Nelson Barbosa foi reprovado em seu primeiro contato com os investidores não pelo que disse, mas pelo que representa. O ministro da Fazenda usou um tom firme para responder às dúvidas do mercado, mas não convenceu. E a desconfiança em relação a ele só aumentou depois que o líder do governo na Câmara, José Guimarães, avisou que o ajuste não é mais prioridade máxima e o que o Brasil realmente precisa é de mais Estado e menos de mercado. Foi exatamente a receita que prevaleceu no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff e que levou o Brasil para o buraco.
Entre o discurso de Barbosa e a realidade do país, sobretudo o tempo político, há uma distância enorme. Para cumprir a meta de superavit primário de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016, ele reforçou que conta com a aprovação da CPMF até maio. Não há como isso acontecer. Primeiro, porque os dois principais partidos da base aliada do governo — se é que se pode dizer isso —, o PT e o PMDB, já deixaram claro que não aprovarão o tributo. Segundo, porque, pelo menos até março, tanto o governo quanto o Congresso estarão completamente envolvidos na discussão sobre o impeachment de Dilma.
Nesse período, Barbosa promete apresentar o projeto de reforma da Previdência Social, responsável por 47% dos gastos obrigatórios do governo. Não há como, em sã consciência, acreditar que um Congresso esfacelado, às vésperas de uma eleição municipal, aprove medidas tão impopulares como a definição de idade mínima para a aposentadoria. Esse debate vem sendo travado há anos, e nem os governos mais populares conseguiram levar a discussão adiante. Não será agora que isso acontecerá. A percepção é de que o ministro da Fazenda crê que o governo conta hoje com o apoio de pelo menos 400 deputados, quando se esforça para garantir os 171 necessários para derrubar o processo de impeachment.
Mais incentivos
Não se pode esquecer que o primeiro trimestre de 2016 será terrível para a economia. Esperam-se demissões em massa e forte queda na renda dos trabalhadores, o que estimulará uma onda de manifestações nas ruas. Nesse ambiente, ficará difícil para Barbosa insistir no discurso que derrubou Joaquim Levy e ainda pregar mudanças em benefícios previdenciários,mesmo que a reforma do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) seja imprescindível. Há também questionamentos sobre como se comportarão as centrais sindicais, que vêm defendendo Dilma sob a condição de uma política fiscal mais frouxa e de mais incentivos a setores específicos como forma de estimular o crescimento.
Na cabeça dos investidores, nada fecha no discurso de Barbosa. Muitos dizem que, se fosse para continuar fazendo o mesmo que Levy, não haveria necessidade de haver troca no comando da Fazenda. Por isso, esperam, sim, mudanças na condução da política. E mais: desde o início do segundo mandato de Dilma, o que mais Barbosa fez, como ministro do Planejamento, foi bombardear as propostas que, agora, ele defende. Não há como assegurar que, como num passe de mágica, ele se convenceu de que tudo o que era contra é o que deve ser feito daqui por diante.
Enquanto Barbosa não conseguir convencer que não fará loucuras à frente da Fazenda, o país vai afundar na desconfiança. O crescimento que o governo quer buscar a qualquer custo ficará mais distante. O Brasil não comporta mais experimentos. Já pagou caro pelas políticas defendidas pelo atual ministro no passado. O tombo que se está vendo na atividade é impressionante. A demanda interna deve cair, somente neste ano, mais de 7%. E vai encolher mais em 2016. Os reflexos dessa contração serão sentidos muitos anos à frente.
Ajuste temporário
Sem notícias boas para dar, Barbosa e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, se apegaram à expressiva queda do deficit externo neste ano, de quase 40%, para reforçar o discurso de que os ajustes da economia estão em andamento. Só se esquecem de dizer que tudo se deve à maior recessão em quase quatro décadas. A melhora substancial da balança comercial não está se dando pelo aumento das exportações, mas pelo tombo das importações, uma vez que a demanda interna encolheu.
O ajuste das contas externas, portanto, é temporário. À medida que a economia for recuperando as forças, o rombo nas transações correntes voltará a crescer. Além de não haver perspectiva de avanço na venda de produtos manufaturados e de maior valor agregado, mesmo com o real mais desvalorizado, o país terá de conviver com um longo período de baixa dos preços das commodities, que dominam a nossa pauta de exportação. É bom ir se preparando para a realidade.
Avião ainda na turbulência
» Presidente do Conselho de Administração do BTG Pactual, Pérsio Arida diz que está trabalhando para “estabilizar o avião”, numa referência à forte turbulência que abateu o banco fundado por André Esteves, que foi preso por tentar obstruir investigações da Operação Lava-Jato.
Chá de cadeira em banqueiros
» O presidente do Itaú Unibanco, Roberto Setúbal, e o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal, levaram um chá de cadeira para entrar no Palácio do Planalto. Quando chegaram para a posse de Nelson Barbosa na Fazenda, a lista de convidados ainda não estava na portaria.
Brasília, 08h30min