Nova produção da Netflix, Bridgerton conquistou popularidade, mesmo que misturando narrativas já exploradas nas telinhas
Antes de 2020 acabar, a Netflix lançou uma cartada certeira: a série Bridgerton, que surgiu com uma grande responsabilidade de ser um sucesso. Afinal, a produção foi o motivo da produtora Shonda Rhimes largar Grey’s anatomy após 15 anos para se dedicar ao projeto no streaming.
Mas é importante frisar que a mão de Shonda na trama sobre os escândalos da monarquia britânica é menor do que o esperado, tendo apenas as funções de produtora executiva e associada na produção da empresa Shondaland ao lado da Netflix. Quem esteve à frente de Bridgerton, como showrunner e criador da série, foi Chris Van Dusen, que trabalhou em Grey’s entre 2005 e 2012.
A série, composta por oito episódios, foi baseada no livro O duque e eu, de Julia Quinn, e conta as “aventuras” de Daphne (Phoebe Dynevor), a filha mais velha da família Bridgerton que, após debutar, entra na “temporada de casamentos” da monarquia. A jovem sonha com um grande casamento com homem nobre, mas logo percebe que nem tudo é tão fácil assim na alta realeza.
Cercada de “competidoras” e com o irmão superprotetor Anthony (Jonathan Bailey) — que assume a alcunha do pai falecido de visconde –, Daphne a todo momento se vê ameaçada por escândalos e amedrontada por um possível futuro solteira. Tudo muda, entretanto, quando a moça conhece o duque de Hastings, Simon Basset (Regé-Jean Page).
Com personalidades fortes, a princípio os dois não se dão muito bem. Mas acabam se aproximando ao chegarem a um acordo bom para os dois: a de forjar um relacionamento, o que atrai interessados para Daphne e alivia a “pressão” das mães de possíveis pretendentes para Simon. Mas como era de se esperar de um conto de fadas moderno, os dois se apaixonam, e entre tantos tropeços acabam se casando.
E o que poderia ser um “final feliz” se transformar num problema. Ressentido com o péssimo pai que teve durante a infância, Simon fez uma promessa ao patriarca de Hastings: nunca ter um filho e acabar com a linhagem da família. É a partir daí que a série desenvolve o relacionamento de altos e baixos do casal e também da narrativa. A partir de um certo momento, a série aposta exaustivamente nos atos sexuais do casal, ao melhor estilo soft porn.
A abordagem não é passível de crítica, afinal, muitas séries abusam das representações sexuais como formas de captar a atenção do telespectador. O grande problema é a repetição. Com apenas oito episódios, bem mais cedo do que se esperava, o relacionamento principal da trama se resume às questões relacionados ao sexo.
A profundidade também não ajuda muito na qualidade da trama. Entre diálogos extremamente cansativos e, muitas vezes, desnecessários, a narrativa mira a agilidade das produções de Aaron Sorkin (West wing e The newsroom), mas acaba acertando acertando o tom vanilla das séries infanto-juvenis da Disney.
Bridgerton vai além do casal
Mas o lado bom é que Bridgerton vai além de Daphne e Simon. Lady Whistledown é a uma espécie de “jornalista de fofocas” da monarquia, que sob uma identidade secreta, distribui um folheto com os principais escândalos da realeza (narrados ao longo dos episódios). Quem for o alvo de Lady Whistledown, acaba se tornando uma vítima em relação à integridade social. Com esses ingredientes, Bridgerton vira uma espécie de sopa de uma Downton Abbey bem mais primaveril, com toda a acidez e a beleza jovem de uma primeira temporada de Gossip girl.
Outro ponto a favor da série é a quantidade. Mesmo com só oito episódios, a produção tem um número de personagens significativo, e, na maioria das vezes, consegue conduzi-los pela narrativa sem problemas. Desde o rei louco, ou a amante de Anthony passando até mesmo pelo Príncipe. Todos têm um objetivo na história e conseguem entrar e sair da narrativa no momento certo. É um grande desafio saber amarrar tanta gente, mas Bridgerton conseguiu fazê-los andar juntos.
Entre tantos clichês teens, a trama também consegue ter arroubos de criatividade. A começar pela identidade de Lady Whistledown, que foi de fato surpreendente, e também pela explicação da igualdade racial apresentada na história como proveniente do amor do rei branco por uma mulher negra. Ponto que chegou a dividir fãs: alguns elogiando a iniciativa e outros criticando.
Importante destacar também o caráter técnico da produção que não falha ao criar a atmosfera de uma Londres monárquica, que ajudam na credibilidade daquela realeza.
De uma forma geral, Bridgerton apresenta vários elementos que a tornam uma série bem popular, desde as cenas de sexo, passando por várias histórias, “rostinhos bonitos” e até mesmo um amor improvável que enfrenta diversas dificuldades. Entretanto, não espere a intelectualidade da principal referência, Downton Abbey, ou qualquer outro aspecto que não seja o entretenimento mais fácil. Algo que não é necessariamente ruim. As vezes é exatamente o que precisamos.