Crédito: Andrea Dematte/Divulgação. Jacqueline Sato, atriz e apresentadora Jacqueline Sato, atriz e apresentadora | Crédito: Andrea Dematte/Divulgação.

Jacqueline Sato fala sobre a sororidade na prática

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Atriz e apresentadora está na série do Star+ A história delas e à frente do programa Mulheres asiáticas, no canal E! Entertainment

Patrick Selvatti

 

A série A história delas, em cartaz no Star+, conta a história de uma ex-babá negra e agora dona do próprio negócio que se vê obrigada a hospedar em sua casa a ex-patroa e sua filha, brancas e louras. Essa inversão de papeis é a espinha dorsal da narrativa. Integrante do elenco, a paulista Jacqueline Sato, 35 anos, comenta a importância dessa abordagem social. 

Descendente de japoneses e com traços marcantes da etnia, Jacqueline comemora o fato de viver uma personagem que foge ao estereótipo de asiática.  “Eu sei muito bem o quanto o não me ver representada me afetou, e busco através do meu trabalho, executar papéis que, de alguma forma, mesmo que mínima, venham a preencher essa lacuna que faz tanta falta”, explica a artista e apresentadora, que criou e vai comandar, chamado Mulheres Asiáticas, no canal E! Entertainment.

Crédito: Jorge Bispo/Divulgação

ENTREVISTA/ Jacqueline Sato

 

A série A história delas é marcada por uma inversão de papéis, em que uma negra emergente abriga a ex-patroa loira em casa. Qual a importância dessa abordagem social nos dias de hoje?

Acho extremamente importante colocar uma lupa nas estruturas injustas da nossa sociedade. Algumas seguem perpetuando atitudes que ao invés de desconstruir, reforçam estes sistemas. Tem muitas formas de abordar este assunto, mas acredito que através da ficção, muitas vezes, é possível tocar o coração e a mente de uma forma única, gerando a empatia que é tão necessária para que haja alguma transformação positiva. Consciência de classe, de gênero, de raça são temas urgentes que, muitas vezes, as pessoas fogem de se aprofundar. Se despertar uma única pessoa em uma única questão através de uma única cena, uma linda missão estará sendo cumprida para além do entretenimento que a série se propõe.

Sua personagem na série tem uma camada feminista forte. Como essa bandeira se manifesta na sua vida pessoal?

Sim, ela tem. E todas as outras personagens da série também. Acho incrível como conseguiram costurar histórias tão diversas que se complementam para trazer um prisma mais completo dos desafios do que é ser mulher. Torço muito para que essa primeira performe super bem e a série seja renovada, pois a história dessas mulheres todas precisa continuar. Sério, eu acabei a temporada e eu e todo mundo que estava comigo assistindo ficou agoniado querendo muito saber o que vai acontecer com elas. Mas, voltando ao feminismo na minha vida, é algo muito forte. Nós todas crescemos numa sociedade patriarcal, extremamente machista, e para apenas existir de forma autentica e livre há que ser feminista, questionar as atitudes dos outros e as suas próprias, se não, essa estrutura te poda e te resseca. O duro é que às vezes demora até a gente enxergar, principalmente as nuances mais sutis que agem a todo momento. Eu confesso que sempre lutei contra isso, e coisas mais óbvias eram mais fáceis, mas, infelizmente, essa estrutura é tão arraigada que perpassa nossas subjetividades de formas assustadoras: muitos dos nossos sonhos e objetivos de vida contém doses dessa lógica. E temos que questionar mesmo. Nossos desejos são um mix de algo interno, muito genuíno, com pitadas maiores ou menores daquilo que vem do externo. Então, pra mim, é muito necessário estudar, ler, conhecer, se rodear de outras mulheres que dividam essa jornada de ânsia por transformação social, e pessoal.

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Em entrevista recente, você comemorou o fato de viver uma personagem que foge ao estereótipo de asiática. O que isso representa para você?

