caco ciocler Crédito: Montenegro e Raman/Divulgação

Caco Ciocler: “Edgar é um personagem que vai sofrer e aprender muito durante a trama”

Publicado em Entrevista, Novela

Em entrevista, Caco Ciocler fala sobre o momento atual, em que dá vida a Edgar em Segundo sol, um dos personagens mais instigantes da carreira

Desde que foi anunciado na novela Segundo sol, Caco Ciocler, 46 anos, tem chamado atenção. O motivo é que, depois de uma breve participação em Deus salve o rei, o ator apareceu quase irreconhecível. Para dar vida a Edgar, que na primeira fase da novela tem 30 anos, Caco achou que devia passar por uma transformação visual. “Comecei a imaginar que esse cara seria alguém que cuidaria do corpo, que faria musculação. A gente não emagrece para viver o personagem, mas para deixar de ser a gente”, revela.

Logo na primeira semana da novela, o personagem se tornou nos assuntos mais comentados do Twitter para surpresa de Caco: “Nasci em 1971 e nunca tinha ouvido falar em trending topics até me tornar um”. Na trama, o personagem viverá um dilema com Roberval, papel de Fabrício Boliveira, que, apesar de ter sido criado como filho da empregada, é na verdade, irmão de sangue de Edgar. “É uma discussão riquíssima. Estamos humanizando essa relação para não ficar algo do branco contra o negro, embora a discussão seja sobre isso e vá mergulhar nisso. Mas é uma história, na minha opinião, que tem dimensões quase bíblicas: dois irmãos separados, um com direito a tudo e outro com direito a nada”.

Entrevista / Caco Ciocler

Você volta à televisão em um personagem bem mais jovem no mesmo momento que anunciou que será avô. Como é viver essa contradição?
A contradição é uma coincidência. Eu achei engraçado nesse momento que eu tive que rejuvenescer na ficção, eu tive a notícia… Porque quando você recebe a notícia de que vai ser avô, você envelhece automaticamente e tem uma noção do tempo, que eu não tinha tido até então.

Ficou surpreso ao saber que faria um personagem mais jovem nessa primeira fase da novela?
Na verdade, quanto teve o convite não houve essa ênfase de que o personagem teria 20 anos a menos. Só tive noção quando a gente fez uma primeira leitura dos capítulos. Então, me veio essa preocupação, como ator mesmo. Como que eu ia resolver isso dramaticamente falando? E teve essa história do Dennis (Carvalho, diretor de Segundo sol) comentar, claro que de brincadeira, que seria legal se eu emagrecesse. E acho que fisicamente a gente muda muito. Ele era um playboy na primeira fase, ficava na piscina de casa. Comecei a imaginar que esse cara seria alguém que cuidaria do corpo, que faria musculação. Comecei a desenhar esse tipo e entrei nessa viagem de tentar uma transformação, que sempre ajuda. Claro que não é o essencial. A gente não emagrece para viver o personagem, mas para deixar de ser a gente. É o contrário.

O seu núcleo fará um debate muito importante na novela, principalmente depois das críticas em torno da ausência de negros no elenco. Como você vê isso?
O Roberval, pelo menos por enquanto, tem uma importância quase que de protagonista e é uma discussão muito bonita e rica. O João (Emanuel Carneiro, diretor da novela) criou essa relação desses dois irmãos de uma maneira genial, porque eles crescem na mesma casa como irmãos sem saber que são irmãos. Então a relação já está estabelecida. O personagem do Fabrício assistiu ao Edgar vivendo uma vida da qual ele não tinha direito. E depois ele descobre que, sim, tinha direito (porque eles são filhos do mesmo pai). Então quando a coisa explode, eles já têm uma relação muito forte de irmãos. E nos dois sentidos, porque irmão se ama, mas também se odeia e disputa. É uma discussão riquíssima. Estamos tendo muito cuidado para não deixar muito maniqueísta. Nós dois estamos tentando colorir esses personagens e essa relação, para que os dois sejam vítimas dessa educação oligárquica. Estamos humanizando essa relação para não ficar algo do branco contra o negro, embora a discussão seja sobre isso e vá mergulhar nisso. Mas é uma história, na minha opinião, que tem dimensões quase bíblicas: dois irmãos separados, um com direito a tudo e outro com direito a nada.

