É tudo verdade? Seriados e novelas levam a história para a ficção na tevê. Isso é bom para o público?

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As aulas de história no colégio carregam, muitas vezes, a pecha de tratar de assunto chato ou monótono. Pura injustiça. A prova disso é que produções televisivas se valem dos fatos históricos para divertir e informar o público ao mesmo tempo. Atualmente, três atrações da tevê aberta cumprem esse papel: o programa Era uma vez uma história (Band, quinta-feira, às 22h50), a novela Novo mundo (Globo, de segunda a sábado, às 18h) e a série Os dias eram assim (Globo, segunda, terça, quinta e sexta, depois de A força do querer). Mas nem sempre os professores e historiadores concordam com essa interseção entre história e entretenimento.

“Essa é uma polêmica antiga. De um lado estão os puristas achando que a obra de arte deve ser o mais fiel possível à história. Do outro, estão os flexíveis, defendendo que a obra, mesmo distorcendo alguns fatos, é interessante”, explica o professor de história Cássio Marcelo de Melo Nunes. Mestre de alunos de Ensino Médio e pré-vestibular do Galois, Cássio se coloca a favor do segundo grupo.

O professor costuma levar trechos de filmes e seriados para a sala de aula e indicar títulos para os alunos mais interessados. “É claro que precisamos ter o discernimento que ali está uma obra de arte, com a função também de divertir o público. Por isso, o filme e a novela não podem substituir o material didático ou a sala de aula”, adverte Cássio.

Em consonância com Cássio está a historiadora e professora Lilia Schwarcz. A autora de livros como História da vida privada no Brasil e Retrato em branco e negro, entre tantos outros títulos, ela defende: “Como professora vejo essa prática muito salutar. Precisamos sair do mundo confortável da Academia. É claro que ela é muito importante e não pode ser esquecida, mas ela pode ser ajudada.”

Independência ou morte

O período pré-independência do Brasil está em alta na telinha. Tanto o seriado em quatro capítulos Era uma vez uma história como a novela Novo mundo (leia crítica da novela aqui) retratam essa época.

Em Era uma vez uma história, o ator Dan Stulbach e a historiadora e escritora Lilia Schwarcz passeiam de 1806 a 1889. O programa intercala esquetes que retratam os fatos históricos com intervenções nas quais o Lilia comenta os acontecimentos. Tudo isso num tom informal e com a ajuda de vários recursos, como dramaturgia, gráficos e cenários que remontam a época.

“Vamos caminhando e contando a história de um modo divertido, mostrando alguns fatos mais conhecidos e detalhes menos famosos. A gente dá voz a anônimos e desconhecidos também. Não ficamos presos aos que todos já conhecemos e também aproveitamos para desfazer mitos, como o da passividade do brasileiro”, afirma Lilia. Experiente autora e estudiosa, ela brinca: “O programa ainda me deu a oportunidade de encontrar com D. João e D.Pedro, sobre quem tanto escrevi, pela primeira vez.”

O roteiro de Era uma vez uma história – com o qual Lilia colaborou — mescla momentos divertidos com os instrutivos. É possível vermos, por exemplo, Dan Stulbach dando notas de Real para um escravo ou ouvir comentários, como a brincadeira que se D.João e Carlota Joaquina estivessem num site de relacionamento não teriam muitos “match”. “O humor é muito importante nesse momento. Mas temos que ser engraçados sem vilipendiar a história”, considera Lilia.

Reflexão

Crédito: Raquel Cunha/Divulgação. Letícia Collin e Caio Castro vivem Leopildina e D. Pedro na novela Novo mundo
Crédito: Raquel Cunha/Divulgação. Letícia Collin e Caio Castro vivem Leopildina e D. Pedro na novela Novo mundo

 

Mais do que se limitar apenas ao que já passou, Lilia comenta que atrações como essa podem ajudar o público a refletir sobre o atual momento. “Num momento como esse, de crise institucional, essas atrações levam à reflexão sobre o presente por meio do passado. Isso é importantíssimo”, diz.

O mesmo período histórico e a mesma arma: o humor. O binômio também aparece em Novo mundo. A novela de Thereza Falcão e Alessandro Marson começa com a vinda de Leopoldina (Letícia Collin) para o Brasil, a fim de se casar com o jovem D. Pedro (Caio Castro).

O Brasil pré-independência retratado ali tem mais licenças poéticas do que o de Era uma vez uma história. Mas o cuidado com a reconstituição dos fatos que servem como pano de fundo para a trama chama a atenção.

“Não estamos diante de um documentário. E, sim, de obras divertidas que podem nos informar”, comenta Cássio Nunes. É isso!

CRÍTICA// Os dias eram assim

Veridito: Bom

Alice conhece Renato  em Os dias eram assim
Alice conhece Renato em Os dias eram assim

 

A ditadura vira e mexe aparece nas produções televisivas, mesmo que de relance e menos do que deveria. Em Os dias eram assim ela está lá. Quando série (que a Globo insiste em chamar de “super”) estreou a impressão era que os Anos de Chumbo seriam os protagonistas da história. No primeiro capítulo, a mesma impressão.

Mas logo as cenas de tensão política deram lugar ao romance proibido de Renato e Alice, vividos pelos inspirados Renato Góes e Sophie Charlotte (cada vez mais madura como atriz). Mesmo assim, há passagens (belas passagens, por sinal) que remetem ao período, como a tortura de Gustavo (Gabriel Leone) e o exílio de Renato no Chile. Isso sem falar na trilha sonora, com clássicos como Cálice e Aos nossos filhos. O saldo é positivo, mas passa longe das salas de aula.