Crédito: Breno da Matta/ Divulgação. Cultura. Youtuber Vitor diCastro Crédito: Breno da Matta/ Divulgação. Cultura. Youtuber Vitor diCastro

Influenciador digital Vitor diCastro aponta que as histórias de LGBTQIA+s na ficção estão mais bem desenvolvidas

Publicado em Entrevista

Vitor diCastro comemora personagens gays co história própria em novelas e séries. Para ele, falta incluir os atores

O influenciador digital Vitor diCastro tem mais de 5 milhões de seguidores nas redes sociais. Produtor de conteúdo voltado para a comunidade LGBTQIA+, ele concorda que, embora ainda haja um caminho longo a percorrer, a representatividade em novelas e séries está aumentando.

“Por muito tempo, personagens LGBT eram utilizados como alívio cômico ou como protagonistas de histórias tristes ou violentas. Somos muito mais que isso, e hoje é mais fácil encontrar histórias diversas protagonizadas por LGBTs, personagens complexos, profundos, que têm outros conflitos. Ainda faltam oportunidades porque muitos personagens gays continuam sendo interpretados por homens héteros e, quando falamos sobre representatividade, também precisamos reparar nisso”, reflete.

Para Vitor, essa maior exposição “ajuda a naturalizar os corpos e as questões que os LGBTs trazem”. “Uma vez fui fotografado por um homem trans que disse, chorando, que a mãe dele só entendeu quem ele era depois de assistir ao Ivan da novela A força do querer. O audiovisual chega a lugares que o ativismo por si só não alcança”, lembra.

O ativismo de Vitor é marcado por posts de mensagens fortes, mas quase sempre engraçados. “Eu sempre digo que o humor ‘amacia a carne’ pra gente chegar com os problemas maiores. É uma ferramenta poderosíssima, que derruba algumas barreiras que a gente coloca para assuntos complexos. Quando faço um post sobre determinado assunto relevante, eu faço motivado pela urgência, pela vontade de mudar a realidade, pela raiva ou pela didática. O humor é só a ferramenta que eu uso, só a maquiagem, todo o resto é sério”, ensina.

É sério e merece ser discutido em escolas, na televisão, nas mesas de bares durante o ano inteiro.

Leia a entrevista com Vitor diCastro

Crédito: Breno da Matta/ Divulgação. Cultura. Youtuber Vitor diCastro

Como você vê a representatividade LGBTQIA+ em séries e novelas? Há mais personagens homossexuais com história e sem ser apenas o engraçado do que há alguns anos?
Com certeza há, graças a Deus (risos). Por muito tempo personagens LGBT+ eram utilizados como alívio cômico das produções todas, ou no máximo como protagonistas de histórias tristes ou violentas. A gente sabe que a bicha engraçada existe. A gente sabe que a homofobia também existe. Mas somos muito mais que isso, e hoje é mais fácil encontrar histórias diversas protagonizadas por LGBTs, personagens complexos, profundos, que tem outros conflitos. Agora o que eu acho é que ainda faltam oportunidades para os atores gays, porque muitos personagens gays continuam sendo interpretados por homens héteros, e quando falamos sobre representatividade também precisamos reparar nisso.

Inserir essas personagens em obras de ficção ajuda em que medida a diminuir o preconceito?

Ajuda a naturalizar os corpos e as questões que os LGBTs trazem. O que a maioria das pessoas precisa para não ter mais preconceito é justamente entrar em contato com as nossas histórias, pra desmistificar, pra contrapor todas as fake news envolvendo nossa comunidade. Uma vez fui fotografado por um homem trans que disse, chorando, que a mãe dele só entendeu quem ele era depois de assistir o Ivan da novela A força do querer. Entende a potência de se levantar as discussões através da ficção? O audiovisual chega em lugares que o ativismo por si só não alcança.

O Brasil é um dos países mais LGBTfóbicos do mundo. Como lutar contra isso?

Não sendo LGBTfóbico já é um bom começo (ridos). Vejo muita gente mudando foto de perfil em junho para mostrar que é “gayfriendly”, mas me questiono se essas mesmas pessoas não ficam reproduzindo um monte de preconceitos no resto do ano. É importante a gente se observar, se questionar: “será que eu sou homofóbico?”, “será que estou sendo preconceituoso com as travestis?”. Autocrítica é tudo. E aí depois um bom Google e umas horinhas gastas em canais de YouTube especializados no assunto te darão informação suficiente para que, além de não reproduzir mais preconceito, você possa também educar o amiguinho. É fácil, prático e melhora muito a nossa vida.

