O nó da reforma administrativa e o “salve-se quem puder”

Compartilhe

O nó da reforma administrativa está mais perto do presidente da República do que se imagina. A pressão pela estabilidade (fora das carreiras de Estado), segundo técnicos do próprio governo, vem das pastas dos principais apoiadores de Jair Bolsonaro: Ministérios da Economia e da Justiça e Segurança Pública

E não é de hoje. Desde a gestão de Michel Temer, em 2018, quando o extinto Ministério do Planejamento publicou a Portaria 193 – facilita a movimentação de servidores entre órgãos federais para conter novas contratações -, houve gritaria geral, pelo entendimento de que Fisco e Polícia Federal, por exemplo, exigem atividades específicas dos administrativos. Assim, esses administrativos, com apoio dos chefes, querem uma carreira própria para se manter fora do raio das mudanças internas propostas pelo Planalto. Virou um salve-se quem puder.

São provas de que a intenção da equipe econômica de reduzir de 300 para menos de 30 e unir diferentes carreiras, sem respeitar as peculiaridades, não será tarefa fácil. Paulo Guedes e Sérgio Moro, afirmam as fontes, “empurraram o problema com a barriga”. Até agora não entraram em acordo com os subordinados. “Por isso, desde novembro, o discurso oficial é de que o texto será enviado ao Congresso, ‘na semana que vem’. Se não houver convergência, que é o que parece, a papelada não vai tão cedo para o Legislativo. Ou vai pela metade”, dizem. O Ministério da Justiça enviou a última versão da aglutinação das carreiras ao Sindicato dos Administrativos da PF (SinpecPF) no dia 13. A entidade fará assembleia na sexta (21).

O projeto do MJ não tem sequer o apoio da direção da PF. “Em 23 de janeiro, o diretor-geral Maurício Valeixo reiterou o desejo de atribuir formalmente funções de fiscalização e de controle para a categoria, como forma de liberar parte dos policiais para operações e investigações”, explica o SinpecPF. As categorias que participarão do processo, com as do Arquivo Nacional, não têm carreira própria. “Essa realidade fez com que utilizassem o PECPF como parâmetro, propondo com a aglutinação um nivelamento conosco”, destaca a nota. No Ministério da Economia, a queda de braço não é diferente.

O sindicato dos administrativos (SindFazenda) conseguiu criar, na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (Ctasp) o plano especial da carreira de suporte às atividades tributárias e aduaneiras da Receita, com enquadramento em cargos específicos. Na mesma comissão também foi reorganizada em uma única carreira os cargos da área de tecnologia da informação do Executivo Federal. E foi criado o plano especial de cargos de apoio da Advocacia-Geral da União (AGU).

Correria

Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef, representa 80% do funcionalismo), explica que, quando surgem propostas como essa, de reforma administrativa, começa o pânico. “Um salve-se quem puder que não é bom para ninguém. Esse não é o caminho correto, no momento em que todas as categorias são atacadas. O governo tenta dividir o funcionalismo dizendo que alguns estão protegidos. Mas futuramente, vai botar a cabeça de todos na guilhotina. Já vi isso acontecer”, conta Silva. Para Luiz Roberto da Silva, presidente do SindFazenda, não foi à toa que até os ministérios reagiram à junção de carreiras.

“Não dá para trocar uma pessoa da Economia para a saúde. Nossas atribuições são constitucionais. Não existe serviço na Receita que não se acesse dados fiscais e tributários do contribuinte”, afirma. João Luís Rodrigues Nunes, presidente do SinpecPF, ressalta a importância da segurança pública. “Tratamos da imigração, dos aeroportos, fiscalização de empresas, carros-forte, entre outros”, reforça. Algumas das carreiras de Estado também olham a reforma com desconfiança. Os auditores-fiscais federais agropecuários tiveram parte das atribuições terceirizadas e transferidas por contratações temporárias de médicos veterinários.

O Ministério da Agricultura, em 2017, contratou 250 médicos. O contrato expirou no final de 2019 e o órgão pretende renová-lo em 2020. “Os serviços de inspeção de produtos de origem animal têm que ser feito por concursados. É uma questão de segurança alimentar. As carreiras de Estado também correm risco. Vêm sendo indiretamente atingidas pela reforma administrativa”, alerta Mauricio Porto, presidente do sindicato da categoria (Anffa). “O ataque vem de outra forma, mas é igualmente perigoso”, finalizou.

Vera Batista

Publica por
Vera Batista
Tags: administrativos carreira carreiras de estado Congresso contratações equipe econômica estabilidade governo Legislativo Ministério da Economia Ministério da Justiça Paulo Guedes peculiaridades Planalto presidente da República pressão reforma administrativa Sérgio Moro técnicos

Posts recentes

  • Servidor

Reforma administrativa: especialistas e entidades debatem impactos no serviço público

Por Raphaela Peixoto — Enquanto o país celebra, nesta terça-feira (28/10), o Dia do Servidor…

1 mês atrás
  • premiação
  • Sem categoria
  • Serviço público
  • Servidor

Prêmio Espírito Público: votação popular começa na sexta-feira (10/10)

Entre os 14 finalistas estão o Programa Pé-de-Meia e o Concurso Público Nacional Unificado (CPNU). Premiação…

2 meses atrás
  • Sem categoria
  • Serviço público
  • Servidor

Governo federal lança pacote de medidas para fortalecer uso de dados e IA no setor público

Iniciativas foram apresentadas na Semana da Inovação 2025 e visam aprimorar a entrega de serviços…

2 meses atrás
  • enap
  • evento
  • Sem categoria
  • Semana de Inovação 2025
  • Servidor

Semana de Inovação 2025: mais de 80% das vagas presenciais foram preenchidas

Entre os destaques das atividades presenciais está a simulação de uma negociação da COP30, que…

3 meses atrás
  • Sem categoria
  • Serviço público
  • Servidor
  • Servidores públicos

Primeira indígena do TRF da 5ª Região toma posse

Nas redes sociais, Iamma comemorou a posse com uma mensagem de gratidão e consciência do…

4 meses atrás
  • Segurança Pública
  • Sem categoria
  • Serviço público
  • Servidores públicos

PMDF publica resultado de seleção para Prestação de Tarefa por Tempo Certo

Seleção visava o preenchimento de 85 vagas. O edital de abertura foi publicado em 2…

4 meses atrás