Edgar (Caco Ciocler) e Cacau (Fabiula Nascimento). Crédito: TV Globo/Divulgação
Edgar (Caco Ciocler) e Cacau (Fabiula Nascimento). Crédito: TV Globo/Divulgação

O que você pode contar sobre as mudanças de Edgar em cada fase de Segundo sol?
Os personagens do João costumam ser bastante complexos e que dão muitas voltas, então, ele vai passar por muitas transformações. Mas a transformação básica da primeira para a segunda fase é que ele é um cara pouco preparado pela vida, que nunca precisou trabalhar, fazer esforço, um privilegiado. Ele é vítima dessa criação justamente pela manutenção da oligarquia, da riqueza da família. Ele tem uma alma boa, mas muito pouco arranhada pela vida, então, é um personagem que vai sofrer e aprender muito durante a trama.

Você está agora em Segundo sol, mas esse ano fez um participação em Deus salve o rei e está no ar em o Carcereiros. Como é conciliar tantos projetos?
Estou um pouco acostumado com isso. Sempre trabalhei muito e fiz muita coisa ao mesmo tempo. Acho maravilhoso porque esses exemplos que você citou são três trabalhos e personagens completamente diferentes. É muito legal esse exercício de poder fazer três personagens e três trabalhos tão diferentes ao mesmo tempo. Acho um privilégio.

Crédito: Reprodução/Internet. Elenco de Unidade básica
Crédito: Reprodução/Internet. Elenco de Unidade básica

Foi anunciada a segunda temporada da série Unidade básica, que você é protagonista. Vocês já começaram a gravar?
Foi anunciado, está certo, vai rolar. Mas agora eles vão esperar eu acabar o Segundo sol porque não dá (para fazer as duas coisas). Porque lá eu estou em todas as cenas praticamente e é em São Paulo. Então a gente vai esperar acabar aqui e aí a gente começar a rodar a segunda temporada.

Como foi para você fazer parte dessa série, que é na tevê fechada, um outro tipo de trabalho?
Foi incrível. Adoro a série, acho muito importante. Ela fez muito sucesso entre os médicos, levantou uma discussão importante. Foi incrível. Tevê fechada é mais familiar. Foi aberto para mim um espaço muito legal de poder contribuir com roteiro e edição. Fui solicitado mais para contribuir. Eu era o protagonista, tinha opiniões que foram ouvidas sobre tudo. Era uma troca maior, mais possível do que tenho na tevê aberta.

Isso te deu vontade de dirigir e fazer projetos assim?
Sempre tive essa vontade e fiz coisas nesse sentido. Dirigi no teatro, no cinema. Adoro dirigir e editar e sempre acho que esse diálogo do ator com autores, diretores e editores importante. Eu sei que não dá para ficar abrindo para todo mundo, mas o ator sabe — como é ele que está vivendo — e percebe coisas importantes de serem ditas e levadas em consideração, então quando esse espaço é dado é surpreendente, porque o ator é peça fundamental. No teatro, isso fica muito claro, na tevê, às vezes, não tanto. Mas o ator é peça fundamental para contar bem uma história, então se não existe uma conversa muito íntima entre o ator, que vai dar vida ao personagem, o autor, que criou o personagem, direção, que é quem encaminha esse personagem, e a própria edição, que mexe no nosso trabalho. A edição tira silêncios, acelera tempos, mostra reações, escolhe que reações quer mostrar. Então está todo mundo contando a mesma história, se não tem uma integração entre as quatro partes, essa história é mal contada.

Você é descendente de judeu e fala sobre isso no livro de ficção Zeide: A travessia de um judeu entre nações e gerações. Essa cultura é algo que ainda influencia na sua vida?
Eu achava que não. Mas quando a editora Planeta falou em criar uma ficção sobre um imigrante judeu, que vi que sou. E fui me dando conta de como isso está sempre presente na minha vida, desde as tradições, dentro de casa, a escola que estudei, o clube que frequentei e comecei a fazer e me apaixonar pelo teatro… Então obviamente que minha criação é recheada dessas histórias e costumes que vem desse lugar. Mantenho alguns, mas é difícil explicar. Não sou uma pessoa religiosa, mas sou uma pessoa com uma ligação muito grande com a cultura. Me emociono com as músicas, com as celebrações, com os símbolos, com a dança. Eu sou culturalmente muito próximo, mas não religiosamente.

Você sempre costuma se manifestar nas redes sociais sobre questões políticas e sociais. Você acha que é importante para o artista ter esse papel também?
Acho que é uma decisão muito pessoal, não acho que é uma obrigação. Mas acho que as pessoas todas estão entendendo que não dá para ficar de fora das decisões que estão sendo tomadas no mundo. Você ficar de fora, já é uma decisão política. Nós temos que cuidar da nossa casa, da nossa política, do nosso planeta. Ter essa consciência e se posicionar, acho legal. Agora não vou sair dizendo que todo artista tem que fazer isso, acho que é uma coisa íntima.