Releitura de um grande sucesso de 1982, a novela estreia nesta segunda-feira (25/9), na Globo, atualizada, com empoderamento feminino, representatividade e diversidade
Patrick Selvatti*
Afeto, lealdade, conflito, segredo, mágoa, afastamento, reencontro. Essas sete fases de uma relação marcam a amizade de sete mulheres que, a partir de amanhã, passarão a fazer parte do convívio do telespectador brasileiro. Lara (Deborah Secco), Taís (Késia), Helena (Isabel Teixeira), Adriana (Thalita Carauta), Renée (Maria Clara Spinelli), Natália (Mariana Santos) e Carol (Karine Teles) estão chegando com Elas por elas, a nova novela da faixa das 18h, na TV Globo. As histórias dessas mulheres — multiprotagonistas da trama — serão contadas a partir do momento em que, após 25 anos, elas se reúnem e se dão conta de que, apesar do laço emocional forte que ainda as conecta, as trajetórias distintas — e, ao mesmo tempo, entrelaçadas — que percorreram podem ser um grande obstáculo para que o relacionamento se reconstrua.
Em 14 de setembro, no evento de lançamento da novela, realizado nos Estúdios Globo, as sete atrizes se apresentaram, caracterizadas, contando um pouco sobre suas personagens. Ali, em uma espécie de esquete teatral, os convidados puderam ter um aperitivo do que será apreciado como prato principal pela tevê nos próximos seis meses: a exuberância inocente de Lara, o brilho sereno de Taís, o esnobismo frágil de Helena, a simplicidade complexa de Adriana, a doçura firme de Reneé, a obstinação atormentada de Natália e a inteligência contida de Carol. E, como sobremesa, a irreverência do icônico Mário Fofoca, o personagem emblemático interpretado algumas vezes na teledramaturgia, agora na pele de Lázaro Ramos, que traz ainda mais irreverência e charme ao atrapalhado detetive eternizado pelo inesquecível Luiz Gustavo (1934-2021).
Elas por elas é um remake da obra escrita por Cassiano Gabus Mendes, produzida e exibida em 1982 pela Globo. Um grande sucesso da teledramaturgia 40 anos atrás, a ideia agora não é uma cópia, mas uma releitura do enredo principal, adaptada aos novos tempos. De acordo com a autora Thereza Falcão, o espírito leve da novela original foi mantido, trazendo mais complexidade às tramas originais. “Por ser das 18h, vamos priorizar mais romances, conflitos mais dramáticos e tem um mistério que permeia a história toda. Temos muitos assuntos para tratar. Tudo atualizado, porque, em 40 anos, as mulheres mudaram muito, especialmente a forma como se posicionam e como são vistas. Isso trouxe outras características à produção”, afirma, frisando que a homenagem ao criador da história estará presente em toda a narrativa.
“Uma obra basicamente dá certo quando atinge o público pela via da emoção. Temos elementos muito fortes que podem pegar pelo sentimento e pela empatia. Não é possível que as pessoas não se identifiquem com pelo menos um deles”, reforça o autor Alessandro Marson. Para ele, o significado pessoal de assinar esse remake é enorme. “Tenho uma relação afetiva com essa novela. A obra é potente, qualquer mudança tem que ser muito bem pensada. Comédia, drama e suspense são três eixos muito fortes que unem as tramas, e é uma genialidade do Cassiano. A novela poderia ser adaptada para qualquer horário, inclusive às 21h”, avalia.
Marson ressalta que uma grande sacada de Elas por elas é o múltiplo protagonismo feminino. “Temos uma gama de personagens femininos muito fortes. São mulheres que se gostam, apesar de tudo. É uma história que fala sobre amizade, de reencontro. Um tema caro a todo mundo”, conclui. “É uma novela em que as personagens têm a oportunidade de olhar para o passado e verem o que ficou para trás, o que não realizaram da vida que tinham planejado. A partir daí, começam a rever o presente”, complementa Thereza. A dupla escreve a releitura com a colaboração de Carol Santos, Letícia Mey e Wendell Bendelack.
