Transmissão1 Credito: Canal Brasil/Divulgação. Apresentadoras do programa TrasMissão Jup do Bairro e Linn da Quebrada.

Segunda temporada de TransMissão traz Linn da Quebrada e Jup do Bairro mais à vontade

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No talk show TransMissão Linn da Quebrada e Jup do Bairro trazem entrevistas bem-humoradas sobre temas identitários

O tom é de uma conversa informal entre as apresentadoras Linn da Quebrada e Jup do Bairro. Mas não se engane: entre risadas e muito bom humor, elas e os convidados do programa TransMissão estão discutindo assuntos pra lá de sérios. O talk show chegou semana passada à segunda temporada no Canal Brasil, sendo exibido às segundas-feiras. Nesta segunda (8/6), a convidada é Liniker e, na outra semana (15/6), o papo é com o jornalista Pedro Bial. A estreia foi com Dira Paes e a temporada ainda tem Criolo e Xico Sá, entre outros.

“As entrevistas vão além das identidades individuais. Construímos uma perspectiva conjunta de várias possibilidades com esses encontros. Passamos por possibilidades, novas visões e questionamentos pertencentes ao nosso tempo. Conversamos com diversas pessoas com recortes de classes diferentes, raças, gêneros, idades e diferentes pontos de vistas, contudo, pessoas muito fiéis ao que acreditam. Isso faz com que eu entenda cada vez mais que nossa identidade pode e deve ser moldada e remendada para pertencemos a novas urgências”, afirma Jup do Bairro em entrevista ao Próximo Capítulo.

Linn conta que as duas estão mais à vontade nesta temporada, inclusive para fugir do roteiro, como aconteceu na entrevista com o ator Matheus Nachtergaele. “Conseguimos elaborar questões e caminhos muito interessantes a seguir, o que não quer dizer que estávamos engessadas nos temas propostos. Tanto que com o Matheus Nachtergaele nós abandonamos completamente o roteiro. Esse dia, confesso que fiquei ligeiramente mais nervosa, por além da admiração pessoal ao artista, perceber que precisaria estar presente e traçar um novo trajeto a conduzir”, lembra.

Além de Matheus, outro momento marcante na temporada foi com a escritora Djamila Ribeiro. “Podemos trocar sobre ‘local de fala’ e enfatizar que o local de fala de um indivíduo não significa o local de silêncio do outro. Podemos falar sobre todos os assuntos, mas é importante frisar que a minha fala será sobre as perspectivas que atravessam o meu corpo, minhas vivências, habitação geográfica e vice-versa”, justifica Jup.

Entrevista// Linn da Quebrada e Jup do Bairro

Dira Paes foi a convidada da estreia da segunda temporada de TransMissão
. Crédito: Canal Brasil/Divulgação. Dira Paes foi a convidada da estreia da segunda temporada de TransMissão

Algum convidado deixou vocês mais nervosas? Porque?

Linn da Quebrada – Nervosa não seria bem a palavra, porque sinto que nos preparamos muito bem para receber todas as convidadas e os convidados. Inclusive, me senti mais segura como apresentadora. Afinal, já é a nossa segunda temporada. Estava ansiosa, mas de um jeito bom e saudável. Conseguimos elaborar questões e caminhos muito interessantes a seguir, o que não quer dizer que estávamos engessadas nos temas propostos. Tanto que com o Matheus Nachtergaele nós abandonamos completamente o roteiro. Esse dia confesso que fiquei ligeiramente mais nervosa, por além da admiração pessoal ao artista, perceber que precisaria estar presente e traçar um novo trajeto a conduzir. As perguntas e a pesquisa feitas anteriormente nos servem como base, como ponto de partida, mas não necessariamente como objetivo final.

Houve medo de a primeira temporada não ser aceita pela sociedade mais conservadora? A segunda temporada é um sinal de que a sociedade está mais tolerante ou um ato de resistência?

