“Foi uma nova exceção, que não tem previsão na Constituição. O tratamento é diferente do que é dado aos servidores que possuem regime próprio. O que gera a “vacância no cargo” é a inativação e não a exoneração, mas não encerra a relação jurídica do servidor com o órgão público. É exatamente o que ocorre com os militares que passam da ativa para a reserva, o que preserva alguns direitos e deveres”
Eduardo Koetz*
No dia 18/06/2021, pela primeira vez na história pós constituição de 1988, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou em sede de repercussão geral a permissão para prefeitos exonerarem servidores que não cometeram falta grave ou tenham tido o direito de se defender em processo administrativo disciplinar
A possibilidade de exonerar servidores para além do previsto no Art. 41 da Constituição foi aberta para os prefeitos de mais de 3.000 municípios brasileiros que não possuem regime próprio de previdência, e que seus servidores concursados e estatutários tenham se aposentado pelo Instituto Nacional de Previdência Social (INSS).
Nos últimos 10 anos, as prefeituras começaram a exonerar os servidores após receberem do INSS a confirmação da aposentadoria destes servidores. Fizeram isso à margem do direito constitucional do concurso público que exige o processo disciplinar e a ampla defesa e restringe a exoneração para casos de falta grave ou péssimo desempenho funcional.
Foi uma nova exceção, que não tem previsão na Constituição.
O tratamento é diferente do que é dado aos servidores que possuem regime próprio. De fato, o caminho normal que o servidor aposentado segue é o da inativação no próprio cargo. Ao se aposentar, o servidor público concursado torna o seu status funcional com o órgão empregador como “inativo”, e passa a ser vinculado ao CNPJ do regime de previdência.
O que gera a “vacância no cargo” é a inativação e não a exoneração, mas não encerra a relação jurídica do servidor com o órgão público.
É exatamente o que ocorre com os militares que passam da ativa para a reserva, o que preserva alguns direitos e deveres.
No caso dos servidores que possuem RPPS, a inativação mantém direitos secundários que eventualmente estejam garantidos na legislação municipal, estadual ou federal, como o vínculo aos fundos de saúde por exemplo.
No caso do tema 1.150, o que se esperava é que, no mínimo, o STF mantivesse o mesmo direito aos aposentados pelo INSS, de serem inativados no cargo, respeitando o princípio constitucional da isonomia.
O STF alterou radicalmente sua posição há cerca de um ano, pois antes era determinada a reintegração por 10 dos 11 ministros conforme estudo de nossa autoria (https://koetzadvocacia.com.br/decisoes-favoraveis-reintegracao-de-servidor-publico-estatutario/)
Porém, esta situação mudou com a pressão dos municípios em relação ao impacto econômico da matéria.
Solução que mantém direitos constitucionais e não gera impacto econômico aos municípios
O recurso apresentado pelo escritório Koetz Advocacia apresenta uma solução jurídica que atende ao menor impacto econômico demandado pelos prefeitos, mas ao mesmo tempo mantém coerência constitucional e não abre brecha para exonerações não previstas na constituição.
A proposta de resolução para a matéria vai no sentido de determinar que a aposentadoria pelo INSS implique na mesma consequência que para servidores que possuem o RPPS, ou seja, na inativação do servidor.
A opção pela inativação é uma decisão que tem zero impacto econômico, mas que respeita o art. 41 da CF, o princípio da igualdade e a legislação municipal, sem ferir direitos secundários dos servidores.
As situações do art. 41 da Constituição que permitem exoneração até o julgamento do tema 1150 eram taxativas, ou seja, não permitiam exceções.
Ao abrir uma exceção, o STF tornou o art. 41 exemplificativo e permitiu aos governantes exonerarem por motivos além dos citados no referido art. 41 da CF.
Com essa porta aberta, será difícil evitar que exonerações pelos motivos mais diversos se disseminem pelo país.
O escritório vai embargar o acordão e devolver ao STF a possibilidade de retificar a decisão, mas no momento acreditamos ser algo extremamente difícil, pois os servidores públicos municipais são carentes de representatividade para lutar junto ao Supremo.
Entretanto, estamos buscando apoio de entidades de servidores federais para obter o direito à efetividade da nossa tese, já que abrir a brecha para os prefeitos, governadores e o presidente demitirem servidores sem justificativa é algo indesejado por todas as categorias.
Mais insegurança jurídica
Estima-se que mais de 20 mil processos no Brasil tratam da matéria, com muitos já julgados a favor da reintegração dos servidores.
Entretanto, há mais de 100 mil servidores públicos municipais afetados pela decisão que poderão recorrer ao Judiciário.
A decisão tomada no processo não especifica o que acontecerá com estes servidores, o que irá gerar insegurança jurídica.
Além do mais, a grande maioria dos municípios no Brasil optaram por manter o servidor na ativa, por entender que não existe previsão para exoneração.
* Eduardo Koetz – Especialista em direito previdenciário e tributário, sócio da Koetz Advocacia.
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