Série Dom acerta ao humanizar os personagens

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Estreia do Amazon Prime, a brasileira Dom se destaca pela relação entre pai e filho em meio ao mundo do crime

Por Pedro Ibarra*

Dom é uma história que envolve narcotráfico, assalto, ditadura e jogos de poder. Entretanto, a principal virtude da série, que estreia nesta sexta-feira (3/6) no Amazon Prime, está na forma como ela constrói a humanização nos personagens. Todas as relações são muito verdadeiras, e a produção não poupa tempo para apresentar as origens de cada um, com ênfase nos que fazem parte do núcleo principal.

Pedro Dom (Gabriel Leone) foi um criminoso famoso, era uma escolha fácil representá-lo apenas como um vilão ou um grande monstro. Contudo, a série opta por apresentar toda a origem do personagem — um menino de classe média que cai para o crime na busca de dar sentido à própria vida. Nessa humanização, relações do protagonista ganham verdade, profundidade e se destacam em comparação aos momentos de ação do seriado, que também são bons, mas não a melhor parte da produção.

Destacam-se duas relações do personagem principal. A primeira é a com o pai Victor (Flávio Tolezani), com quem divide o protagonismo. Os dois têm características parecidas, apesar de personalidades distintas. Uma relação extremamente intensa, duas personas que odeiam se amar e que conseguem se perdoar, apesar de tudo. Victor acredita no filho mais do que em qualquer outro. Pedro, por mais que erre com frequência, só quer dar orgulho ao pai. A droga os une e os afasta de forma poética. A cocaína é interesse de ambos, e o pior vilão dos dois.

A segunda relação que se sobressai é de Dom e Lico, personagem de Ramon Francisco. A mãe de Lico trabalha para a família de Pedro e os dois, desde criança, fazem tudo juntos. O arco de ambos, mais fechado da série, esbanja carisma, e os dois protagonizam o momento de maior emoção da história. A capacidade cômica de Ramon também adiciona às interações dos personagens o fator da diversão, somado ao fato de o espectador assistir ao crescimento dos dois. As passagens de tempo do seriado geram um apego a essa amizade.

Dom não tem rótulos claros

Com o passar dos episódios, é muito difícil apontar quem são os vilões da série. Com a humanização dos personagens, todos têm um lado bom e um lado ruim. Não é polícia contra ladrão, não é pai contra filho, não é Estado contra o crime. Todos têm suas falhas, cometem erros, burlam regras intencionalmente.

Pedro Dom é vilão, afinal comete crimes hediondos, mas ele foi uma criança que aprendeu a vida na rua, experimentou o que quis e não teve o pulso firme dos pais. Seriam os pais de Pedro os vilões? Também não, pois Victor estava tão ligado em lutar contra as drogas nos morros que não imaginou que elas poderiam chegar à própria casa. Seriam as drogas as vilãs? Mais uma vez não, elas são apresentadas como uma chaga par diversas famílias, mas também como um negócio que gira a economia das favelas do Rio de Janeiro.

Essas sucessivas questões são levantadas porque a série retrata a vida real, de forma hiperbólica e dramatizada, mas, ainda assim, realista. Na vida real, não existem heróis e vilões, o bem e o mal estão misturados em uma massa que, às vezes, é até difícil distinguir qual lado está certo, ou se há certo e errado.

Aspectos técnicos

O ponto em que o seriado mais ousa é no roteiro, com viradas de protagonistas, representação de várias décadas distintas e uma história que a todo tempo recebe novas informações que adicionam nuances à narrativa. Com isso, para acompanhar algo tão complexo, foi necessária uma produção arrojada, que segundo o próprio diretor usou mais de 100 atores e 170 locações.

O produto final é entregue sem problemas graves. A gigante produção funciona da forma mais simples possível sem inventar demais em jogos de câmera, efeitos visuais ou fotografia. A direção de arte, no entanto, faz um trabalho notável. Incomoda um pouco o fato de Gabriel Leone usar uma lente durante toda série e não ter sido escolhido um ator de olhos azuis. No entanto, a potência da atuação faz o fato cair no esquecimento. Gabriel incorpora tão bem Pedro Dom, que, por vezes, fica irreconhecível.

O formato escolhido pelo seriado também é simples. A produção deixa ganchos para influenciar o público a assistir aos próximos episódios — os chamados cliffhangers. A série soube como subir as expectativas durante toda a temporada e já deixa pontas soltas para um eventual segundo ano. Basta saber se a grande aposta que o Amazon Prime Video fez na produção brasileira dará o resultado esperado e se a história de Pedro Dom terá a oportunidade de ser mostrada até o fim.

*Estagiário sob a supervisão de Sibele Negromonte

Vinícius Nader

Boas histórias são a paixão de qualquer jornalista. As bem desenvolvidas conquistam, seja em novelas, seja na vida real. Os programas de auditório também são um fraco. Tem uma queda por Malhação, adorou Por amor e sabe quem matou Odete Roitman.

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