Excluir direito de policiais civis à greve é premiar quem não cumpre sua parte com a categoria
Fabrício de Oliveira Campos*
O Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu, esta semana, que os policiais civis não têm direito à greve, tal como já ocorre com os policiais militares. O argumento é o de que os policiais civis são agentes responsáveis pela segurança pública e a paz social, direitos fundamentais, que devem ser preservados em favor de todos os cidadãos. Apesar de ser um argumento impressionante, como o é todo argumento que coloque a segurança pública no debate, a decisão do Supremo foi de encontro à própria Constituição e é um prêmio para a negligência e incompetência dos Estados em manter e prestigiar os responsáveis pelo nosso direito à segurança.
A Constituição de 1988 aborda de forma muito clara as categoriais policiais. Os policiais militares são expressamente proibidos de ingressarem em movimentos grevistas. Os policiais civis, assim como os policiais federais, não são alcançados pela proibição. Está escrito e está claro. Essa diferenciação entre as polícias foi obviamente objeto de atenção quando da formulação da Constituição de 1988. A ideia da Constituição é (ou foi…) a de ampliar ao máximo direitos individuais, dentre eles o direito à greve, direito que foi retirado somente das carreiras militares e mais nenhuma outra (o que em si já é questionável, ao menos quanto às polícias militares). O STF ampliou uma proibição que a própria Constituição não quis ampliar.
O direito e os limites à greve já são bem regulamentados. Serviços essenciais não podem ser paralisados integralmente, a exemplo do que ocorre com serviços de saúde ou transporte público. A ilegalidade dessas greves, quando reconhecida, gera pesadas sanções aos respectivos sindicatos e comprometem o ponto dos trabalhadores que abusam do direito.
Essa opção do STF em dizer o que Constituição nunca disse vai culminar por ameaçar justamente o direito que a Corte afirma defender, isto é, acabará colocando o próprio direito à segurança pública em risco. Sem o direito dos policiais civis (e federais) à greve, os Estados (e o Governo Federal) ganham fôlego na manutenção de políticas salariais injustas, ficam mais à vontade com a negligência, com o sucateamento e com o descompromisso com categorias importantíssimas. São premiados com uma parcela menor de responsabilidade, sabendo que o servidor espoliado e ressentido pela falta de estrutura, apesar dos riscos de sua atividade, não pode lançar mão de mecanismos eficientes de protesto.
Por fim, o STF parece privilegiar a ideia de que o servidor insatisfeito deve procurar outra atividade, como se no edital dos concursos estivesse escrito ou nos juramentos estivesse consignado que o Estado pode violar planos de carreira, desprezar a necessidade de reposições salariais, expor os servidores a riscos maiores do que os inerentes à atividade, deixar faltar o essencial para que as missões sejam cumpridas, etc. O Estado tem responsabilidade com a segurança pública na medida em que tem responsabilidade com esses servidores. Excluí-los do direito fundamental à greve é, portanto, premiar quem não cumpre a sua parte para com as categorias policiais.
Fabrício de Oliveira Campos, criminalista, sócio do Oliveira Campos & Giori Advogados
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