sol_caua Crédito: Fábio Rocha/ TV Globo

Um lugar ao sol vem para atualizar o folhetinesco

Publicado em Novela

Um lugar ao sol marca a estreia da autora Lícia Manzo no horário nobre, traz Cauã Reymond em dose dupla e ainda encerra ciclo de reprises às 21h

A partir de segunda-feira (8/11), a autora Lícia Manzo será alçada ao seleto grupo de escritores de novela das 21h. Depois do sucesso das ótimas A vida da gente (2012) e Sete vidas (2015), ambas às 18h, Um lugar ao sol estreia carregada de expectativas. Além da autoria, a novela marca a volta das tramas inéditas ao horário — desde 2020, foram três reprises, além do desfecho de Amor de mãe. Ainda tem o regresso de Cauã Reymond às novelas, gênero do qual está afastado desde o Juliano de A regra do jogo (2015). E agora ele virá em dose dupla, dando vida aos gêmeos Renato e Christian.

Lícia Manzo busca no folhetim mais do que rasgado a trama de gêmeos separados ao nascer que não se conhecem e levam vidas completamente diferentes. Christian vive no abrigo, de onde é obrigado a sair aos 18 anos, tendo poucas oportunidades de crescimento na vida. Renato foi adotado por uma família rica, estudou em colégios de qualidade e desfruta de uma boa vida. Quando se conhecem, Renato é assassinado numa emboscada armada para Christian. Como poucas pessoas do ciclo de Renato sabem que ele existe, Christian toma o lugar do irmão e, a partir daí, assume a identidade de Renato.

Lícia garante que param aí os traços folhetinescos de Um lugar ao sol. “Acredito no modo de contar a história. A autora vem primeiro. Eu vou contar do meu jeito. O que está em jogo, para mim, não é o fato de um gêmeo estar no lugar do outro; é a repercussão interna que isso traz para ele. É a repercussão social. O subjetivo. Qual será o prejuízo emocional de abrir mão de sonhos por causa da realidade, como Christian foi levado a fazer?”, afirma a autora, em entrevista coletiva de lançamento da novela.

O diretor Maurício Farias completa: “Lícia foi buscar a tragédia dentro do folhetim, e as consequências dessa tragédia no destino. Ela usa o folhetim para entregar uma trama completamente contemporânea”. Diretor de seriados como A grande família e Tapas e beijos, Maurício não comandava o set de uma novela desde Esplendor (2000).

Foto: João Cotta/ TV Globo. Lícia Manzo busca no folhetim clássico elementos para Um lugar ao sol

A chegada à badalada novela das 21h não assusta Lícia. A autora garante que a pressão não aumentou e que nunca se sentiu sem liberdade para tocar em algum tema anteriormente. “Nunca me senti pressionada com relação a assuntos ou a horário. Escrevi numa novela das 18h uma avó gay que conversava sobre isso com o neto”, exemplifica, em referência à personagem Esther, vivida por Regina Duarte em Sete vidas. “Eu convido o público para uma conversa, e ele se abre. Se você não o desrespeita, ele vai na sua viagem”, completa. Ela ainda aponta a humanização como caminho para atingir a todo mundo.

Complexidade

Cauã Reymond classifica Um lugar ao sol como o momento mais complexo que enfrentou na televisão. “É meu trabalho mais complexo, que me gerou muita reflexão. Não dava para julgar o personagem. Até onde ele vai para ter uma vida digna que ele acha que merece? Até onde você iria sem se corromper? Fica uma mágoa no Christian de não ter tido a mesma oportunidade do outro, adotado”, reflete o ator.

Lícia brinca que, na verdade, Cauã faz três personagens: o desvalido, o rico e o desvalido se fazendo de rico. “Ele se sustenta no olhar aprisionado num corpo que não é o dele.”

Quando Christian assume a identidade de Renato, ele mexe com a vida de muitas outras pessoas, mas, especialmente, da namorada de Christian, Lara (Andréia Horta), e da noiva de Renato, Bárbara (Alinne Moraes).

Crédito: Fábio Rocha/ TV Globo Andréia Horta espera contagiar o público com a ética de Lara

“Lara fica destroçada. Ela só encontra força na avó, Noca (Marieta Severo)”, adianta Andréia. Ela comenta que a ligação entre avó e neta é muito forte e ressalta essa troca de gerações, aproveitada pela personagem e comemorada pela atriz. “Eu e Marieta tivemos uma troca que chegou a ser pelo olhar. É muito bonito porque (Lara e Noca) são duas mulheres de gerações diferentes, com valores diferentes, que se dão a mão na luta delas”, afirma Andréia.

Com tanto sofrimento, Lara não vai deixar de batalhar para mudar de vida. “Ela vai demorar a se reerguer. Mas vai fazer isso da maneira mais íntegra possível. Quero que a Lara seja um modelo, para o público, de uma pessoa ética que é feliz”, comenta Andréia.

Bárbara também tem um baque grande, não com a morte do cunhado que não conhecia, mas com a mudança que Renato apresenta quando é tomado por Christian. “Bárbara é muito complexa. Ela é um pouco de tudo e vai se transformando quando levanta a hipótese de Renato ter mudado tanto ao ponto de parecer outro homem. Ela vai pirando com a mudança de Renato porque percebe que tem algo errado, mas finge que está tudo perfeito por medo de perder a única coisa que ela tem. Ela vai se enganando até duvidar da própria sanidade”, define a atriz.

Crédito: Fábio Rocha/ TV Globo. Alinne Moraes não vê Bárbara como a grande vilã da trama

Novela inteiramente gravada

Um lugar ao sol vai estrear inteiramente gravada, prática que se tornou comum neste tempo de pandemia. Isso acaba fazendo com que o autor não tenha o artifício de mudar o rumo de personagens ao sabor dos humores do público.

Cauã Reymond pondera que “é muito bom saber que eu tenho certeza total do arco do personagem” e ainda lembra que foi bom gravar num ritmo “parecido com o de um seriado.” Lícia lembra que “o ônus foi não ter a reação do público” e ressalta que “a gente teve um tempo maior de feitura, e tempo é matéria-prima em televisão. Se eu tenho tempo para rasgar o capítulo e escrever de novo, vou ter a chance de fazer melhor”.

“Existe um erro ao se pensar que o grupo de discussão muda o final de uma novela. Ele é importante porque traz respostas, mas quando a Lícia começa a escrever a novela, ela já sabe como serão os principais finais”, explica o diretor Maurício Farias.