Múltiplas e diversas
Ainda que não haja uma única protagonista, o elenco é encabeçado por Deborah Secco, que retorna às novelas para reviver uma personagem interpretada por Eva Wilma na primeira versão. “A Lara, que antes se chamava Márcia, é um pouco inédita, tem coisas da personagem que a Eva Wilma fez, mas modernizada. Ela é quase que infantil, ingênua, divertida e encantada com a vida, mas se dá conta que a sua é uma farsa. Eu tenho brincado, e isso tem sido leve e gostoso. Estou tendo um encontro maravilhoso com essas atrizes divinas e estamos na chave do afeto. Eu acho difícil isso tudo dar errado”, observa a atriz de 43 anos que, agora, será mãe de duas moças adultas: Cris (Valentina Herzage) e Yeda (Castorine).
No lado masculino, Lázaro Ramos é o bendito-fruto entre as mulheres. Para o ator, o trabalho tem sido “leve, divertido e cansativo”, principalmente por estar repaginando um ícone da teledramaturgia brasileira. “Excelente qualidade de comédia, difícil de fazer, porque tem uma métrica teatral. Estou exausto, mas feliz com a construção”, assinala o baiano, sem negar que começou com muito medo. “Eu conheço muito do personagem. Em Cobras & Lagartos eu estudei muito o Mário Fofoca para compor o Foguinho, mas lamentavelmente não conheci o Luiz Gustavo. E isso gera muita expectativa, muita responsabilidade. Tenho sido disciplinado para dar conta do recado: honrar o personagem e ser digno da companhia dessas mulheres incríveis”, finaliza.
No original, Mário Fofoca e a irmã, a modelo Taís, uma das protagonistas, foram interpretados por atores brancos. No papel defendido anteriormente por Sandra Bréa, a estreante em novelas Kesia, uma atriz negra, comentou sobre a importância da diversidade no protagonismo: “A personagem era branca. Pesquisei muito sobre a Sandra Bréa, que era um ícone naquela geração. Eu tentei buscar um pouco dela também para compor, especialmente no tom do humor. Mas a pauta social traz um peso, uma responsabilidade maior por vir com essa representatividade”, analisa.
Elas por elas será marcada pelo ineditismo de inserir na história da teledramaturgia um capítulo importante: uma atriz que passou pela transição de gênero será uma das protagonistas. Para Maria Clara Spinelli, é valioso que a personagem Renée esteja entre seis mulheres maravilhosas e diversas. “Ela está inserida na sociedade junto com outras mulheres cis, brancas e negras. Ela é a mais batalhadora de todos, a que tem menos recursos financeiros. Deixa de ser doméstica, como na versão original, para ir ao mercado de trabalho. O que mais celebro, e o que me fez aceitar, é que a Renée é uma mãe, uma irmã, uma chefe de família, uma brasileira. Ela não vem do gueto, não é marginalizada, ela sempre foi amada e isso traz uma nova narrativa sobre os transgêneros”, comemora ela, que se orgulha de uma carreira de mais de 20 anos no teatro, no cinema e na tevê.
A direção artística é de Amora Mautner, responsável por Avenida Brasil (2012) e ganhadora de um Emmy Internacional por Joia rara (2013). Segundo ela, o projeto de Elas por elas é mais sobre teatro do que cinema. “Texto e atores são o fundamento desta obra. É como se fosse uma grande peça de teatro. A grande joia é o elenco, e os atores e as atrizes vão fazer um assalto a quem estiver na frente da tevê. O público vai saborear muito essa comédia”, garante. “Não tem um ator mais ou menos, é só obra-prima. Todo mundo no mesmo tom nessa dramédia, onde tudo é uma trama importante. A novela também vai ter uma pegada de streaming, com muita coisa de valor acontecendo ao mesmo tempo”, adianta.
Único ator presente nas duas produções, Cássio Gabus Mendes estreou na televisão na versão original e faz, no remake, o personagem Otávio. Filho de Cassiano Gabus Mendes, ele fala da honra de ter sido escalado. “Nunca me passou pela cabeça que eu estaria aqui falando de um remake do primeiro trabalho que fiz na TV Globo. A ficha ainda não caiu”, conta o Elton da obra de 1982. O elenco traz ainda nomes como Sérgio Guizé, Mateus Solano, Alexandre Borges, Filipe Bragança, Rayssa Bratillieri, Monique Alfradique, Luís Navarro, César Mello, Maria Ceiça, Mary Sheila, Regiana Antonini, entre outros.
*O jornalista viajou ao Rio de Janeiro a convite da Rede Globo