Lançada na última sexta-feira (11/1), Sex education é uma trama que debate o início da vida sexual — com suas inseguranças e tabus
Às vezes é difícil entender a estratégia da Netflix em relação a algumas séries. Esse é o caso de Sex education, que estreou na plataforma na semana passada sem nenhum alarde mesmo tendo dois protagonistas famosos — Gillian Anderson (Arquivo X e American gods) e Asa Butterfield (A invenção de Hugo Cabret, Ender’s game e O lar das crianças peculiares) — e uma história conduzida de uma forma, até então, inédita.
A melhor forma de explicar Sex education, de criação de Laurie Nunn, é pensar na possibilidade de a franquia American pie ter feito o dever de casa, quando estreou — e estourou — no fim dos anos 1990. As duas produções têm uma aspecto em comum: o objetivo da narrativa é explorar o início da vida sexual. A grande diferença é que o filme fez isso de uma forma escrachada e besteirol, sem querer de fato ensinar nada, enquanto Sex education aborda as inseguranças e os tabus que envolvem o sexo, sem ser apelativa e com um ar “educativo” num enredo que tem os melhores aspectos de uma “dramédia”.
Para isso, a história acompanha o protagonista Otis (Asa Butterfield), um adolescente que tem problemas com intimidade e começa a se questionar sobre ainda ser virgem. Ele ainda tem dificuldades de se masturbar quando percebe que todos os colegas da escola parecem estar “só pensando, falando e/ou fazendo sexo”. Esse é um assunto que ele aborda com o melhor amigo Eric (Ncuti Gatwa) e evita a todo custo de conversar com a mãe Jean (Gillian Anderson), terapeuta sexual extremamente liberal em relação ao sexo, algo que o constrange o tempo inteiro.
A narrativa ganha força quando Otis se vê numa situação estranha ao lado de Adam (Connor Swindells), o filho do diretor que pratica constantemente bullying na escola, mas longe da instituição tem diversas inseguranças, e Maeve (Emma Mackey), uma jovem de uma família problemática que é vista no colégio como uma menina descolada por ter a fama de ter transado com vários caras. Apesar de nenhum dos três serem amigos, eles acabam juntos em um banheiro abandonado da escola.
E é exatamente a partir dessa cena que a “mágica acontece”. Com dificuldades de chegar a uma ereção nas relações com a namorada, Adam toma viagra com intenção de transar com Aimee na escola. Ignorado pela menina, ele fica no banheiro sem saber o que fazer, até que Otis, com os conhecimentos aprendidos graças à convivência com uma terapeuta sexual, ajuda o menino dando alguns conselhos. Na hora, Maeve, que precisa de dinheiro para se sustentar por morar sozinha sem ajuda dos pais, percebe que esse pode ser um novo negócio. Ela, então, convence Otis a criar uma clínica para atender os jovens com problemas na vida sexual e ganhar dinheiro com isso. Ele aceita, se torna num fenômeno na escola, o que não, necessariamente, o ajuda com os próprios problemas.
Crítica de Sex education
Em oito episódios, a trama mostra Otis, que apesar de não ter nenhuma experiência, ajudando os colegas em questões relacionadas à vida sexual. E, dessa forma, a série debate temas tabus de forma nua e crua, como masturbação, prazer, relações entre pessoas do mesmo sexo, virgindade, aborto, entre outros e, ainda, de como as travas — tanto sexuais, quanto na vida — dos personagens podem ser causadas por problemas no âmbito familiar. Se Jean é a terapeuta dos adultos, Otis é dos jovens.
Além de fazer um ótimo trabalho ao abordar o sexo, a série ainda consegue trazer outros temas de forma extremamente interessantes, como assumir a homossexualidade, a opressão dentro de uma família e a quebra de padrões estéticos. O episódio 5, inclusive, é um dos mais fortes, dramáticos e importantes do seriado por falar de homofobia e também das chantagens feitas por meio do vazamento de fotos íntimas.
Já não bastasse isso, Sex education é um ótimo entretenimento. A série sabe dosar muito bem humor e drama e tem um elenco muito carismático, com personagens facilmente relacionáveis. Asa Butterfield e Gillian Anderson, como já era de se esperar — pela experiência de ambos –, vão muito bem na pele dos seus personagens. Mas o elenco, em si, tem ainda vários outros atores novatos roubando a cena.
Ncuti Gatwa, que faz Eric, é um deles. O ator está muito bem na pele do personagem, que é quase um mini Tituss, de Unbreakable Kimmy Schmidt, com cenas engraçadíssimas no início da série e com um teor mais dramático nos episódios finais. Emma Mackey, que interpreta Maeve, é outra que chama bastante atenção. Com um visual que lembra demais Margot Robbie, ela estabelece uma boa química com Asa Butterfield e entrega uma personagem carismática, forte e atual, ao ter uma pegada feminista.
Entre o elenco de coadjuvantes também há vários outros personagens interessantes, como Jackson (Kedar Williams-Stirling), o atleta popular da escola que se interessa por Maeve; e Lily (Tanya Reynolds), uma jovem que escreve uma história em quadrinhos e está obcecada por perder a virgindade.
Apesar de ser uma série inovadora, Sex education bebe da fonte das tradicionais tramas sobre o dia a dia dos adolescentes no ensino médio, até por isso, há momentos em que é fácil perceber para onde a trama vai e a presença de alguns personagens estereotipados, como o grupo dos Intocáveis. Porém, isso não é um problema, porque até chegar aos desfechos “previsíveis”, a produção apresenta tanta novidade, com boas atuações e tantos momentos de descontração, que vale a maratona.