Isso sempre foi uma das minhas prioridades, pois não quero dar vida a personagens que reforcem preconceitos e estereótipos que eu e todo um grupo já não aguenta mais ver. Essa falta de representatividade afeta não só a nós artistas, mas a uma parcela significativa da população. Eu sei muito bem o quanto o não me ver representada me afetou, e busco através do meu trabalho, executar papéis que, de alguma forma, mesmo que mínima, venham a preencher essa lacuna que faz tanta falta. Posso comemorar que a maioria dos  papéis que fiz vão exatamente de encontro a essa minha vontade, são poucos inclusive que tinham ligação direta com o Japão de alguma forma, e  nestes, busquei executar de forma a não reforçar qualquer possível estereótipo. Mas preciso dizer que para conquistar essa lista de personagens que atendam a esta minha prioridade, eu tive que dizer muito não. Desejo que muito em breve não haja mais a necessidade de dizer não a papéis estereotipados por já ter havido a transformação tão necessária na visão que se tem de nós. Comemorei muito a Mirella, pois foi um convite direto da Diana Gallantini, produtora de elenco que me conhece há anos, foi ela que me chamou para meu primeiro teste para uma série como atriz em “Psi”, da HBO. E já na época, acho que 2011 ou 2012, ela já tinha essa visão que muitos ainda precisam desenvolver, pois me chamou para o teste de uma jornalista, onde eu estava sendo testada junto com mulheres de diversas outras características fenotípicas, e quem acabou passando fui eu. Mas não por que a personagem TINHA que ser asiática, ou trazia qualquer estereótipo, e sim, pelo que entreguei como atriz ali no teste, e depois na série. Tanto é que ela retornou na segunda temporada. No caso, foi um papel pequeno, mas que teve muito significado pra mim. E que já me trouxe muitos outros frutos, como, agora, a Mirella que me deixou muito feliz. O que mais quero como atriz é poder interpretar bons papéis e bastante diferentes entre si. Eu ainda não tinha feito nada parecido com a Mirella até agora. Então estou comemorando mesmo!

Esse tema, inclusive, é o norte do programa que você vai apresentar. O que o público pode esperar do Mulheres Asiáticas?

Sim! Finalmente! Rsrs Bom, fora o fato de ser o primeiro programa que tem como principal propósito trazer representatividade real a nós, mulheres com ascendência asiática, o programa revela encontros autênticos entre mulheres que são referências em suas profissões e dividem seus desafios, dores, e superações num ambiente onde a vulnerabilidade é muito bem-vinda, e o acolhimento mútuo mais ainda. Uma conversa franca seguida de um desafio de troca de experiências onde uma ensina algo totalmente novo para a outra, e todos podem sentir a satisfação que existe em aprender algo pela primeira vez, a diversão, e o quanto crescemos quando estamos abertas a uma conexão e troca genuínas. A tal da sororidade na prática.

É um programa que aquece o coração, inspira, e diverte ao mesmo tempo.

Ao trazer pra frente das telas mulheres reais, o intuito foi ajudar a retirar as camadas de véus, muitas vezes preconceituosos, que se projetam na nossa frente antes mesmo que a pessoa nos conheça, por conta de um imaginário coletivo recheado de referências duvidosas que reforçam estereótipos, e impedem que sejamos vistas em nossas individualidades. 

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A cada episódio eu e duas mulheres muito diferentes uma da outra se conectam profundamente, e para além do que as torna únicas, podemos ver quantas vivências relacionadas a preconceito são comuns, independente da área de atuação ou faixa etária. Tem mulheres da casa dos 20 aos 80 anos. Muitas vezes passamos por uma situação desconfortável e achamos  “ah, foi só comigo”, mas ao perceber que é um problema coletivo isso nos move e nos fortalece para agir. Nesse programa aconteceu e muito! A gente se emocionou demais durante o processo e eu espero que essa emoção chegue em quem assiste. As nossas vozes, a das nossas mães e avós foram muito pouco ouvidas ao longo da história, e sinto que pra todas nós foi uma grande oportunidade de ocuparmos um espaço que há tanto tempo merecia ser ocupado, e a darmos voz a temas há tanto tempo represados e desconhecidos para o grande público. 

No teaser que criei lá no início do processo, eu começava com a seguinte pergunta: “O que você vê quando pensa em mulheres asiáticas?”. Seja lá o que for que veio à sua mente, o programa vai te mostrar que somos muito além disso.

Como surgiu a apresentação de programas de TV na sua vida?

Nossa, esse foi meu primeiro emprego rsrs. Quando eu tinha uns 12 anos de idade eu apresentei um programa na antiga CNT. Depois voltei a apresentar outros depois de formada em Rádio e TV e como atriz. É muito bom poder apresentar programas a respeito de assuntos que nos interessam.