota em um corredor que desembocava na mesma via do PSL. Era uma articulação trabalhada pelo líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), para construir uma base de apoio ao governo. Foi aos líderes desses partidos que Bolsonaro se comprometeu a abortar o contingenciamento. Somando o número de deputados dessas legendas ao PSL, o governo poderia contar com um apoio potencial de 107 votos. Ou seja, daria uma sustentação para puxar votos do Centrão, a depender do tema. Deu errado.

 

Estaca zero

O líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO), diz que a articulação construída com o governo voltou à estaca zero. Para os partidos, a manutenção do contingenciamento depois da promessa de suspensão mostra a existência de uma briga interna do governo a qual não interessam aos partidos. “Enquanto não acabar com essa briga, não vai ter base nunca. Na casa onde todo mundo manda falta pão”, alertou o parlamentar ao Blog.

 

A “balbúrdia” do governo reforça a ideia do “parlamentarismo branco”, reconhece Nelto. Sem o apoio do Centrão e com Podemos e outros partidos na posição de independência, aumenta a propensão de protagonismo do Legislativo. “Não podemos deixar o país parado diante dessa confusão. Se o governo não ocupa os espaços, o Congresso vai executar essa função com o protagonismo de direito. Vamos encaminhar a reforma tributária e uma reforma política”, sustentou. A ideia de que a Câmara, por exemplo, terá um destaque maior do que o Executivo, é reforçada pelos ataques de Bolsonaro.

 

Sem fazer menção ao “toma lá da cá”, o presidente da República voltou ao embate com o Congresso. No Twitter, Bolsonaro publicou nesta quinta-feira (16/5) que, se há algo que jamais abrirá mão, são os “princípios fundamentais” que sempre defendeu e com os quais a maioria dos brasileiros sempre se identificou. “O Brasil pediu uma nova forma de se relacionar com os poderes da República e, assim, seguirei, em respeito máximo à população”, sustentou. Para líderes partidários, é um recado claro que manterá a resistência em abrir espaços políticos para os políticos.

 

A estratégia do confronto feita pelo chefe do Executivo federal mantém a coerência pregada pelo presidente. Para o bem dos eleitores e o mal do governo. É uma declaração que só reforça o protagonismo que o Congresso buscará, a ponto de reforçar a tese do “parlamentarismo branco”. “A Dilma tentou fazer a mesma coisa e caiu. Procurar o embate não é a melhor tática política para o governo”, advertiu ao Blog o cientista político Enrico Ribeiro, coordenador legislativo da Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais.