O tempo do BC

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O Banco Central não vai se comprometer com qualquer posição em relação aos rumos da taxa básica de juros (Selic). A diretoria da instituição está incomodada com as pressões que vêm pipocando entre os agentes econômicos, e mesmo entre gente graúda do governo, de que deve acelerar o passo no alívio monetário, que começou no mês passado, com a Selic caindo 0,25 ponto percentual, para 14% ao ano. O BC ressalta que as decisões sobre os juros são tomadas de forma racional, sempre calcadas em evidências sólidas, ainda que baseadas em valores subjetivos.

O BC decidiu reforçar essa posição diante dos questionamentos feitos nos últimos dois dias em encontros de três de seus diretores — Carlos Viana (Política Econômica), Tiago Berriel (Assuntos Internacionais) e Reinaldo Le Grazie (Política Monetária) — com analistas de mercados. Em vários momentos, houve cobranças sobre a comunicação do banco, considerada confusa, abrindo margens para especulações que só prejudicam a condução da política monetária.

Na visão dos especialistas, o BC tem permitido que se formem apostas de que, na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) no fim deste mês, a Selic pode cair 0,75 ponto ou até um ponto, o que seria uma mudança radical diante da postura cautelosa que resultou em um corte mínimo dos juros em outubro. Para a diretoria do BC, esse tipo de ruído é estimulado por informações ou opiniões atribuídas a membros do Copom ou a “técnicos” do banco, que não fazem parte da comunicação oficial da instituição.

É importante ressaltar, porém, que essa comunicação paralela foi criada pelo próprio BC, ao longo dos últimos anos. Instituiu-se a cultura dentro da instituição de se passar informações por meio de alguns agentes, sempre com a justificativa de que se tratava de conversas de background, ou seja, apenas com o intuito de esclarecer dúvidas sobre temas tratados pelo banco. Esses agentes passaram a ser acompanhados de perto pelos investidores, certos de que os recados ocultos dados por integrantes da autoridade monetária renderiam bons ganhos.

A diretoria comandada por Ilan Goldfajn não quer repetir esse sistema, temendo incorrer nos mesmos erros que levaram ao descrédito da política monetária nos últimos anos. As desconfianças em relação ao BC foram preponderantes para que a inflação ganhasse fôlego e se distanciasse do centro da meta, de 4,5%, até atingir, no ano passado, quase 11%. Para os atuais diretores da instituição, credibilidade é tudo. E isso passa por uma política de comunicação transparente, sem privilégios. Tomara que isso não fique só no discurso reforçado por meio de notas oficiais.

Conservadorismo

Pelo discurso adotado pelo BC, é preciso que se solidifique nos mercados a percepção de que a política de juros está inserida em um contexto maior, de recuperação de uma economia que está há dois anos mergulhada em uma gravíssima recessão. Para a instituição, é preciso acabar com o “curtoprazismo” que sempre imperou no país e pavimentar um caminho que permita a redução da Selic de forma consistente. Quanto mais conservador for o Copom agora, mais longe se chegará, quer dizer, mais a taxa básica poderá ceder. Portanto, é preciso paciência.

Nas últimas semanas, o mercado se animou com a perspectiva de cortes mais agressivos da Selic. E passou a pressionar para que isso se torne realidade nos próximos meses. O BC, contudo, não quer errar. Não quer, por exemplo, levar os juros para 7% ou 7,5%, como fez o ex-presidente da instituição Alexandre Tombini, e, depois, ter que dar um choque na política monetária, dobrando a taxa sem que isso resulte no controle da inflação.

Para o atual comando do BC, seria desastroso a Selic cair rápido demais e, no meio do caminho, a instituição se colocar em uma sinuca de bico, restando apenas inverter os passos da política monetária sem a garantia de sucesso. A frequência e a magnitude da queda dos juros, no entender do BC, serão definidas de acordo com as circunstâncias da economia. É preciso lembrar que há muitas incertezas no país, especialmente, na área fiscal e no mundo.

O importante para o BC é que os ganhos obtidos com uma política monetária consistente se propaguem pela economia, que ainda levará um longo período para sair do atoleiro em que se encontra. Os juros vão, sim, cair. Mas não na pressa de muitos agentes econômicos e de integrantes do governo. Depois de tudo de ruim que se viu nos últimos anos, o BC perdeu o direito de errar. E Ilan e seu time sabem muito bem disso.

Brasília,11h30min

Vicente Nunes