Estudo, formação e educação são os principais elementos da carreira de um ator. Uma dose de talento e uma pitada de sorte são bem-vindos. Essa seria a receita para quem quiser consolidar-se na área, segundo o agente e produtor cultural Marcus Montenegro. Os “conselhos” estão no livro Ser artista, lançado pela editora HarperCollins, em que Montenegro fala sobre a profissão e ainda conta sobre a experiência de agenciar nomes como Eva Wilma, Nathalia Timberg e Caco Ciocler, entre outros.
“Eu senti que tinha um mercado novo para se formar e vi uma necessidade muito grande de passar esse legado de disciplina, formação, educação para essa geração toda que estava chegando”, explica Marcus, em entrevista ao Próximo Capítulo.
Marcus pontua que há duas grandes dificuldades para quem está começando agora na carreira. A primeira delas é o volume de atores, pois “a concorrência é muito grande”. A segunda é quase uma consequência da primeira: é preciso ter recurso financeiro para investir em “boas fotos, um bom vídeo de trabalho e estar sempre atualizando o material”.
Num mundo em que vive-se muito de imagem, há cada vez mais jovens que entram para a profissão em busca da fama. “A chegada da internet e a criação dos digital influencer acirrou mais ainda a vontade das pessoas em serem famosas, serem celebridades sem conteúdo e formação. Isso é muito triste por um lado porque são coisas completamente distintas. Celebridade é muito instantâneo e fama não é uma busca e, sim, a consequência de um trabalho sólido”, reflete Montenegro.
Outro problema é o que o produtor chama de “jovialização da televisão brasileira”, processo pelo qual “atores que estão acima dos 50 anos, que já são considerados veteranos, enfrentam as dificuldades de escalação.” Para combater isso, ele criou a campanha #queroveteranonatv, “uma maneira de sensibilizar a indústria criativa para criar personagens para os veteranos.”
Praticamente um ativista do teatro brasileiro, Marcus Montenegro lamenta a pandemia. “A pandemia foi dilacerante para o mercado de entretenimento. Infelizmente a parte teatral foi a mais penalizada porque ficou totalmente impossibilitada de trabalhar, pois não tem como colocar um espetáculo no palco e nem fazer uma turnê. Teria que ter um auxílio dirigido para a indústria do teatro brasileiro”, sugere.
Como surgiu o livro? Veio de conselhos que você dava a atores e atrizes?
O livro surgiu há 3 anos, quando eu iniciei a minha carreira de palestrante em congressos e eventos para atores por todo Brasil, onde eu apresento o mercado de trabalho e dou dicas de como construir uma carreira sólida no mundo da atuação. Eu senti que tinha um mercado novo para se formar e vi uma necessidade muito grande de passar esse legado de disciplina, formação, educação para essa geração toda que estava chegando.
Como foi o processo de transposição do livro para os palcos?
Neste momento eu e Regiana Antonini estamos fazendo a adaptação para os palcos. Não é uma tarefa fácil porque eu tenho que tirar toda a parte didática do livro e levar para o lado do conceitual, poético e lírico da arte. Espero terminar daqui a três meses.
O que uma pessoa precisa para se destacar entre tantos atores no mercado? Só talento basta? Precisa de sorte?
Acho que tem que primeiro seguir a base da carreira, que é estudar, ter formação e educação. Óbvio que é preciso ter talento e, junto com ele, vocação e inteligência emocional. Não basta ter só talento, porque você não se sustenta em um mercado tão difícil, com poucas oportunidades para o volume de gente que ainda tem. Então, é um conjunto de fatores. Também a sorte, que, por mais que não seja decisiva, ajuda.
Vivemos hoje um momento em que muitas pessoas dizem que querem ser atores para serem “famosos” ou “celebridades”. Mas são coisas completamente diferentes, não?
