“Deus, conceda-me a serenidade para aceitar aquilo que não posso mudar, a coragem para mudar o que me for possível e a sabedoria para saber discernir entre as duas”. O “bordão” que embalou a minissérie da Netflix Missa da meia-noite ao longo dos sete episódios dá exatamente o tom de apresentação da série: uma mistura entre medo, religião e expectativa.
A estreia de Missa da meia-noite (Midnight Mass, em título original) era aguardada como uma das grandes do ano pelos fãs de séries de suspense. A produção coroa a “trilogia” de séries antológicas de Mike Flanagan, um dos maiores showrunners da televisão norte-americana na atualidade. No fim das contas, a expectativa foi mais do que respondida.
Desde Hill em 2018 e Bly em 2020 — todas pela Netflix (o Próximo Capítulo tem a crítica de ambas, respectivamente aqui e aqui) —, o criador, escritor e diretor mostrou uma aptidão acima da média para o terror, em que o gênero é trabalhado além dos sustos, sangue e corpos.
É importante pontuar: a ligação entre as séries é mínima. Além da criação de Flanagan, as três compartilham apenas o gênero e alguns atores. A genialidade de Flanagan aterrissa na absorção do terror nos diálogos, nas situações, nas motivações e na construção da história. Missa da meia-noite é o ápice deste trabalho.
Comunidade e falência
A história de Missa da meia-noite tem como ponto de partida um acidente de carro. Tudo que sabemos é que um homem bêbado atropelou e matou uma jovem. Logo, ele é condenado a quatro anos de prisão. A condenação na dimensão espiritual, contudo, é pior: todo dia ele tem o sono embalado pelo rosto da jovem deformado por cacos de vidros que refletem a luz da ambulância.
Quatro anos depois, este homem, que agora conhecemos como Riley (Zach Gilford), é reformado pelo sistema carcerário norte-americano, está falido e tem de morar com os pais e o irmão caçula na ilha de Crockett, que atualmente vive apenas com 127 pessoas e em uma decadência aterrorizante.
A chegada de Riley ocorre em paralelo com a chegada do “novo” padre, Paul (Hamish Linklater). Aparentemente um homem de fé, Paul na verdade leva uma maldição para a comunidade de Crockett, que já tem de lidar com tantos outros problemas.
A religião e devoção de Paul, contudo, o fazem confundir essa maldição com uma benção. Aos poucos, o padre vai, literalmente, envenenando toda a comunidade com uma fé forjada em desejos bem humanos, e longe de qualquer santidade.
Assistir a Missa da meia-noite não é uma tarefa necessariamente fácil. Isso no sentido de que a produção precisa de uma considerável dedicação do público. Aqui o Flanagan lança mão, em todo seu esplendor, de uma característica cada vez mais rara na TV rápida de hoje em dia (e mais rápida ainda no streaming): os diálogos homéricos.
Os personagens são expostos por falas que se confundem com monólogos, longos, solitários e sobre versos bíblicos quase intermináveis. O estudo de Flanagan sobre o livro de Deus é um trabalho primoroso. A Bíblia é revisitada com tanta profundidade em Missa da meia-noite, que o verdadeiro sentido da história é alcançado de forma magistral: as palavras santas são manipuladas de acordo com a vontade dos humanos.
E Hamish Linklater e Samantha Sloyan (no papel da beata Bev) são os grandes heróis dessa manipulação. Os atores entregam arroubos de qualidade e excelência ao passarem sete episódios declamando a Bíblia com tanto afinco.
Missa da meia-noite lança luz sobre as fundamentais questões da existência humana (e sim, da razão da religião). O que é vida eterna? O que é bondade? O que é “ajudar” o próximo? O que é se salvar? Como se salvar? E se as palavras da Bíblia tomassem forma diante dos nossos olhos? Como encararíamos uma ressurreição? A morte? Um “anjo”?
Em um contexto em que Missa da meia-noite é ofuscada por Round 6, outro terror, mas de bem menos qualidade, é realmente um sopro de vigor perceber que a TV ainda tem espaço para uma proposta de tamanha inteligência e profundidade, e o mais surpreendente: na Netflix.
Em síntese, a maratona de Missa da meia-noite é mais do que recomendada, é um verdadeiro presente para aqueles que amam uma boa história.
28
Ator carioca de 46 anos retorna às produções bíblicas com Reis em ano que festeja…
Ator de 33 anos comentou sobre os trabalhos no audiovisual que vem emendando desde 2020…
Atriz que protagoniza No ano que vem e estará de volta com Rensga Hits celebra…
Protagonista das cinco temporadas de Star Trek: Discovery, Sonequa Martin-Green comenta o caminho trilhado pela série…
Ator pernambucano, de 37 anos, entrou para o elenco de Família é tudo, da Globo, e…
Atriz gaúcha protagoniza série independente gravada no Mato Grosso e exibida em uma tevê estatal…