O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou hoje o Produto Interno Bruto (PIB) de 2016, e o resultado não poderia ser mais dramático. A economia encolheu 3,6%, o segundo ano seguido de contração, fato sem precedentes em quase um século. Para os especialistas, porém, apesar de muito ruim, esse dado é passado. O que todos estão se perguntando é qual será o ritmo de retomada da atividade. As projeções apontam para incremento de 0,5% em 2017 e de 2,4% em 2018. Ainda que esses números deem um certo alívio, as incertezas são muitas, sobretudo na seara política.
Os investidores reconhecem que as delações premiadas da Odebrecht têm poder de sobra para fazer um grande estrago no governo. Não à toa, é latente a tensão em relação à lista dos políticos que serão denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PRG) ao Supremo Tribunal Federal (STF) e que poderão ser alvos de inquéritos caso o ministro Edson Fachin aceite os argumentos de Rodrigo Janot. A expectativa é de que ao menos 30 políticos dos 170 listados pela Odebrecht como beneficiários de propinas oriundas de contratos com a Petrobras estejam no radar do procurador-geral.
O que conforta os investidores é a lentidão do STF para tomar decisões. A demora, acreditam os donos do dinheiro, dará uma importante margem de manobra ao governo de Michel Temer para levar adiante a promessa de aprovar, ainda no primeiro semestre do ano, as reformas da Previdência e trabalhista. Desde março de 2015, ou seja, há exatos dois anos, dos 47 políticos denunciados pela PGR ao Supremo, apenas quatro viraram réus: a senadora Gleisi Hoffmann, os deputados Aníbal Gomes e Nelson Meurer e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que perdeu o foro privilegiado e está preso em Curitiba.
“Nunca se torceu tanto, no mercado, para que o STF seja moroso em suas decisões. O governo vai balançar com a nova lista de Janot, mas a nossa crença é de que o presidente conseguirá manter sua força no Congresso”, diz um operador de um banco estrangeiro. Para ele, é essencial que Temer entregue as reformas rapidamente, especialmente a da Previdência, para que se tenha a certeza de que o ajuste das contas públicas será para valer. “Até agora, temos um conjunto de boas intenções. O limite de teto para os gastos é importante, mas só terá efeito se houver mudanças na Previdência”, acrescenta.
Blindagem
A despeito das enormes preocupações em relação ao governo, o mercado financeiro decidiu blindar Temer. Os analistas acreditam que somente uma administração transitória, sem votos, será capaz de aprovar no Congresso medidas tão impopulares quanto as reformas trabalhista e previdenciária. “Mesmo tendo pouco apoio da população, Temer tem muita força no Legislativo. E é isso o que importa. Tivemos presidentes superpopulares, mas que não conseguiram avançar com as reformas. Por isso, o mercado está dando um voto de confiança ao atual governo, independentemente dos rumos da Lava-Jato”, ressalta o mesmo operador.
Os investidores têm a exata noção de que Temer terá de entregar alguns de seus mais fiéis aliados, como o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, pego com tudo pela Lava-Jato, mas chegará de pé em 2018, quando, efetivamente, a economia dará sinais mais claros de retomada do crescimento. “Os próximos quatro meses serão decisivos para o governo. Se conseguir aprovar as reformas, terá todo o apoio dos agentes econômicos para levar o país adiante. Contudo, passado esse prazo sem vitórias no Congresso, será difícil acalmar os ânimos. A crise voltará com tudo”, enfatiza um executivo de um grande banco brasileiro. “Não vamos, porém, pensar no pior agora. É preciso manter sangue-frio”, emenda.
O mercado está tão fixado na aprovação das reformas que não consegue enxergar mais adiante do ponto de vista político. Dada à confusão geral que se tem no país, seria normal que já se especulasse sobre as eleições de 2018 e sobre qual política econômica vigorará após a posse do futuro presidente da República. Mas, como afirma a economista-chefe da CM Capital, Camila Abdelmalack, os tempos não são de normalidade. “Vivemos um quadro de muita incerteza, que requer o máximo de cautela, inclusive nas projeções para a economia. A variável política não é mensurável”, destaca.
Nas mãos do Congresso
Para Camila, uma coisa é certa: a economia andará muito devagar. Nem mesmo a aceleração dos cortes da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central será suficiente para reanimar a atividade para o nível desejado. Ela afirma que o mercado de trabalho está muito debilitado, minando uma das principais alavancas do crescimento: o consumo das famílias. As empresas, acrescenta a economista, não estão apenas demitindo. Estão fechando as portas. Isso significa dizer que, mesmo que a atividade reaja, haverá menos empregadores para absorver a massa de 13 milhões de desocupados.
Pelos cálculos da economista da CM Capital, o PIB subirá 0,5% neste ano e 1,5% em 2018. É muito pouco para um país que, apenas nos dois últimos anos, encolheu mais de 7%. A severa recessão fez com que o PIB voltasse aos níveis de 2012. “A queda dos juros é ótima, assim como a inflação convergindo para o centro da meta, de 4,5%. Mas não dá para acreditar que a economia crescerá rapidamente”, diz. Na avaliação dela, os nós só começarão a ser desatados de verdade quando o Congresso, altamente rejeitado pela população, aprovar as reformas. É o Legislativo, e não o governo, que dará o tom da recuperação da atividade daqui por diante.
Brasília, 09h30min