O Orçamento da União, apresentado ontem, foi considerado por muitos como “uma peça de ficção”. Agora, a briga por correção salarial vai ser ferrenha no Congresso, onde a discussão se dará para valer por cerca de quatro meses. Servidores estão otimistas e avaliam que sairão vencedores na queda de braço com o governo
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA 2022) apresentado ontem ao Congresso Nacional frustrou as expectativas de servidores e contrariou a promessa do presidente Jair Bolsonaro, de aumento de 5% para os servidores federais no ano que vem.
Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate), destaca que “não é possível garantir que a correção dos salários não seja feita”. O ano de 2021 é “a única janela” para tal. “Porque 2022 é ano de eleição, não se pode aumentar despesa; em 2023, o eleito pode autorizar a correção, mas para 2024. Portanto, o reajuste tem que ser dado agora, principalmente diante da insistente alta da inflação que corrói o poder de compra. Acho que Bolsonaro não vai querer ser taxado de presidente que não deu aumento em quatro anos de gestão, nesse período eleitoral”, disse Marques.
Segundo especialistas, vai ser difícil conter os ânimos dos servidores e convencer os parlamentares de que eles são os responsáveis pelo desequilíbrio das contas públicas, se os civis nada ganharam, enquanto os militares terão reajustes anuais, até 2023, nos percentuais do Adicional de Habilitação, que serão incorporados aos soldos. Este índice vai variar de 12% a 73%, conforme a formação acadêmica.
Até mesmo na PEC Emergencial, desenhada para combater os efeitos da pandemia, o relator, senador Marcio Bittar (MDB-AC), blindou a caserna, livrando os militares dos gatilhos de contenção de despesas. Ele fez alterações que, à época, beneficiaram os militares das Forças Armadas porque eles tiveram uma reestruturação de carreira, com aumentos salariais, aprovada em dezembro de 2019.
A lei que concedeu os reajustes em remunerações e adicionais entrou em vigor no início de 2022 e se espraia por 2023. O orçamento de 2021, mesmo diante da crise fiscal do país, não mexeu nesse item. Da mesma forma, o ontem apresentado, para 2022.
Esse ano, os militares foram a única categoria contemplada com reajuste, que consumiu R$ 7,1 bilhões dos cofres públicos, enquanto todo o restante do funcionalismo teve o salário congelado. Um general do Exército, por exemplo, que ganhava R$ 24.786,96 brutos, em 2019, emplaca 2023 com R$ 33.947,24.
PLOA 2022
Na peça orçamentária, houve pouca clareza em relação ao funcionalismo. Estão previstas 41.716 vagas por concurso público e mais 13.300 para promoções e progressões. Mas, devido ao alto número de aposentadorias (em 2020, foram mais de 38 mil), ficou a dúvida se esses preenchimentos serão suficientes para manter o quantitativo e a qualidade do atendimento.
O secretário do Tesouro, Bruno Funchal, deixou claro que eventual espaço orçamentário futuro não garante a correção das remunerações. “Não tem previsão de reajuste. O orçamento já está muito apertado. Tendo algum tipo de mudança por conta do precatório, vão ser definidas prioridades no orçamento. Não cabe agora a gente falar nisso”, enfatizou. Ariosto Culau, secretário de Orçamento, contou que os concursos estão detalhados no anexo V do PLOA – ainda não divulgado. “Há a necessidade de recomposição da força de trabalho pelo represamento da realização dos concursos nos últimos três anos”, admitiu Culau.
O economista Gil Castello Branco, especialista em contas públicas da Associação Contas Abertas, ironizou o documento. “O papel aceita tudo. O governo cumpriu o prazo constitucional (31/8), mas encaminhou uma proposta descasada de seus objetivos sociais e políticos. O orçamento definitivo surgirá no Congresso. E a não-previsão de reajustes salariais vai ocasionar forte pressão por parte dos servidores civis, há anos sem aumento. O Congresso, em véspera de ano eleitoral, é sensível às pressões, especialmente dos servidores”, assinalou.
Despesa
O gasto com pessoal previsto para 2022 ficou menor que o de 2021. De acordo com os dados do PLOA 2022, o montante é de R$ 342,798 bilhões, o equivalente a 3,6% do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas do país). O total é inferior ao previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), divulgada no início de agosto, que indicava inicialmente gasto de R$ 346,328 bilhões (3,9% do PIB). E embora o valor nominal seja superior ao do ano passado (R$ 332,355 bilhões) é menor em percentual do PIB (era 3,8%). Para os servidores, em 2022, ainda estão reservados, R$ 13,709 bilhões (0,01% do PIB) para sentenças judiciais.
Do Orçamento total (R$ 1,610 trilhão, acima dos R$ 1,485 trilhão de 2021), de gastos com pessoal e custeio, R$ 1,540 trilhão estarão à disposição do Poder Executivo. Para os demais Poderes, serão R$ 69,704 bilhões, sendo R$ 47,879 bilhões para o Judiciário, R$ 13,909 bilhões, para o Legislativo, R$ 7,310 para o Ministério Público da União e R$ 606 milhões para a Defensoria Pública da União.
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