Detetive vs. Assassino. Esse é um dos enredos mais clichês da história das séries, e também a base de Mr. Mercedes. Porém, nesta história, esses elementos que já levaram tantas outras séries ao estrelato estão “evoluídos”, e não deixam aquela incômoda impressão de já terem sido vistos em outro lugar.
Mas calma, já já você vai entender melhor como isso funciona. Vamos primeiro ao que acontece neste piloto.
Mr. Mercedes é do pequeno canal a cabo norte-americano Audience Network, e estreou no começo de agosto nos EUA. O enredo é uma adaptação da obra de mesmo nome do mestre do suspense mundial: Stephen King. Saindo do lugar comum das histórias de mistérios, Mr. Mercedes começa seu “assassinato de estreia” (aquela típica primeira morte em conteúdos de suspense, que vai ser o “gancho” do público para o desenvolvimento da trama), dando “vida” às futuras vítimas. Então, de um modo surpreendente, nos apegamos àquelas pessoas esperando na fila da agência de emprego no meio da madrugada – boa desconstrução do ideal de sucesso norte-americano, por sinal. A pobre mãe que tem de levar a filha recém-nascida ao frio da noite para buscar um trabalho e o jovem e nobre rapaz que a ajuda, quase fazem o público esquecer que aquela cena faz parte de uma construção para uma terrível tragédia.
A chegada do palhaço com a Mercedes-Benz – que designa o nome da série (sim, eu só me liguei nesse detalhe bem depois) – é um despertador para o verdadeiro gênero da série: o terror e o suspense. O público assiste então, a muito bem montada, cena do psicopata acelerando e matando todas aquelas pessoas na fila de espera do emprego (inclusive o bebê). São poucos minutos que irão te tirar da inércia de estar “assistindo outro piloto qualquer” para o estado de atenção de estar “assistindo uma boa série”.
Após a – terrivelmente boa – cena inicial e um salto no tempo, somos apresentados ao detetive Bill Hodges (Brendan Gleeson), o responsável por investigar o caso do atropelamento há alguns anos, mas que acaba se aposentando sem solucionar nada. O típico retrato do velho ranzinza é muito bem trabalhado por Brendan Gleeson, que tenta até mesmo por um sotaque arrastado tirar o personagem do clichê que, teoricamente, ele se encontraria nesse tipo de produção.
O próximo personagem chave da trama é o assassino. Já aparecendo em cena desde os momentos iniciais, Mr. Mercedes é inteligente o suficiente para não entregar de bandeja a verdadeira identidade do psicopata Brady Karsfield (Harry Treadaway), o motorista da Mercedes-Benz. Somos apresentados ao trabalho de Brady, seu cotidiano, sua personalidade inócua, sua relação sexual doentia com a mãe, mas não ao crime.
O clímax do episódio se dá no momento em que Brady decide reviver o atropelamento em massa mandando um vídeo para o detetive. A cena é brilhante, e o conteúdo assustador. Outro ponto positivo para Mr. Mercedes: saber acrescentar elementos de absoluto terror em um enredo que aparentemente não teria nenhuma surpresa. Pronto, está montado o plot que leva o detetive de volta ao caso da Mercedes-Benz.
O resto do piloto ainda tem vários pontos positivos (como os satisfatórios personagens secundários), mas também vale algumas considerações negativas: me preocupa um pouco o andamento dos próximos episódios. Por mais que o piloto tenha sido muito bem construído, uma série de policial e assassino geralmente não tem muito espaço de criação, e temo bastante que tudo isso se torne só mais um chato jogo de gato e rato até a prisão ou morte do Brady daqui a alguns episódios.
Para dica final: assista ao piloto de Mr. Mercedes. É uma obra feita com maestria e a estreia já vale a pena.
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