Recentemente, famosos resgataram um vídeo de um pastor e desencadearam a discussão de que é possível você respeitar o casamento gay, mas não concordar com ele. O que acha disso?

Patético. Aparentemente há uma confusão sobre o que é respeito e o que é concordância. O casamento gay não é passível de opinião, ele é um direito garantido pela lei brasileira. Eu casei no papel, tenho meus direitos reservados bonitinho, e ninguém tem nada a ver com isso, não cabe a ninguém opinar sobre. A nossa existência e o nosso afeto não estão disponíveis para que haja algum tipo de concordância. E eu entendi também que, ao dizer que você respeita alguém, você deve estar atento a todas as necessidades daquela pessoa, e não acredito que alguém se atente ao que um gay necessita quando fala que “respeita, mas não concorda”. Quem pensa assim precisa ser mais empático e, pelo amor de deus, parar de se orgulhar em ser conservador.

Quando o humorista Paulo Gustavo morreu vimos a mídia toda chamando o Thales Bretas de “marido” do Paulo. Apesar de ele ser exatamente isso, o termo acabou chamando a atenção. Você acha que isso foi um avanço?

Muito! Eu também sou casado e quantas vezes chamam meu marido de meu “companheiro”, meu “parceiro”, meu “namorido”. Eu entendo que pode ser um vício de linguagem, algo espontâneo, mas chamar de MARIDO reforça que gays podem casar, podem ter família, podem ter direitos.

As escolas deveriam tratar de representatividade?

Representatividade, sexualidade, gênero, drogas… Assuntos urgentes e muito relevantes como esses devem estar dentro da escola, tem que discutir, tem que orientar. Esse papo de “vão ensinar sexo pras crianças” é uma mentira enorme. Quantas pessoas você conhece que teve aula de sexo? Eu não conheço nenhuma, e, segundo as estatísticas, isso não existe. O que existe é um monte de gente que passa todo o período escolar sem realmente aprender o que devia. O papel da escola é formar um cidadão, mas aparentemente isso é deixado de lado o tempo todo, e agora parece que a escola forma apenas mão de obra para o capitalismo.

Na internet sua militância é permeada por muito humor. A comédia é uma arma para que assuntos sérios cheguem ao público? Como fazer para não ficar apenas no “engraçado”?

Eu sou uma pessoa engraçada, gosto de rir, de fazer rir, então o meu ativismo não tinha como ficar longe disso. E eu sempre digo que o humor “amacia a carne” pra gente chegar com os problemas maiores, é uma ferramenta poderosíssima que derruba algumas barreiras que a gente coloca para assuntos complexos. Agora, sobre não ficar só na graça, pra mim é muito simples. Quando eu faço um post sobre determinado assunto relevante, eu faço motivado pela urgência, pela vontade de mudar a realidade, pela raiva ou pela didática. O humor é só a ferramenta que eu uso, só a maquiagem, todo o resto é sério, então fica difícil me perder nisso.

Você tem uma militância virtual muito forte. É justamente na internet que estão mensagens de ódio muito duras contra os LGBTQI+. Como você lida com essas mensagens?

Eu não leio nada, não fico buscando comentários, mensagens, marcações. Se estou lá falando sobre algo é porque acredito naquilo, então me mantenho distante das respostas grosseiras e negativas para não atrapalhar meu trabalho, ou meu humor, ou minha saúde mental. Mas quando, mesmo sem eu ir atrás, essas coisas chegam até mim, eu respondo, tiro print, faço escândalo, divulgo. Não existe nada melhor que expor um homofóbico ao ridículo que ele é. Depois eu dou uma chorada de leve? Sim, mas coloco a culpa no meu signo e sigo o baile.

Falta uma política que puna esse tipo de ataque com mais rigor, mesmo que muitas vezes as mensagens venham de robôs ou perfis falsos?

Eu acredito que falta as plataformas se responsabilizarem mais pelas coisas que são ditas ali. Muita gente tem a impressão de que as redes sociais são terra de ninguém, que você está livre pra falar tudo que quiser, mas a gente sabe que não é assim, então de fato o tio Mark Zuckerberg tem que fazer mais do que está fazendo agora. Mas acredito que também tem que haver um trabalho muito forte de conscientização para que a população entenda os limites, porque eu não quero só que a pessoa seja punida, eu quero que ela nunca faça isso, porque depois que a gente já leu um ataque na internet fica difícil ‘’desler’’.