Por LUIZ RECENA GRASSI, de Portugal
Os navios graneleiros voltam a singrar carregados de trigo, milho e outros grãos pelos mares gelados da gloriosa, icônica Odesssa. Todos aplaudem, das Nações Unidas aos Estados Unidos, da Europa a África. Até o pouco humorado Zelenski saudou o primeiro navio, embora gritasse a seus aliados que mantivessem um pé atrás, para evitar surpresas.
Não fosse ele um ucraniano, sempre desconfiado. Ele tem duas razões, porém: os russos, que não brincam em serviço e que podem sempre dar um tapa de gato; e o volume do material estocado, estimado em 25 milhões de toneladas. Assim, navegar pelo mar Negro e chegar ao estreito de Bósforo, vai exigir todos os cuidados e mais um pouco.
Os grão subirão por uma das margens e o dólares descerão pela outra. O russos já sinalizaram que, além da comissão de intermediação da Turquia, venderão seu trigo aos turco a preços mais baixo do que os de mercado. E, consta mas ninguém entrega, deixarão seus dólares por um tempo em Ankara. Para não sofrerem ataques especulativos baixando o cotação de suas divisa e aumentando assim o custo de suas dívidas internacionais.
Os analistas daqui e daí oscilam entre a tolice e a ingenuidade. Acham que com o default anunciado no passado, a Rússia quebrou. Esquecem das alianças do Kremlim com judeus, turcos, alemães, árabes e outros que estão para ajudar. Todo mundo gosta de um juro, “brimo”. Posição reforçada com o fato confirmado sobre o monte de dinheiro da Rússia depositado como garantia em bancos europeus ou em paraísos fiscais da Europa ou Caribe.
Zelenski vai avisar a seus amigos que os dólares começaram a entrar e poderá pagar alguma coisa pelas novas armas que irão chegar. As moscas vão correr logo. Europa na frente, EUA depois e a OTAN, nada vendem e nada compram sempre por ali, a cobrar algum tipo de vantagem por novas proteções.
O presidente ucraniano vai manter-se com um olho nos navios e outro na guerra, mesmo que seja um choramingas perdedor. Ganhou uma batalha, ainda que tenha contado com o protagonismo da senhora Zelionska. Ganhou, sem qualquer dúvida, a batalha do Desfiladeiro da Revista Vogue.
O Correio sabe, porque viu
Estava lá. A relação dos russos e soviéticos com moedas fortes, notadamente o dólar, sempre foi tensa. Houve momentos que ter moeda forte em casa dava cadeia. Quando cheguei a Moscou, tudo estava mais relaxado, e o dólar valia quatro rublos no paralelo. Alguns meses depois tinha dobrado e triplicado. Em seguida subiu em flecha, e os russos não deixavam de comprar a moeda dos Estado Unidos.
Há casos exemplares, a primeira classe da Aeroflot, Moscou-Paris, a US$ 200, com direito a caviar preto e champanha russa. Foi um bom tempo, enquanto durou. Espertos, os russos passaram para dólar as transações com estrangeiros. Mesmo conhecendo o peixe, o grande chef Fernando Delamare confessou que ainda não tinha feito nada com o esturjão.
O dólar arrombava portas, e um conhecido conseguiu-me três exemplares do peixe ainda jovem. Tínhamos um pequeno estoque de caviar preto, mais velho, quase seco. O Chef não se apertou, desmanchou o caviar em creme, misturou com algumas latinhas, as mais frescas, e o resultado, dos deuses, foi um esturjão soterrado de caviar preto. Um ágape. Slava Nando!