Leia crítica da série O mecanismo, da Netflix

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Baseada na operação Lava-Jato, a produção estreia em 23 de março. Confira a crítica dos três primeiros episódios de O mecanismo

A nova série de José Padilha para a Netflix, O mecanismo, deve dividir opiniões. O motivo é que, nos dias de hoje, tudo no Brasil que se relaciona a política tende a polarizar e a produção retrata os desdobramentos da operação Lava-Jato no Brasil, ação da Polícia Federal que denunciou um esquema de corrupção envolvendo políticos e empreiteiros. Apesar disso, o diretor e produtor-executivo, gosta de ressaltar que a série está fora de ideologias.

A produção começa girando em torno de Marco Ruffo (Selton Mello), delegado da Polícia Federal (que, na série, ganha o nome de Polícia Federativa), que está investigando o doleiro Roberto Ibrahim (Enrique Diaz) em 2003 e descobre o Caso Banestado, esquema envolvendo o banco estadual do Paraná. Depois, a história tem um pulo temporal e começa a ser retratada em 2013, quando a Lava-Jato teve início, nessa perspectiva, sob o comando da delegada da PF, Verena Cardoni, papel de Caroline Abras. Cabe a ela investigar o doleiro Ibrahim e seus comparsas no esquema, como a cafetina Kitano (Alessandra Colassanti) e o diretor da PetroBrasil, João Pedro Rangel (Leonardo Medeiros).

Seguindo um estilo narrativo de outros projetos de José Padilha, a série é contada do ponto de vista de um narrador. No primeiro episódio, isso acabe a Ruffo. Depois, o cargo cai para Verena nos dois segundos capítulos. O Próximo Capítulo teve acesso aos três primeiros episódios da primeira temporada, que será composta por oito e estreia em 23 de março na Netflix.

Crítica de O mecanismo

Crédito: Pedro Saad/Divulgação

Não tem jeito é quase impossível não comparar O mecanismo com Narcos e Tropa de elite 1 e 2, todos projetos de José Padilha — o que não é ruim se você é fã (como eu) dessas produções. Os motivos são o estilo narrativo escolhido pelo diretor — com uma narração a cada episódio — e também pela mensagem que ele quer passar sobre a política no Brasil, que ele mesmo explicou em entrevista à imprensa: “que só tem bandido, resumindo” (leia aqui matéria sobre a série O mecanismo). Algo que ele deixa implícito na série e no filme já citados.

O mecanismo começa com uma narração forte — e ao mesmo tempo piegas — mas que deve agradar ao público pelo estilo Tropa de elite de ser: “No Brasil, as pessoas pensam que ser policial é subir favela e trocar tiro com traficante. Isso não é ser policial. Isso é ser policial burro. O que fode nosso país, não é a violência nas favelas, não é a falta de saúde, de educação, não é o sistema falido, o deficit público, nem taxa de juros. O que fode nosso país é a causa disso tudo”. As palavras de Marco Ruffo o transformam no policial Nascimento (Wagner Moura) de O mecanismo. A partir desse momento fica claro que o principal objetivo do personagem é combater o sistema e fazer justiça, seja ela como for.

A partir daí, a série apresenta a história de gato e rato entre Ruffo e Roberto Ibrahim, que foi baseada na relação real entre o doleiro Alberto Youssef e o delegado Gerson Machado, que inspiram os personagens. Inclusive, por ser uma história com base em fatos reais, é óbvio que O mecanismo faz uso de diversas personalidades conhecidas do grande público: todas com novos nomes, mas com características óbvias. Nesse caso, a intenção é fugir de processos e também ter a liberdade ficcional de criar diálogos, conflitos e situações que não aconteceram exatamente daquele jeito, apesar de a série ser muito fiel a realidade. Voltando à relação de Ruffo e Ibrahim, esse é um dos pontos altos do primeiro episódio. Selton e Enrique estão muito bem em seus papéis e conseguem entregar os melhores diálogos.

Crédito: Pedro Saad/Divulgação

Apesar de não ser um protagonista óbvio e ter mais ar de vilão, Enrique Diaz é o grande destaque da série. Com uma bela atuação, ele entrega um Ibrahim ao mesmo tempo cínico, empático e até engraçado. O núcleo do personagem é o alívio cômico da série, que tem um ar de seriedade, afinal de contas, retrata um tema bastante sério para a história do país. Além de Diaz, é preciso celebrar a presença de Caroline Abras, que interpreta uma mulher forte, à frente da PF. As boas atuações também têm a ver com uma característica da série de se aprofundar nos personagens, mais do que apenas debater e retratar a corrupção e o sistema. Isso dá espaço para que os atores possam brilhar.

Os três primeiros episódios são capítulos mais introdutórios. Afinal de contas, a série será distribuída em 190 países e a operação Lava-Jato precisa ser apresentada para o restante do mundo, principalmente, por começar pela figura de Marco Ruffo, inspirada em Gerson Machado, que não se tornou uma personalidade tão conhecida como nomes como o juiz Sérgio Moro. Mesmo adotando esse estilo, O mecanismo não peca em ritmo. A série estabelece uma boa narrativa e consegue prender o espectador. A promessa é de ainda mais agilidade, pelo menos foi o que garantiu o diretor Daniel Rezende (Bingo), que comandou o set nos dois últimos episódios.

Quem assistiu ao filme Polícia Federal — A lei é para todos, pode ter certeza que o longa-metragem e a série são produções bem distintas. Enquanto o longa é mais chapa branca, a produção de Padilha tem espaço para alfinetar todo mundo, independentemente de partido ou lado na história. Claro, que, nos primeiros episódios, sobra muito mais para esquerda do que para direita. Mas, segundo o diretor, a intenção era mostrar que o mecanismo perpassa a história política de todos os grandes partidos.

Uma segunda temporada ainda não está confirmada. Mas tem história possível (e ainda acontecendo) para isso, já que a primeira sequência de episódios se encerrará na prisão dos empreiteiros. E a Lava-Jato ainda está longe de um fim.

Adriana Izel

Jornalista, mas antes de qualquer coisa viciada em séries. Ama Friends, mas se identifica mais com How I met your mother. Nunca superou o final de Lost. E tem Game of thrones como a série preferida de todos os tempos.

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