Jup do Bairro – Acredito que tem muita coisa acontecendo, muitas pessoas, instituições e espaços se adaptando a uma conscientização maior, mas ainda são casos isolados. O corpo LGBT+, principalmente T e negro, precisa muito mais do que uma data comemorativa para “lembrarmos da nossa luta”, que é vivida todos os dias. Precisamos de afeto, de trabalho, de sentirmos pertencimento. Nossas ancestrais não lutaram e muitas teriam suas vidas ceifadas para que fosse data comemorativa. Precisamos falar sobre dignidade, respeito, empregabilidade e não só para as protagonistas de sua campanha, marca ou canal. Precisamos de oportunidade para redatoras lésbicas, negras, produção trans, homens trans pegando em máquinas… Precisamos sair dessa lógica de representação una, como se a história sendo registrada pelas lentes cisgêneras e brancas fosse o bastante. Reconhecer seus privilégios é também abrir mão muitas vezes. De que celebração estamos falando?

As entrevistas de TransMissão falam sobre identidade indo por diferentes vieses. Estamos sempre em busca de uma identidade? Vocês acham que temos apenas uma identidade? A arte de vocês acaba sendo uma forma de firmar essa(s) identidade(s), não?

Jup do Bairro – Acredito que as entrevistas vão além das identidades individuais, construímos uma perspectiva conjunta de várias possibilidades com esses encontros. Passamos por possibilidades, novas visões e questionamentos pertencentes ao nosso tempo. Uma ideia que levo comigo desde a primeira temporada é uma fala de Antônio Pitanga de que precisamos nos atentar ao nosso tempo agora, para que não fiquemos caducos às novas performances sociais. Conversamos com diversas pessoas com recortes de classes diferentes, raças, gêneros, idades e diferentes pontos de vistas, contudo, pessoas muito fiéis ao que acreditam. Isso faz com que eu entenda cada vez mais que nossa identidade pode e deve ser moldada e remendada para pertencemos a novas urgências, abordamos novos assuntos. Na segunda temporada, em um encontro com Djamila Ribeiro, podemos trocar sobre “local de fala” e enfatiza que o local de fala de um indivíduo não significa o local de silêncio do outro. Podemos falar sobre todos os assuntos, mas é importante frisar que a minha fala será sobre as perspectivas que atravessam o meu corpo, minhas vivências, habitação geográfica e vice-versa. Não podemos justificar nossas imperfeições à nossa identidade e manutenção da mesma, precisamos dar um F5 no nosso HD a todo momento para pertencemos com responsabilidade a nossa conjuntura atual.

Mesmo falando de assuntos muitas vezes mais sérios vocês têm humor nas entrevistas. O bom humor é um antídoto contra coisa desagradáveis ou mesmo contra o Brasil de hoje?

Linn da Quebrada – O humor é algumas vezes cirúrgico porque nos permite desarmar a convidada ou convidado e repensar com mais cuidado e delicadeza temas e assuntos para o qual já teríamos uma resposta pronta. É uma brincadeira séria. Eu amo usar um humor pouco convencional, irônico. Fazer rir de barbaridades e já não ter certeza se estou rindo de mim ou de algo fora de mim. É criar uma intimidade casual que nos permite, inclusive, revelar de forma humanizada e delicada preconceitos e pensamentos tradicionais e obsoletos, enraizados, contraditórios e com um sabor levemente azedo. Que só percebemos quando mordemos. O humor é uma isca.

A segunda temporada acendeu uma vontade maior de continuarem sendo entrevistadoras?

Linn da Quebrada – Sinto, e sinto muito. Desta vez pude sentir ainda mais, pois pude exercer essa função com outra postura. Uma postura curiosa, experimental e arriscada, porém, com mais segurança no que estava fazendo. É um novo programa, com novas convidadas, mas eu já passei por aqui. Aprendi muito com a primeira temporada e agora me sinto preparada para errar em outros lugares. Pude, com um dos convidados, discordar de seus pontos de vista. Senti na pele a responsabilidade, como apresentadora, de construir um espaço seguro para ambas as partes de disputa de ideias. De construção de pensamento. Sem estar fixa nos meus argumentos e propiciando uma discussão horizontal e madura. Essa foi inclusive uma das minhas entrevistas favoritas.

Jup do Bairro – Eu sempre fui muito curiosa, gosto de conversar, saber mais sobre assuntos que não domino e também respeito muito o meu silêncio quando não tenho algo materializado a falar. Acredito que o programa traz muito essa sensação de estar desprendida para gerar uma conversa ali, com aquela mente, aquele humor, aquela possibilidade. O TransMissão foi uma possibilidade de materializar esse meu lado investigador.