Quando uma novela que tem Gloria Pires à frente do elenco estreia a gente já fica atento à atriz. Em Éramos seis não foi diferente. Ou melhor, foi. Gloria vem no que, até agora, é um dos melhores papéis da carreira dela. Estamos acostumados a ver a atriz com seu carregado sotaque carioca. Atriz de detalhes, Gloria se despiu dessa alma carioca para viver a paulistana Dona Lola.
Não é só isso. A personagem tem a submissão característica das mulheres brasileiras da década de 1920 (época em que a novela está nessa primeira semana), mas também tem uma força que a coloca um passinho à frente das contemporâneas e a leva a questionar as irmãs por que elas acham que não é possível ser feliz sem um casamento. Dona Lola tem muitos momentos de amargura e preocupação, mas tantos outros de ternura, especialmente quando fala da família ー o marido e os quatro filhos. E Gloria dá conta de tudo isso com extrema naturalidade. Parece fácil vendo a atriz em cena ー mesmo sabendo que isso é fruto de talento e esforço.
A família de Lola nem sempre corresponde às expectativas, entretanto. As brigas entre Carlos (Xande Valois) e Alfredo (Pedro Sol) já cansaram de tão frequentes e bobas ー “coisa de meninos”, diria uma amorosa Dona Lola. Os jovens atores são boas promessas, mas a trama precisa decolar ー mesmo sabendo que essa espécie de prólogo será importante para quando os meninos forem adultos, interpretados por Danilo Mesquita e Nicolas Prattes, respectivamente. A menina Isabel (Maju Lima) é uma graça e Julinho (Davi de Oliveira) também tem seus encantos, mas, crianças, eles ainda não têm trama própria, o que é natural.
A boa performance da novela não é exclusividade de Gloria. Outros colegas dela estão bem no folhetim, com destaque para Maria Eduarda de Carvalho (Olga, irmã de Lola) e para Bárbara Reis (Shirley). Esse trio de personagens dominou a estreia de Éramos seis.
Olga faz um contraponto cômico ao drama de Lola, como a moça do interior que sonha em se mudar para São Paulo e encontrar um marido rico por lá. Antes de ir visitar a irmã na capital, Olga vive com Zeca (Eduardo Sterblitch) um romance que lembra muito a inocência trazida em Êta mundo bom!, excelente novela exibida na mesma faixa de Éramos seis. Essa dobradinha promete!
Na falta de tia Emília (personagem de Susana Vieira que ainda não apareceu), Shirley é, até agora, a maior antagonista de Lola. A mulher condena a amizade da filha, Inês (Gabriella Saraivah) com o filho de Lola, Carlos, e guarda um segredo do passado, ao lado do marido, Afonso (Cássio Gabus Mendes, bem também), que criou Inês como se fosse filha dele. É importante notar que, na década de 1920, o fato de Shirley e Afonso serem um casal interracial é um avanço social. E que esse avanço veio trazido por esta versão da novela, pois nas outras Shirley era uma imigrante espanhola.
A discussão política que permeia a década de 1920 esteve, mesmo que discretamente, presente em Éramos seis. Em conversas entre Julio (Antonio Calloni), marido de Lola, e seu colega Almeida (Ricardo Pereira) o texto passou por fatos como direitos trabalhistas e a crise do café. Um dos meninos de Lola ainda reclama: “está errado. Meu pai trabalha a vida inteira e não tem dinheiro para comprar um remédio”. Vem mais crítica ー sutil, mas vem — por aí.
A Globo não precisa provar para ninguém que sabe fazer reconstituições de época de níveis hollywoodianos. Em Éramos seis isso aparece em cada detalhe da casa de Lola e, principalmente, da loja de tecidos onde Julio e Almeida trabalham. As cores dos tecidos se misturam ali, num prédio de pé direito altíssimo. De encher os olhos. Assim como é bonita toda a novela. Uma aguinha com açúcar, bem escrita e com bons atores ー como eram as antigas novelas do horário. Éramos seis tem cheirinho de nostalgia.
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