Banco Central revisa previsão para alta do PIB de 2022 para 1,7%

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ROSANA HESSEL

O Banco Central melhorou a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2022, de 1% para 1,7%, conforme dados do Relatório Trimestral de Inflação (RTI) divulgados nesta quinta-feira (30/6), que pioraram as projeções para o Índice de Preços ao Consumidor (IPCA). A estimativa está menos otimista do que as projeções do ministro da Economia, Paulo Guedes, que tem afirmado que o país vai crescer 2% neste ano.

A justificativa para a revisão para cima das previsões para o PIB, apesar da expectativa de desaceleração no segundo semestre, foi a surpresa no resultado do primeiro trimestre, quando o PIB avançou 1%. Além disso, a autoridade monetária informou que ainda há uma expectativa de crescimento no segundo trimestre, devido às medidas de estímulo ao consumo do governo, como os saques do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a antecipação do 13º dos aposentados.

“A surpresa positiva no PIB do primeiro trimestre e a previsão de nova alta no segundo elevam o carregamento estatístico para 2022. A expectativa de crescimento do PIB no segundo trimestre é reforçada por novos estímulos ao consumo das famílias – saque extraordinário do FGTS e antecipação do 13º salário dos aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) – e por perspectiva de avanço da agropecuária e da indústria extrativa, após quedas no início do ano”, destacou o relatório. O RTI destacou também que “algumas atividades econômicas mais atingidas pela pandemia, como serviços prestados às famílias, ainda se encontram em patamares deprimidos, sugerindo existência de algum espaço para novas altas no curto prazo decorrentes do processo de normalização da economia”.

Contudo, o BC reconheceu que há fatores que contribuem para o arrefecimento da atividade no segundo semestre, como o impacto da alta dos juros, iniciada em março de 2021, quando a Selic estava em 2% ao ano — menor patamar da história — e que será sentido na segunda metade do ano com mais intensidade. “Efeitos cumulativos do aperto monetário em curso, que é parte da estratégia de convergência da inflação para o redor da meta no horizonte relevante, devem contribuir para a desaceleração da atividade ao longo dos próximos trimestres. No mercado de crédito bancário já são observadas repercussões desse movimento, como a elevação das taxas de juros na maioria das modalidades do crédito livre e a diminuição da concessão de financiamento imobiliário. Parte da piora das condições financeiras também é reflexo da política monetária doméstica”, ressaltou o documento.

De acordo com o BC reconheceu que o cenário para a inflação segue ainda preocupante, e, por conta disso reforça o comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) da reunião deste mês, quando a taxa básica de juros (Selic) foi elevada de 12,75% para 13,25% e ainda sinalizou nova alta no próximo Copom de agosto em “igual ou menor intensidade”.

O Banco Central atualizou as previsões do mercado para o IPCA, que não estão sendo atualizadas desde maio devido à greve dos servidores. No último boletim Focus, de 2 de maio, as medianas das estimativas para a inflação oficial eram de 7,89%, para 2022, de 4,10%, para 2023, e de 3,20%, em 2024. De acordo com o RTI, as estimativas para o IPCA para 2022, 2023 e 2024, apuradas pela pesquisa Focus, “encontram-se em torno de 8,5%, 4,7% e 3,25%, respectivamente”.

No relatório anterior, a mediana das previsões do mercado para a inflação deste ano estava em 6,4% e no RTI  de junho, o BC reconhece que a previsão atual, de 8,50%, “subiu bastante”, distanciando-se “ainda mais do limite superior do intervalo de tolerância ao redor da meta de inflação, de 5%. “A análise desagregada das projeções dos analistas revela que o aumento das expectativas para o ano corrente foi difundido entre os segmentos, mas com maior relevância dos preços livres, especialmente alimentação no domicílio e bens industriais”, destacou o documento.

O relatório ainda avaliou os riscos dos efeitos econômicos diretos de novas ondas da pandemia de covid-19 no país na nova projeção, “permanecem contidos em um contexto de alta porcentagem de vacinados e de população e empresas mais adaptadas à convivência com o risco sanitária”. Mas admitiu que o risco de piora da pandemia em outros países, já mencionado no RI anterior, continua  expressivo, em especial, na China, onde surtos localizados de covid-19 vem afetando o crescimento e dificultando a normalização das cadeias globais de produção e logística.  “A recorrência de eventos desse tipo por período prolongado, além de contribuir para manutenção de dificuldades na obtenção de insumos para alguns setores da indústria doméstica, pode afetar a demanda chinesa por commodities produzidas no Brasil”, completou o documento.

O BC também reconheceu a expectativa do mercado para o IPCA para o ano de 2023, passando de 3,70% para 4,70%, apresenta “alta relevante desde o relatório anterior”, bastante próxima ao teto da meta, de 4,75%, e, para 2024, “as expectativas se deterioraram na margem, passando de 3,15% para 3,25%, situando-se acima do centro da meta (de 3%)”.

As projeções do Banco Central para a inflação oficial mostraram que, após atingir o pico de 12% no segundo trimestre, o IPCA  terminará o ano de 2022 com alta de 8,8%, passando para 4%, no fim de 2023, e para 2,7%, no último trimestre de 2024. No relatório de março, estavam em 6,3%, 3,4% e 2,3%, respectivamente.

Descumprimento de meta

O principal objetivo do BC é preservar o valor da moeda, cumprindo as metas de inflação determinadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e a autoridade monetária admitiu que não conseguirá cumprir essa meta pelo segundo ano consecutivo. “Em termos de probabilidades estimadas de a inflação ultrapassar os limites do intervalo de tolerância, destaca-se, no cenário de referência, o aumento da probabilidade de a inflação ficar acima do limite superior em 2022, que passou de 88% no Relatório anterior para próximo de 100%”, destacou o documento. Para 2023, essa probabilidade chegou a 29%. Antes, era de 12%.

Em 2021, esse objetivo não foi cumprido, pois o IPCA encerrou o ano em 10,06% — bem acima do teto da meta, de 5,25%. Por conta disso, a autoridade monetária precisou enviar uma carta à presidência do Conselho justificando a falha. A perspectiva do mercado é de que, neste ano e no próximo o BC não conseguirá entregar a inflação dentro da meta novamente, ou seja, três anos de descumprimento do objetivo principal da instituição.

No contexto de inflação global bastante pressionada, levando bancos centrais de países desenvolvidos e emergentes a adotarem postura mais contracionista, o BC reconheceu que há também “o risco de desaceleração mais intensa da atividade mundial, o que poderia afetar a economia doméstica já no segundo semestre de 2022”. Por outro lado, também acrescentou que “a redução de pressões inflacionárias no mundo contribuiria para um processo mais célere de convergência da inflação à meta no Brasil”.

Vicente Nunes