A chegada da internet e a criação dos digital influencers acirrou mais ainda a vontade das pessoas de serem famosas, serem celebridades sem conteúdo e formação. Isso é muito triste porque são coisas completamente distintas. Celebridade é muito instantâneo e fama não é uma busca e, sim, a consequência de um trabalho sólido.
Quais são as principais dificuldades que um ator iniciante enfrenta hoje no Brasil?
As principais dificuldades hoje são o volume de atores, a concorrência é muito grande; e a disponibilidade financeira para investir na carreira, pois é preciso ter boas fotos, um bom vídeo de trabalho e estar sempre atualizando e nem sempre o ator tem recursos financeiros.
Existe algum ator ou atriz com quem você nunca trabalhou e gostaria de ter trabalhado ou de ainda trabalhar?
Já trabalhei com todos os atores que eu queria. Claro que sempre um bom ator será bem-vindo na minha empresa. Mas, eu me sinto extremamente satisfeito e realizado com o casting que tenho e com os atores que já trabalhei.
Muito se fala da dificuldade de bons papéis para atores mais velhos. Mas vemos uma geração com Nathalia Timberg, Milton Gonçalves e Eva Wilma, por exemplo, brilhando nos palcos e nas telas. Como quebrar essa barreira?
Infelizmente, com a jovialização da televisão brasileira, os atores que estão acima dos 50 anos, que já são considerados veteranos, cada vez mais enfrentam as dificuldades de escalação. Os grandes nomes do teatro brasileiro, como, Nathalia Timberg, Eva Wilma trabalham sempre, por que primaram por uma carreira baseada no teatro. A televisão foi uma consequência. Então, no mínimo de dois em dois anos, elas estão no palco realizando alguma produção. É uma geração de ouro. Eu já trabalhei com todos que vieram da base do teatro. As pessoas, agora, entram na carreira pensando em ficar famosas na TV. A indústria criativa só tem o olhar para o jovem. Por isso, lancei a campanha “#queroveteranonatv”, uma maneira de sensibilizar a indústria criativa para criar personagens para os veteranos.
A figura do agente de carreira é muito comum nos EUA, em Hollywood. Aqui no Brasil também é? Como é essa profissão?
Nos últimos 15 anos, a profissão do agente ficou muito amadurecida no Brasil. Hoje temos a associação dos agentes no Brasil, com todos os artistas catalogados. O nível está muito profissional, os grandes agentes do Brasil têm uma estrutura boa, estrutura digital, jurídica, de imprensa, em todos os setores. É uma profissão que vai além do que fechar um contrato. Hoje um grande agente tem que buscar entender o cliente para tentar gerar conteúdo. O que me ajuda muito na carreira de produtor teatral com mais de 100 peças é que sempre primei a minha carreira muito na formação de conteúdo. Hoje em dia os agentes brasileiros são reconhecidos no mundo inteiro.
A pandemia atingiu o setor cultural em cheio. Como profissionais como figurinistas, cenógrafos, iluminadores poderão se refazer? Foi ainda mais difícil para eles, não?
A pandemia foi dilacerante para o mercado de entretenimento. Infelizmente a parte teatral foi a mais penalizada porque ficou totalmente impossibilitada de trabalhar, pois não tem como colocar um espetáculo no palco e nem fazer uma turnê. É diferente da indústria criativa, que ainda conseguiu se manter de pé, realizando algumas coisas, claro com escala menor, mas também não parou de trabalhar porque ficou vendo conteúdo para filmar pós-pandemia. Existe uma grande gama de profissionais que estão trabalhando, preparando as produções para iniciar no segundo semestre, mas a indústria cultural, digamos assim, está extremamente fragilizada e penalizada, entrando em seu segundo ano sem trabalhar. Muitos abandonaram a profissão, o que é muito triste. A gente não tem incentivo algum do governo para sustentar essa área, o que é muito triste. Teria que ter um auxílio dirigido para a indústria do teatro brasileiro.
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